A tarefa de contar uma história que já está há tanto tempo no imaginário das pessoas é uma tarefa árdua. Ainda mais quando se trata de uma trajetória musicada, como em "Faroeste Caboclo" (Legião Urbana), em que cada um dos milhões de fãs da principal banda de rock da geração dos anos 1980 imaginou de um jeito o destino do menino que foi parar na capital federal.
Pois quem foi assistir ao espetáculo O Santo Cristo no Teatro Regina Vogue, que volta ao cartaz em fevereiro de 2013, encontrou no palco a mensagem principal da canção retratada em uma montagem criativa, inteligente e bem pensada.
No espetáculo de Maurício Vogue, que contou com a colaboração do dramaturgo Renan Queiroz, não há uma trajetória contada de forma tradicional, com começo e meio e fim. Como em um livro que corrompe a cronologia da história e surpreende o leitor com a revelação, a conta-gotas, dos personagens, a narrativa nada linear mistura um formato de bastidores, teatro tradicional, vídeo e música ao vivo, tudo junto no palco.
A bem bolada união de mídias é feita para quem gosta de arte desafiadora. Tanto que é inevitável, vez ou outra, o espectador repassar a canção de nove minutos na cabeça para tentar assimilar as tantas informações que acontecem no tablado.
O foco principal da montagem é o menino que saiu do interior para tentar a sorte na cidade grande. A desconstrução do imaginário começa com o espaço. Não é em Brasília que a história se passa. Na verdade, na peça, o lugar é secundário. O que importa é mostrar um João de Santo Cristo, como tantos, que morre mais de uma vez de desgosto e sofrimento e recomeça a vida tentando um novo caminho.
O incentivo para a reflexão é o impulso de toda a montagem. Além de fazer o público pensar nas questões centrais a dificuldade de regeneração de quem quer tentar fazer o certo e a corrupção contínua no país (abordada, aliás, de forma irônica e muito inteligente) a peça ainda levanta assuntos nem tão evidentes na canção. Entre eles, o estrupro, que rende uma das cenas mais chocantes do espetáculo.
A trilha sonora ajuda a contar a história. Criada pelo compositor Leo Fressato autor do hit "Oração", da Banda Mais Bonita da Cidade , a participação musical ao vivo dá uma emoção a mais ao espetáculo. Bandas inteiras surgem quase do nada no palco, isso sem falar nas performances vocais dos atores, que surpreendem quando, de repente, soltam o vozeirão.