Faz tempo que ser um espectador de teatro não significa apenas assumir sua cadeira na plateia e reagir, sobretudo internamente, ao que lhe é apresentado. A velha imobilidade diante dos palcos italianos tem experimentado, na cena contemporânea, um sem número de chacoalhões, à medida que os espaços de encenação variam.
Quem frequenta as peças de José Celso Martinez Corrêa sabe que se sentar perto dos atores pode significar uma entrada em cena. Em A Terra, primeiro capítulo da pentalogia de Os Sertões realizada pelo Teatro Oficina, pessoas da plateia eram convidadas a representar uma vaca ou a engrossar o cordão humano dos acidentes geográficos sertanejos. Não faltavam os dispostos a tirar a camisa se fosse preciso, deixando o pudor para os das fileiras mais altas e aderindo à libertação ritualística imanada pelo diretor.
Outro tipo de interação, e comprometimento físico, exigia a Cia. Livre, de São Paulo, na peça VemVai O Caminhos dos Mortos. Ao longo de um galpão, o espectador era estimulado a acompanhar os deslocamentos dos atores, levando nas mãos um boneco de papel, no qual deveria projetar a figura de um morto querido.
Exemplos aleatórios. Mas indicam outras possibilidades de envolvimento da plateia com a encenação teatral. Guardadas as particularidades de cada obra, muito diferentes entre si, essa sacudida na tranquilidade da posição do público é um dos aspectos mais interessantes da proposta do espetáculo A Viagem, com o qual a Companhia Brasileira de Teatro ocupa o Novelas Curitibanas de quarta-feira a domingo, até o fim do mês.
Explicando rapidamente: a peça consiste de 11 histórias elaboradas por igual número de atores, que formam duplas (um personagem e um espectador) para explorar os cômodos do casarão onde o teatro está instalado. Um detalhe: o público faz o caminho vendado.
Nessa situação nova cuidadosamente forjada para não causar desconfortos associados à interação teatral , o papel de quem costumeiramente assistiria à peça se transforma. Para começo de conversa, a visão é substituída pela audição e pelo tato.
A recepção passiva está fora de questão. O espectador é incitado a participar da história que o personagem (de quem ignora o rosto) lhe conta, ajudando numa busca ou opinando sobre seus dilemas. Essa sorte de ações banais inaugura uma demanda inédita para quem sempre teve função meramente receptiva a cumprir no jogo teatral. Além de estabelecer vínculo e confiança, para que a dupla funcione é preciso acreditar no personagem.
Só assim se superam as respostas automáticas do tipo dar alguns passos adiante quando se é impulsionado à frente rumo a uma interação convicta, que altere de fato a trama, como tentar persuadir o personagem a mudar de atitude.
Mais do que de praxe no teatro, a experiência nunca se repete. Desde que cada espectador fica à mercê exclusivamente do ator que o escolhe, é impossível comparar as atuações ou ter uma noção de completude da obra. Isso, apenas as diretoras Giovana Soar e Nadja Naira talvez consigam.
O que deve ser comum a muitos dos dispostos a seguir nessa viagem é essa inquietação de ser chamado a agir. E quando o faz, o espectador está acreditando no personagem como um ser humano ou passa a assumir um personagem também?
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