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Da esquerda para a direita: Marcelo Callado, Gabriel Bubu, Gustavo Benjão e Ricardo Dias Gomes. Quarteto se conhece há anos, mas só agora lança disco de músicas próprias. Trabalhos em projetos distintos, com Caetano Veloso e Los Hermanos, adiou début do grupo | Caroline Bittencour/ Divulgação
Da esquerda para a direita: Marcelo Callado, Gabriel Bubu, Gustavo Benjão e Ricardo Dias Gomes. Quarteto se conhece há anos, mas só agora lança disco de músicas próprias. Trabalhos em projetos distintos, com Caetano Veloso e Los Hermanos, adiou début do grupo| Foto: Caroline Bittencour/ Divulgação

Opinião

Humor levado a sério

Cristiano Castilho, repórter do Caderno G

Há tempos pipocam bandas brasileiras, aqui e acolá, com referências múltiplas na bagagem. A profusão de estilos por vezes acaba virando uma mistura indefinida e insossa. Do Amor assume com veemência sua queda pelo que pode até ser chamado hoje de brega, mas faz isso com estilo, ironia e bom humor – como é o caso também da banda cearense Cidadão Instigado.

O quarteto consegue construir seu próprio universo, em que há espaço para as eternas lamentações amorosas, nonsense e principalmente diversão, marca maior do grupo.

"Vem Me Dar" é ironia pura. Uma melodia preguiçosa dá corda para um refrão quase infantil e assoviável, que por sua vez se esgota em um solo estranhíssimo e inesperado de guitarra. "Vem me dar antes que eu esqueça do amor", cantam. A música para a pista é "Chalé", com espaços perfeitos para palmas de uma possível plateia ensandecida.

O suíngue bem definido de "Morena Russa" se aproxima do que faz o grupo pernambucano Mombojó, e é entremeado pelo certeiro estilo pergunta-resposta, capaz de fazer qualquer música virar a mais pedida na rádio. Já "Shop Chop"... é algo inexplicável, melhor mesmo é ouvir.

"I Picture Myself" sugere um Calypso de all-star, apoiado em uma letra açucarada apesar das guitarras de surf music.

Na parte final do disco, a hilária "Dar uma Banda" é uma metapiada. As frases "Eu também gostaria de ter uma banda", "Eu também gostaria de ser da umbanda" e "Eu também vou fazer um bonito ikebana", são cantadas com vozes débeis e trêmulas. Porque abusa de clichês, "Isso É Carimbó" é a mais radiofônica e tenta se autoexplicar. Ao final, uma releitura desconstruída de "Lindo Lago do Amor", de Gonzaguinha, põe as cartas na mesa: Seja o que for, Do Amor é Brasil. GGG1/2

  • Disco dos cariocas foi lançado digitalmente, em CD e vinil. Suporte físico ainda é importante na visão do grupo

A história da bizarrinha banda carioca Do Amor vai na contramão do que costuma acontecer com grupos de rock. O baterista Marcelo Callado, o baixista Ricardo Dias Gomes e os guitarristas Gabriel Bubu e Gustavo Benjão se conhecem desde a adolescência, trocam risadas e acordes há pelo menos 15 anos, mas só agora lançam seu primeiro disco de músicas próprias. O motivo é nobre.

Marcelo e Ricardo formam a Banda Cê, que acompanha Caetano Veloso há pelo menos três anos ou dois discos – Cê e Zii e Zie. Gabriel Bubu foi baixista do Los Hermanos por algum tempo. E todos eles tocam na cena alternativa nacional com certa frequência, acompanhando artistas como Nina Becker, Jonas Sá, Rubinho Jacobina e Lucas Santtana. Precisavam, então, de um tempo para si. Para dar vazão ao que processavam após ouvir LPs comprados pela capa em sebos do Rio de Janeiro na década de 1990 – alguns de forró – e ao metal, ao punk e à country music presente nas respectivas discotecas do quarteto.

"Em 2006, resolvemos montar um projeto mais autoral, no qual finalmente pudéssemos tocar nossas próprias músicas. Tínhamos muitas canções e vontade de tocar. Não fazia sentido ignorar isso", explica Callado, de 31 anos. A maioria das 14 faixas já existia e são do tempo em que Callado, Bubu e Benjão formavam o grupo Carne de 2.ª. A última música do disco é uma releitura diferentona de "Lindo Lago do Amor", de Gonzaguinha, filho de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião.

O disco homônimo, lançado de forma independente pelos selos + Brasil Música e Estúdio 304 em CD luxo digipack, CD simples, LP e compacto, é um retrato maroto das referências criativas da banda, que vão da bagunça causada pelo carimbó de Belém do Pará, passando pelo mais tradicional rock inglês até se acabar em pura brasilidade. O rótulo "brega", ou "tecnobrega", já foi ventilado por aí. Mas seria superficial de­­mais encaixotar Do Amor no gênero preferido de Reginaldo Rossi e da Banda Calypso. "O disco vai além disso", concorda o próprio baterista.

É muito possível que você ria em algum momento da audição de Do Amor. Letras quase sacanas, no limite do deboche, contempladas por músicos incontestáveis sugerem realmente algo original, que soube se aproveitar com bom gosto da riqueza da música, principalmente a da música brasileira.

"É o nosso jeito mesmo. Temos esse humor peculiar, mas levamos isso a sério. Não fazemos para ser palhaçada. Escrevemos de um jeito engraçado, mas o que está por trás não é gratuito", diz Cal­­lado, que não se preocupa com a primeira impressão que o trabalho possa causar em um ouvinte desavisado. "Da mesma forma que tem gente que pode achar bizarro ou que estamos de brincadeira, há muitos que gostam. Tudo foi ideia nossa e não nos privamos de usar nossos artifícios", explica o músico.

Do Amor tem outros bons cartões de visitas. Foi produzido por Chico Neves – Lenine, Paralamas do Sucesso, O Rappa e Skank –, e mixado na Inglaterra por Tchad Blake, que subiu e desceu botões enquanto trabalhava em discos de Paul McCartney, Tom Waits e Peter Gabriel.

Callado e Dias Gomes estão de "folga" da Banda Cê, já que Caetano Veloso encerrou a turnê de Zii e Zie e se prepara para produzir o novo disco de Gal Costa. Agora, finalmente, concentram energias em seu próprio trabalho. O show de lançamento acontece amanhã, em São Paulo, na companhia da curitibana Banda Gen­­tileza. A troca de figurinhas acontece em Curitiba, dia 22 de outubro, no Jokers, quando os curitibanos recebem os cariocas. Antes, o bonde Do Amor ainda passa por Sergipe e Pernambuco.

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