As prateleiras de biografias e autobiografias estão mais recheadas. Sinal que o interesse pela vida alheia é crescente. De divas do cinema como Gina Lollobrigida e Carmen Miranda a políticos como Antônio Carlos Magalhães, há livros para todos os gostos.
O que leva leitores e, anteriormente, escritores a se debruçarem tão atentamente sobre a vida de um personagem? "Não é mero interesse pela vida dos outros: é interesse por outros que marcaram épocas, inspiraram muita gente, deixaram uma herança. É uma forma sedutora de aprender história e cultura, ainda que perigosa, porque há uma projeção do leitor", opina Daniel Piza, biógrafo de Machado de Assis.
Com dupla formação em História e Jornalismo, Paulo Cesar de Araújo, considera a biografia uma forma mais saborosa de analisar a realidade que está em torno do personagem. "Uma biografia que falasse apenas sobre a vida do artista não me interessaria", conta o autor.
Apesar do título, seu livro Roberto Carlos em Detalhes pretende ser, mais do que uma obra sobre a vida do Rei, uma análise da evolução da MPB ao longo de quatro décadas. "Roberto é o fio condutor da narrativa porque percorre os principais momentos da música popular brasileira deste período", explica o autor.
Não faltam detalhes íntimos da vida do cantor que interessam aos fãs mais ardorosos. Para Aráujo, esses trechos não devem ser tratados como mero relato de revista de fofocas. Ele justifica ser impossível falar da obra do cantor sem tratar de sua vida. "Ele cantou a vida nas canções. Fala da mãe em "Lady Laura", fala do pai em "Meu Querido, Meu Velho, Meu Amigo", fala dos filhos em "Quando as Crianças Saírem de Férias", fala de seus amores, da sua religiosidade", exemplifica.
Fernando Morais não acha que é futilidade querer saber detalhes da vida de quem ouvimos falar diariamente no rádio, na TV, em revistas e jornais. É uma curiosidade natural. "Quem vê um sujeito como Paulo Coelho, que vendeu 100 milhões de livros, quer saber como ele é em casa, se bate na mulher, nos filhos, se bebe, se gosta de cachorro, como gasta o dinheiro".
"Escrevo para o taxista da esquina"
Ruy Castro não sabe identificar as razões de tanto interesse do público pelo gênero, mas também adora lê-lo. Foi lendo biografias e livros de história desde muito cedo que nasceu seu interesse por contar a vida de pessoas que admira.
O biógrafo é cultuado entre os fãs de biografia por sua escrita saborosa, que lança mão de recursos literários sem, no entanto, deixar de lado o rigor na apuração dos fatos. Rigor que, aliás, não segue exatamente a mesma metodologia usada na academia, o que pode render algumas críticas de historiadores aos jornalistas que, como ele, estão "metidos" na atividade biográfica. "Não é o meu caso, eu os invejo em algumas coisas e ele se dão bem comigo em outras", afirma.
Fernando Morais já foi alvo do que chama de "rasteiro, minúsculo sentimento da inveja". Ele conta que, logo depois de ter lançado Chatô, o Rei do Brasil, um professor da USP criticou o livro na imprensa, dizendo que não havia metodologia. A resposta veio rápida: "Olha, vou fazer um curso de Metodologia na USP pra ver se sou lido tão pouco quanto ele".
Casado com um historiadora, ele fala sem temer o risco de suas idéias parecerem confrontação. "O Ruy Castro, por exemplo, é capaz de ter vendido mais do que a obra inteira de FHC. Isso não significa que ela seja má, significa que são estilos diferentes, o historiador tem a preocupação de explicar o fato, o jornalista conta o fato. Não acho que haja contradição, confronto, são estilo diferentes. Eu escrevo para ser lido pelo maior número de pessoas, para servir para o taxista da esquina."
A dupla formação de Paulo Cesar de Araújo deu-lhe rigor e sabor para escrever sua biografia. "Historiador tem tratamento da fonte mais rigoroso, tem diálogo mais consistente com a fonte. Por outro lado, os textos dos jornalistas são melhores, mais saborosos de ler", opina.
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