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Personagem quebra a quarta parede e “manda” no público | /Divulgação
Personagem quebra a quarta parede e “manda” no público| Foto: /Divulgação

“A vida passa muito rápido. E se você não curtir de vez em quando, a vida passa e você nem vê.” Se alguém do movimento “Save Ferris” tivesse ouvido o protagonista justificar seu intricado sistema para enganar os pais, burlar a escola e aproveitar um belo dia de primavera, nasceria imediatamente o “buellerismo”. Mas a corrente filosófica que diz que o prazer é o caminho para a felicidade já existia bem antes das primeiras calças baggy. A obra de John Hughes, repleta de referências filosóficas, é uma espécie de introdução básica ao assunto.

Aos 18 anos, Ferris é a cara do hedonismo na idade moderna, representado pelo iluminista Julien Offray de la Mettrie. Se o “carpe diem”, que o igualmente cult “Sociedade dos Poetas Mortos” ajudou a virar lema nos anos 1980, expressava o mais puro epicurismo, que diz que devemos procurar o prazer de forma moderada, “Curtindo a Vida Adoidado” é a atualização e radicalização dessa busca, transformada em um amoralismo que não costuma levar em conta as outras pessoas.

Exemplos disso é o modo de agir de nosso herói: ele arma teatrinhos para os pais, invade o sistema do colégio para apagar faltas, manipula os amigos e até no improviso (como quando consegue uma mesa no restaurante chique Chez Quis), consegue o que deseja. Afinal, quem resiste a tamanho charme?

Super-homem, segundo Nietzsche

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Outro aspecto que sempre enxergam em Ferris é o do super-homem, ou além-homem, que Nietzsche identifica em “Assim Falou Zaratustra”. Por essa perspectiva, ao negar valores e leis já estabelecidos e reafirmar o que se é em essência, sem concessões, uma pessoa pode desenvolver todo seu potencial e, em liberdade, ir mais longe do que qualquer outro ser humano.

Em uma das quebras da quarta parede no início do filme, Ferris diz, olhando para a câmera: “Não condeno o fascismo. Ou qualquer outro ismo. Na minha opinião os ismos não são bons. As pessoas não deveriam acreditar em ismos, mas em si mesmos. Eu cito John Lennon: ‘Eu não acredito nos Beatles, só acredito em mim’”. “Vontade de poder”, uma das características do tal além-homem segundo Nietzsche, não faltam ao personagem.

Mas não é só no discurso que Hughes enfatiza essa superioridade de Ferris. O personagem é senhor eterno da cena. Ele não segue as regras, mas dita as que Cameron, núcleos escolares dos quais nem faz parte, a irmã e até o público devem seguir. “Até na ausência, é uma presença notável. Bueller é o protagonista no sentido pleno: ele é dono do mundo, dono da narrativa, tudo gira em torno dele, ele é maior do que tudo, inclusive do que a própria narração”, diz o crítico de cinema Wellington Sari, citando a cena em que o professor de economia insiste em seu nome na hora da chamada.

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