Você pode não achar um pingo de graça nas piadas de Diogo Portugal. Mas não dá para negar que ele criou, praticamente do nada, um circuito de shows de comédia em Curitiba. Ex-baixista da banda pop Pele Sintética, ex-guia turístico nos EUA, ex-professor de inglês, Portugal tenta fazer os outros rirem desde 1994. Das festas fechadas, partiu para performances em bares e consolidou sua própria noite cômica (sempre às terças, no Era Só O Que Faltava). Mais tarde, chegou ao rádio, gravou um CD, influenciou novos talentos e até se arriscou na televisão. Paralelamente, comanda uma produtora de áudio para publicidade e organiza o evento "Risorama", com artistas de todo o país. A semana de humor, integrada ao Festival de Teatro, este ano acontece entre os dias 19 e 23 de março, no Clube Concórdia.

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Aos 34 anos, o comediante desfruta de um certo reconhecimento fora do estado, que já lhe rendeu shows em quase todas as capitais brasileiras. Neste extato momento, aliás, Portugal está em alto-mar: foi contratado para se apresentar durante um cruzeiro de carnaval. Nada mal para quem vem de uma família tradicionalmente ligada à sisudez do Direito e da política (entre seus parentes ilustres está o avô, Clotário Portugal, que foi governador do Paraná e até virou nome de rua). Confira abaixo um bate-papo com esse empreendedor da comédia.

Você teve outras atividades antes de se tornar comediante. Como se deu essa "conversão" ao humor?

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O que aconteceu é que eu não vim de uma escola de teatro, não sou um ator formado. Então, a minha trajetória começou muito informalmente. Eu queria muito fazer humor, gostava de ver shows de humor. E comecei fazendo festas de aniversário, eventos pequenos, churrascadas... Enfim, era aquele humorista de cozinha, o "engraçadão" da turma. Apesar de que eu sou um cara tímido que se solta mais na hora do show. Mas o que incentiva alguém a entrar no humor são os próprios amigos. Os meus disseram que eu era engraçado, que deveria me apresentar... E eu acreditei nos caras! Venho de uma família em que todo mundo é juiz, advogado, desembargador... Acabei seguindo um caminho totalmente oposto. Mas olha só que interessante: esses dias fizeram a reinauguração de um fórum em Apucarana, com o nome do meu avô, e não convidaram nenhum juiz ou advogado da família. Você acredita que me chamaram para receber a homenagem? Acho que a idéia era: "Vamos chamar o cara, que ele recebe a homenagem e já anima a gente".

Mas eu devo muito à platéia de Curitiba. Já estou há 12 anos nessa carreira e no começo não foi fácil, teve muito preconceito. O legal é que sempre rolava algum tipo de trabalho. E, aos poucos, consegui fazer disso uma possibilidade de vida, uma fonte de renda mesmo. Isso foi o mais complicado, viver de humor em Curitiba. Mas não quer dizer que o artista local não continue tendo de sair daqui. Porque na escola teatral é assim: o cara faz um certo sucesso em Curitiba, logo já não tem tanto espaço e precisar ir para fora. Um amigo meu fez uma peça em São Paulo chamada "Enquanto Não Fazemos Novela". Eu achei interessantíssima, porque o ator se bate muito no teatro até fazer uma novela e ficar famoso. Aí, ele leva mais gente para o teatro, que é o que ele realmente gosta de fazer.

Artistas curitibanos revelados por você já criaram suas próprias noite de humor. A concorrência incomoda?

No começo, fiquei um pouco assustado. Depois vi que era o trajeto natural das coisas. A concorrência é saudável, é legal ter uma comparação. Mas no Ceará, por exemplo, a concorrência é muito grande, os humoristas têm de se juntar em cooperativa para se apresentar. Cada lugar tem sua característica, um estilo de comédia que pega mais. Estou me apresentando em São Paulo aos sábados e domingos e, para cada dia, faço um tipo de humor diferente. Já o carioca é mais escrachado, você pode até pegar um pouquinho mais pesado que ele não fica horrorizado.

E que tipo de humor captura o público de Curitiba?

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O curitibano tem um perfil engraçado. Ele até gosta de festa, mas não é muito de visitar os outros. Diz "Apareça lá em casa", mas não fala a hora, o endereço. É frio como o clima da cidade. O pessoal que vem de fora sempre reclama. Mas não quer dizer que o curitibano não aceita o humor. Só que é exigente. Se o humor for bem trabalhado, pega por aqui. Pode ser de qualquer tipo. No momento, estou implantando no meu shows um estilo de humor americano, de stand-up comedy, sem personagem, na linha do Bill Cosby, George Carlin, Jerry Seinfeld. É uma espécie de laboratório, e está funcionando. Já os personagens, todos dão pé. Principalmente se o público se identifica com eles.

Um de seus personagens é 100% curitibano, o office-boy Elvisley...

O boy é inspirado no cara da periferia de Curitiba. O pai dele era fã do Elvis, mas também gostava do Wanderley Cardoso. Você tem um monte de nomes engraçados na periferia: Waldercleyson, Waldevair, Waldervosney... E os apelidos? Polenta, Together, Caganeira, Furúnculo, Chupeta, Sem Sintoma, Piolho, Xarope, Pórva... Eu trabalhei como professor de inglês e tinha um boy na empresa. Comecei a prestar atenção no jeito que ele falava. Esses caras se divertem muito, com facilidade. Chamam discoteca de "som": "Eu vou no som". Já para elite é mais difícil se divertir, tem de ser uma coisa mais legal, descolada.

Falando em elite, você sempre teve um bom trânsito na alta roda. Vem de família conhecida, estudou com figuras que hoje são empresários, políticos, publicitários, etc. Esses contatos contribuíram para o desenvolvimento de sua carreira, não?

Muita gente importante que está por aí estudou comigo. Mas também já estudei no Colégio Estadual, tomei o sopão da escola pública, tenho muitos amigos de origem mais simples. Só que não sou hipócrita, não vou dizer que o fato de ser bem relacionado não me ajudou. Principalmente no começo da carreira, porque eu fazia muito show em festa de bacana. Por outro lado, quando comecei a fazer o boy no rádio, nas transmissões de futebol, conquistei o porteiro do prédio, o taxista. Considero que foi aí que as coisas começaram a acontecer de verdade. E quer saber de uma coisa? A imitação do Rafael Greca me ajudou muito a ficar conhecido na cidade. O Greca é tão engraçado que eu não mexia numa vírgula dos textos dele. Só repetia o que ele falava, e já era engraçado. Ele é humorista, tem muito humor no que fala.

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Há algum formato ou tema que não pega de jeito nenhum por aqui?

Sinto que os personagens mais arrogantes funcionam menos. Uma vez, fiz uma socialite curitibana que dizia coisas como "Oiê!", "Tá Louco!", "Ridícula!"... E falava sobre o que uma socialite realmente faz no dia-a-dia. Só que chegou no nível da antipatia, as pessoas acreditaram na personagem e viram que ela não prestava. Agora, se eu fizer a empregada tirando sarro da madame, aí pega mais. O pessoal gosta das histórias de quem anda de kombi, pega ônibus, enfrenta fila de ônibus. Esse sofrimento, com o exagero certo, sempre funciona.