A arquitetura é mais que um abrigo físico. É também refúgio psicológico e guardiã da identidade de seus habitantes. Convencido de que "somos pessoas diferentes em lugares diferentes" e, portanto, à arquitetura cabe nos lembrar de quem poderíamos ser, o filósofo suíço Alain de Botton fez de seu livro A Arquitetura da Felicidade, recém-lançado pela Rocco (272 págs., R$ 42), uma reflexão sobre a volátil noção de beleza a partir de um ponto de vista emocional.
"Sentir uma sensação de beleza é sinal de que encontramos uma expressão material de certas idéias que temos do que seja viver bem", define o autor de As Consolações da Filosofia e O Desejo de Status, entre outros títulos. A beleza arquitetônica vem, portanto, dessa promessa de felicidade que cada edificação com sua fachada mais despojada ou aristocrática, a decoração em tons alegres ou sóbrios, linhas retas, curvas ou adornadas pode suscitar. Arquitetura é, enfim, capaz de sugerir distintos "estados de alma".
Ao se sentir atraído pela beleza de um espaço construído, o que sucede, na opinião de Botton, é o desejo de parecer-se com o que se vê. Pensando nisso, o filósofo propõe a arquitetura como um recurso para equilibrar a personalidade e a rotina de quem habita um lugar. Uma questão de contraste: escolher para a construção as características em que se é deficiente. O minimalismo e o rústico seriam os dois grandes estilos atuais por esse critério. Fornecem a calma e o contato com a natureza que a vida (pós)moderna esqueceu.
A determinação psicólogica na arquitetura não é uma idéia exclusiva do filósofo francês. Como ele, Emerson Vidigal, mestre em Arquitetura e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Centro Universitário Positivo (UnicenP), identifica o prazer visual como um fator que tem forte relação com a felicidade. Se, por um lado, o contato com um ambiente agradável proporciona alívio ao cotidiano, do outro, a poluição visual é capaz de gerar mais estresse. A arquitetura "altera o humor", resume o professor.
Esse poder, é claro, pode e deve ser usado à favor de quem habita um lugar. "O arquiteto pode auxiliar o cliente a estabelecer qual é o padrão estético comum aos dois. E ele tem o papel de explicar ao cliente de que maneira esse espaço trará efeitos psicológicos à família que vai viver naquela casa", opina Vidigal.
A tarefa, muitas vezes, é de convencimento. "Há casos em que o cliente busca um ambiente que não corresponde aos seus hábitos de vida, exigindo dele sacrifícios que não está preparado para fazer", afirma o arquiteto curitibano Alfred Willer.
É o caso de salas de estar decoradas com abundância e luxo, mas que não se adaptam aos costumes diários do proprietário e acabam sem função na casa.
A afinidade do habitante com o espaço ao seu redor é decisiva para a sensação de conforto e de alegria que o ambiente pode provocar, na opinião do arquiteto Manoel Coelho.
"O arquiteto deve respeitar as características emocionais e culturais da família e os seus hábitos. Tudo isso deve ser levado em conta para tornar os espaços adequados para os vários momentos, nas áreas de convivência e nas áreas íntimas. Quanto melhor o arquiteto entender isso, maior será a felicidade da família", opina.
Nem sempre é o que acontece. Um dos motivos é que a casa sonhada seria algo difícil de materializar. "Não é somente um objeto arquitetônico concreto, é memória de fatos vividos, espaços, sensações", diz a coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFPR, Josilena Gonçalves.
Outro é que, muitas vezes, o temperamento e o estilo de vida dos habitantes é tomado menos em consideração do que modismos e desejos de status.
A pouca familiaridade de alguns profissionais com os aspectos subjetivos a serem levados em conta em uma construção também surge como empecilho. "Falta tentar enxergar o ser humano de maneira mais ampla", opina Emerson Vidigal. "Os arquitetos não estão preparados do ponto de vista das ciências humanas para pensar o que é viver nos espaços hoje".
Aí está um grande problema. Afinal, a arquitetura deve refletir o seu lugar e o seu tempo. Mas, quando a qualidade de vida é algo tão desejado quanto distante, como acontece na rotina moderna, a falta de qualidade arquitetônica se torna uma queixa mais constante. É um dos males da arquitetura brasileira em geral praticada hoje, na opinião de Manoel Coelho, para quem a crise abala arquitetos e projetos. "A arquitetura brasileira é também conseqüência do momento social, econômico e político", diz.
Embora os arquitetos não tenham poder para resolver os problemas sociais, Vidigal acredita que eles podem colaborar ao menos para melhorar os espaços onde o homem vive e a influência psicológica destes nos habitantes. "A gente (arquitetos) consegue conceber uma casa como uma ilha de segurança para que o proprietário saia do estresse para sua ilha de conforto. Mas ela não é suficiente diante da correria da vida. Sozinha, não dá conta", diz.
A opinião é coerente com a de Alain de Botton. A beleza arquitetônica está longe de ser uma garantia de felicidade ou ainda de melhora da personalidade de quem a contempla. Isso porque a arquitetura apenas sugere. Não impõe.
Lula tenta se aproximar do favorito à presidência da Câmara, mas Hugo Motta quer independência
Maduro fala em usar tropas do Brasil para “libertar” Porto Rico; assista ao Sem Rodeios
Guinada da Meta pode forçar desvio de rota de STF e Lula quanto à censura nas redes
Enquete: você acredita que a censura nas redes sociais vai acabar após a declaração de Zuckerberg?
Deixe sua opinião