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Antonio Prata se confirma como um dos mais importantes nomes da nova geração de escritores brasileiros | Divulgação
Antonio Prata se confirma como um dos mais importantes nomes da nova geração de escritores brasileiros| Foto: Divulgação

Livro

Nu, de Botas

Antonio Prata. Companhia das Letras, 144 págs. R$ 31. Crônica.

Uma alegoria futebolística sobre arbitragem pode muito bem servir de referência para Nu, de Botas, de Antonio Prata, obra que concorre ao Prêmio Portugal Telecom 2014 na categoria Conto/Crônica: juiz bom não aparece. Se no futebol, a lógica é utilizada para árbitros que não comprometem o resultado, aqui podemos aplicar ao exímio trabalho de costura realizado por Prata, que construiu uma teia narrativa abrangente e suave.

De fato, desde Meio Intelectual, Meio de Esquerda, de 2010, o cronista paulistano figura entre os principais nomes da nova geração de escritores brasileiros. Diferentemente de seu pai, o dramaturgo e romancista Mário Prata, de carreira consolidada e contador de histórias sem concessões, interessa ao filho um outro sedimento, mais ao encontro do que está por baixo da banalidade e dos fatos mais simples do cotidiano.

O enredo de Nu, de Botas é simples como andar de bicicleta. O escritor recria as lembranças familiares e vai tecendo um relicário de alumbramentos e espantos diante dos primeiros contatos com a vida – e as suas contradições. Dividido em pequenos capítulos, há de estudos singelos sobre a alfabetização à sua relação com os tatus-bola.

"Toda reverência aos tatus-bola. Tocava-os de leve para vê-los se fechar em suas esféricas armaduras, depois os rolava para cá e para lá. Um dia, talvez influenciado pela semelhança visual e fonética entre bolas e balas, tentei comer um deles. Minha mãe (n)o(s) salvou na última hora, tirando-o da minha boca e devolvendo-o à terra ainda intacto. Não ficou registrado na crônica familiar se alguma vez, longe da supervisão materna, eu e os tatus-b(a)ola chegamos às vias de fato."

Embarcação

Prata não emula a infância como um território mágico e nostálgico, mas sim como uma superfície semântica, onde o chão dos adultos parece imenso, marítimo. Seu percurso é de um descobridor de mundo, um pequeno barco tentando entender porque a água é água. A passagem em que o narrador e um amigo resolvem ir de Itaparica à África, se enfiando nas ondas, para desespero dos pais, é exemplar do tom carinhoso da narrativa.

"Estávamos em mar aberto. A calma e o silêncio aumentaram a ansiedade: a África, que ali da praia, poderia ser apenas um sonho, era agora quase tangível. Algumas braçadas e estaríamos na savana. Quando eu contasse na escola, ninguém iria acreditar. Antes de seguirmos adiante, breve debate sobre o que fazer para nos protegermos da fauna hostil. Como nenhum de nós se lembrava de ter visto imagens dos grandes felinos do mar, parecia seguro observar leões, leopardos e panteras de dentro d’água."

E são estes pequenos sustos, somados à precisão de um narrador leve e bem humorado, que fazem de Nu, de Botas uma considerável expansão da crônica. É como se o ensaísta Montaigne encontrasse Rubem Braga e os dois saíssem para observar o desentendimento do mundo pela ótica de uma criança. Não é pouco.

Vencedores devem ser conhecidos neste mês

Dividido em três categorias – Romance, Poesia, Conto ou Crônica – o Prêmio Portugal Telecom é um dos mais importantes do circuito literário. Realizado em três etapas, o conselho editorial escolhe, ao fim do ano, três livros entre doze finalistas e premia-os com a bagatela de R$ 50 mil. Após o resultado, os jurados se reúnem novamente para escolher o Grande Prêmio, que dá mais R$ 50 mil ao vencedor geral. Ambos resultados saem ainda em novembro.

Criado em 2003, a premiação se divide, em importância, com o Prêmio Jabuti, oferecido pela Academia Brasileira de Letras (ABL), o Prêmio Camões, conferido de dois em dois anos a autores nacionais, e o Prêmio Governo de Minas Gerais de Literatura.

Em onze anos, 32 obras foram premiadas, sendo 18 romances, oito livros de contos e seis de poesia. Dois paranaenses já foram laureados. Em 2008, Cristovão Tezza e seu O Filho Eterno venceram na categoria Romance. O outro (recorrente) vitorioso é Dalton Trevisan, que já ganhou com as obras O Anão e a Ninfeta (2012), Macho Não Ganha Flor (2007) e Pico na Veia, de 2003.

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