Roberto Alvim, orientador do Núcleo de Dramaturgia do Sesi Paraná, dirigiu a primeira peça do dramaturgo curitibano Paulo Zwolinski.| Foto: Rogério Viana/Divulgação

Mostra de Dramaturgia do Sesi/PR

Para apresentar os frutos de nove meses de atividades, o Núcleo de Dramaturgia do Sesi/PR armou uma mostra paralela no Festival de Curitiba. Além da estreia de Como Se Eu Fosse o Mundo, a programação traz uma variedade de leituras dramáticas conduzidas por diretores curitibanos e convidados de destaque

Livro e mesa

Debate

Roberto Alvim, Mário Bortolotto e a crítica de teatro e dramaturga Gabriela Melão se encontram em uma mesa-redonda mediada por Walter Lima Torres. Na ocasião, será lançada a publicação de 17 peças de autoria de integrantes do núcleo. Dia 20, às 15 horas.

Espetáculo

Como Se Eu Fosse o Mundo

Texto de Paulo Zwolinski. Direção de Roberto Alvim. Com Patrícia Kamis e Thiago Luz. Dias 26, 27 e 28, às 21 horas.

Leituras dramáticas(Você)

Texto de Alexandre França. Direção de Nina Rosa Sá. Dias 23, às 15 horas, e 24, às 18 horas.

Antes do Fim

Texto de Marcelo Bourscheid. Direção de Marcos Damaceno. Dias 23, às 18 horas, e 25, às 15 horas.

(Em) Branco

Texto de Patrícia Kamis. Direção de Marcio Mattana. Dias 24, às 15 horas, e 25, às 18 horas.

Teia

Texto de Douglas Daronco. Direção de Edson Bueno. Dias 27, às 15 horas, e 28, às 18 horas.

Inverno

Texto de Pretto Galiotto. Direção de Marcio Abreu. Dias 27, às 18 horas, e 28, às 15 horas.

Leituras Dramáticas Convidadas

Descartes com Lentes

Texto de Paulo Leminski. Direção de Marcio Abreu. Dia 21, às 16h30.

Projeto Lulu – A Caixa de Pandora

Texto de Frank Wedekind. Com a Cia. dos Atores. Dia 23, às 21 horas.

Estúpido Direito de Sofrer

Texto de Jô Bilac. Direção de Vinicius Arneiro. Dias 24, às 21 horas.

Mente Mentira

Texto de Sam Shepard. Direção de Paulo de Moraes.

Com Malvino Salvatore. Dia 25, às 21 horas.

Onde

Teatro José Maria Santos (R. Treze de Maio, 655), (41) 3222-7150.

Serviço:

Confira a programação completa do Festival de Curitiba. Acesse http://guia.gazetadopovo.com.br/teatro

CARREGANDO :)

Nada tem mais peso no teatro de Roberto Alvim do que a presença humana – provavelmente nem a palavra, que é sua matéria-prima essencial. É possível percebê-lo desde a aparição de Patrícia Kamis na primeira cena de Como Se Eu Fosse o Mundo, o espetáculo que está sendo ensaiado no Teatro José Maria Santos para estrear em 26 de março, no Festival de Curitiba. A atriz cumpre a passos lentos um trajeto linear sob a penumbra vazia, seus braços pendem semi-imóveis, os traços do rosto pouco se distinguem. Por instantes, toda a atenção se volta à existência dessa mulher.

"Para que tantos refletores, tanta cenografia, como se a presença de um indivíduo numa sala não mudasse tudo?", pergunta o diretor que trocou o Rio de Janeiro por São Paulo, e desde o ano passado vem semanalmente a Curitiba orientar as atividades do Núcleo de Dramaturgia do Sesi/PR. "Perdeu-se a fé na capacidade do ser humano de recriar o mundo à sua volta", sentencia Alvim.

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O minimalismo que propõe para a cena já se via em montagens anteriores, como Anátema, com Juliana Galdino (sua esposa e parceira na companhia Club Noir), mas foi se tornando mais radical e abstrato com o passar do tempo. A economia de elementos cênicos e até mesmo gestuais se identifica menos ao estilo cravado na produção contemporânea de um diretor como Peter Brook – "politicamente correto demais" – do que com o teatro interiorizado do francês Claude Régy, de 87 anos, que dirigiu Isabelle Huppert em 4.48 Psicose. "Foi ele quem me fez ver as possibilidades de um teatro que estabelece relações adultas."

"Adulto" é a palavra que se repete no discurso do encenador brasileiro. "Me enojam os espetáculos que apresentam o ser humano infantilizado. A minha vida e a daquelas pessoas é muito mais rica espiritual e filosoficamente do que isso que fazem no palco. É um assassinato da sensibilidade coletiva", dispara.

