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Muitos artistas estrangeiros desembarcam em Curitiba, trazendo na bagagem a esperança de concretizar sonhos e fincar raízes. As diferenças entre desejo e realidade, no entanto, não tardam a ser constatadas. A cidade, apesar da imagem de centro cultural da qual desfruta, ainda tropeça nas pedras do provincianismo, da escassez de oportunidades e da falta de reconhecimento de quem faz e acontece em seus limites geográficos.

De recém-chegados a forasteiros que já estão há décadas na cidade, todos reconhecem que ser estrangeiro em Curitiba, ainda mais quando o assunto é arte, não é uma viagem ao Eldorado.

"As pessoas não estão tão sorridentes como antigamente", afirma o argentino Reynaldo Pedro Omar, que em 1962 desembarcou com a família no Rio de Janeiro. O multiartista – Omar é escritor, escultor, pintor e compositor de música erudita, além de publicitário ("A única profissão que me deu dinheiro fácil") – ficou encantado com o amor do povo brasileiro por sua própria música e seu folclore.

Há mais de 50 anos no Brasil – e desde 1967 em Curitiba – Omar pôde perceber as mudanças drásticas na vida do país. Para ele, o nível cultural da população é cada vez pior e isso se deve à má administração pública, que não prioriza a educação básica. "O povo foi enganado. O Brasil não é um país pequeno. É preciso competência para irradiar a cultura sem que ela vá perdendo sua força", afirma.

O cineasta Pablo Ahumada nasceu em São Paulo, onde passou parte de sua infância. Aos 7 anos, sua família, de origem argentina, voltou para Buenos Aires e ele foi junto. Já adulto e casado, decidiu retornar para o Brasil e escolheu Curitiba para viver. Em sua opinião, a aculturação da população brasileira é um problema mundial. "Perdemos nossa própria iniciativa de pensar coisas, de gerar. A Argentina também está perdendo sua tradição cultural. São forças muito poderosas que trabalham para que isso aconteça", diz, referindo-se aos fenômenos produzidos pela globalização.

Reconhecimento

Quando chegou ao Brasil, há 11 anos, a cantora Edith de Camargo dava aulas de alemão e de música para sobreviver. Há dois anos, a escola onde trabalhava fechou. Foi a desculpa que ela precisava para arriscar: passou a se dedicar exclusivamente à vida artística. Além dos shows que faz pela cidade com a banda Wandula, ela compõe trilhas para teatro e filmes. Por enquanto, está se saindo muito bem. "É um privilégio e considero que tenho sorte, mas é uma situação instável", conta.

O violinista Atlin Ellenderson, nascido nas Ilhas Faroe (que, junto com a Groenlândia, fazem parte do reino da Dinamarca), casou-se com uma brasileira na Suíça. Mas não foi esse o motivo que o trouxe ao Brasil, há 17 anos. O casal estudava música em Copenhague quando recebeu o convite para trabalhar na Orquestra de Câmera de Blumenau, mas acabou aportando em Curitiba. Desde então, Atlin vive na capital paranaense, onde atualmente é violinista da Camerata Antiqua. Para ele, mesmo tendo um padrão de vida elevado, comparado a outras cidades do país, Curitiba não remunera bem os seus músicos. "Proporcionalmente, ganhamos menos do que os músicos da Orquestra de Câmera de Blumenau. O que dirá de cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre?", lamenta.

Movimento kamikaze

Edith brinca que em Curitiba existe o que chama de um "movimento kamizake". "Não há shows e, quando vem alguma coisa de fora, é sempre muito caro", conta. Para ela, há um grande corte que divide a produção cultural da cidade em duas: aquela feita pela cena alternativa, que luta para sobreviver, e a consumida pelas elites que lotam o Teatro Guaíra para assistir a espetáculos teatrais protagonizados por atores globais. "Em Curitiba, tudo é para dentro. O mercado é pequeno, vai até certo ponto e depois fica saturado", completa Omar.

Desde 2001 em Curitiba, Pablo Ahumada fez algumas constatações sobre os mecanismos de apropriação cultural que o desagradaram. "O indivíduo não existe. O artista depende de grupos, de comunidades para ser reconhecido", diz. Isso produz uma resistência não só a quem vem de fora, mas a tudo o que é novo, de forma geral. Até a crítica se encolhe, diante de grupos que se ensimesmam e protegem. "A ignorância coletiva cria o medo de criticar. O brasileiro não quer ofender, machucar. É uma timidez que prejudica", declara Omar.

Ahumada sente saudades da intensa – e insone – vida cultural de Buenos Aires. "Às três horas da manhã, eu podia ir a uma peça de teatro ou à Biblioteca Nacional". Ele sabe que a violência dos grandes centros urbanos no Brasil é um dos fatores que impedem que o brasileiro faça a mesma coisa, mas acha que isso pode ser uma boa desculpa para que nenhuma mudança seja feita. "Nós entregamos a rua para os delinqüentes", diz Omar.

Faltam iniciativas de apoio à cultura. Ahumada chama o cinema feito em Curitiba de "pseudo-cinema", não por sua qualidade, mas porque o universo de produção está muito limitado. "Não existe mais um produtor, alguém que compre sua idéia. Isso cria dificuldades para sair de Curitiba e fortalecer o trabalho", explica Edith. "Há a Lei de Incentivo à Cultura, mas é preciso planejar quatro ou cinco anos antes", completa.

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