Foi essa maturidade que Alvim tanto persegue, aliada a uma composição humana complexa, ambígua, que o atraiu em Como Se Eu Fosse o Mundo, primeira peça escrita pelo curitibano Paulo Zwolinski, de 25 anos, cuja trajetória profissional passou pelo teatro de rua do grupo Gats, em Santa Catarina, e pelo Teatro Lala Schneider, antes de ingressar no núcleo de dramaturgia onde diz ter aprendido que não precisava de lições de moral: de uma situação corriqueira poderia se originar um grande espetáculo.

Patrícia Kamis, também integrante do núcleo, e Thiago Luz, ator convidado, estão em cena. Dez anos da vida de um casal correm em 45 minutos de espetáculo, flutuando por tempos e espaços variantes sem se apoiar em mudanças de luz ou figurino para tornar mais explícita a transição. "É um tipo de estratégia de construção muito sofisticado. O texto vai contaminando a imaginação com sensações não racionais", diz Alvim.

Além da profusão de imagens sugeridas, a escrita de Paulo Zwolinski é marcada pela musicalidade, palavras que ecoam. Tal característica é valorizada na montagem, em um cuidado especial concedido às falas dos atores (parte delas, ouvidas em off), enquanto a única intervenção sonora exterior é um piano desconstruindo Cenas da Infância, de Robert Schumann.

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"A Patrícia e o Thiago têm timbres muito bonitos e diferentes um do outro. Essas são questões tão importantes quanto o significado das palavras, porque dizem respeito às sensações do desencontro terrível que acontece entre os dois personagens", diz o diretor. Sem revelar muito mais da história do que a inspiração no mito grego de Medeia já pode antecipar, trata-se de um descompasso amoroso, agravado pelo nascimento do filho.

Roberto Alvim percebe o próprio trabalho em Como Se Eu Fosse o Mundo como "controverso", "difícil". Prevê que haja quem não se interesse por estabelecer vínculos com a peça e até mesmo espectadores prontos a sentenciar que "isso não é teatro". O risco desse prognóstico se concretizar, porém, reside tão-somente nas expectativas equivocadas que se pode criar antes de adentrar qualquer sala de espetáculo.

A encenação certamente quebra muitas delas: não persegue a ilusão, quase não se vê o rosto dos atores sob a penumbra fria, a gestualidade é praticamente anulada, em nenhum momento o homem e a mulher contracenam olhos nos olhos. Nada disso, contudo, fere a coerência interna da obra. Muito pelo contrário. Somem as distrações para que os sentidos se concentrem na essência de um homem e uma mulher submetidos à condição de casal.

Novos dramaturgos em alta voltagem

Roberto Alvim é categórico quanto ao motivo de ter se decidido a montar Como Se Eu Fosse o Mundo, um dos 30 textos teatrais que os participantes do Núcleo de Dramaturgia do Sesi/PR produziram sob a sua orientação. "Estou dirigindo essa peça agora porque foi excepcional o que aconteceu no ano passado. Senão eu não estaria aqui. Foi absolutamente surpreendente para todos os envolvidos a qualidade das obras, a absorção de estratégias dramatúrgicas de ponta – como se faz em Berlim e na Inglaterra –, e a resposta autoral", diz o diretor.

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Foram nove meses de encontros às terças-feiras em Curitiba. Alvim, principal ministrante, trouxe consigo a experiência de ter formado uma nova geração de dramaturgos no Rio de Janeiro entre 2002 e 2005, no Teatro Ziembinski. Depois de um vazio criativo pós-besteirol da década de 80, surgiram autores que passariam à linha de frente da produção carioca como Daniela Pereira de Carvalho, Marcelo Pereira e Pedro Brício.

"Sinto essa mesma voltagem criativa aqui em Curitiba. Por isso, acho extremamente promissor o prognóstico desses autores a médio e a longo prazo", diz o mentor.

Uma primeira amostra significativa do potencial criativo desses curitibanos será vista na Mostra de Dramaturgia do Sesi/PR, realizada no teatro José Maria Santos entre os dias 20 e 28 de março, durante o Festival de Curitiba. A programação é representativa do que se produziu no ano passado no núcleo e foi pensada menos segundo critérios de "melhores obras" do que na tentativa de compor um painel diversificado de artistas e linguagens.

Dezesseis peças foram escolhidas para ganhar uma publicação em livro. E cinco delas foram entregues a diretores curitibanos como Edson Bueno e Márcio Abreu para que as apresentassem ao público na forma de leituras dramáticas.

Outras quatro obras de dramaturgos consagrados serão lidas no evento por convidados: o grupo Teatro Independente (em cartaz na Mostra Contemporânea com Rebu e no Fringe com Cachorro!), a Cia. dos Atores (que trabalha com uma peça fundamental do expressionismo alemão, A Caixa de Pandora) e Paulo de Moraes, diretor do grupo Armazém, com Mente Mentira, peça de Sam Shepard para a qual prepara uma montagem produzida pelo ator Malvino Salvador. (LR)

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Serviço:

O Núcleo de Dramaturgia do Sesi/PR está com inscrições abertas para novos integrantes até 8 de março. Para mais informações, acesse www.sesipr.org.br/nucleodedramaturgia