A distância é algo que morreu. Há quem não concorde com a ideia que o jornalista e escritor Daniel Piza defende, mas os meios virtuais contribuíram não só para que pessoas pudessem ficar próximas mesmo em diferentes continentes, mas também no "encolhimento" do campo econômico e da cultura. "Hoje vemos no cinema coproduções entre França, Tailândia e Argentina. Você visita a Embraer e vê que a asa do avião vem da Alemanha, as poltronas do Chile. O produto passou a ser uma composição de diversas origens diferentes com a economia e a cultura mais interdependentes", diz Piza, que lançou no início de junho o livro Dez Anos Que Encolheram o Mundo (Editora Leya, 224 págs), no qual analisa as modificações de cinco grandes áreas (política e economia, cultura e comportamento, ciência e tecnologia, meio ambiente e metrópoles e esportes) na última década. Confira os principais trechos da entrevista que ele concedeu por telefone, de São Paulo, à Gazeta do Povo:
Você afirma, na introdução do seu livro, que a tecnologia da informação foi a invenção que mais gerou transformações. De que maneira ela afetou os comportamentos?
É um mundo menor, no que diz respeito aos aspectos culturais e econômicos, que estão mais interdependentes. Uma crise financeira em determinado país pode afetar os mercados do mundo inteiro. Essa década não termina ou começa algo, mas acentua algumas coisas. Nos anos 1990, existiam muitos manifestos contra a globalização, que desapareceram no século 21. As economias desenvolvidas dependem das emergentes. É um mundo mais multipolar, menos hierarquizado em todas as áreas.
Como você vê a utilização da internet por artistas de diversas áreas?
Esses fenômenos da web mostram que uma iniciativa modesta e caseira pode adquirir uma escala que, em outros tempos, seria necessário todo um sistema de produção e um grande aparato por trás para que fosse possível. Uma empresa pequena que oferece determinado serviço pode bater uma empresa maior que não teve a mesma ideia. A boa ideia, a criatividade artística, valem muito. As funções possibilitadas pela tecnologia também modificaram a maneira de fazer cinema, por exemplo. Se você pega filmes como Cidade dos Sonhos (de David Lynch) e Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças (de Michel Gondry), eles são fragmentados em função da tecnologia digital, que permite descolar blocos da narrativa.
Os meios clássicos de divulgação ainda continuam relevantes?
Sem dúvida. Esse fenômeno não significa que os grandes grupos e entrocamentos ainda não tenham muita força. Algumas coisas mudaram, como no consumo de musica, e os CDs têm importância comercial muito pequena. Em contrapartida, a indústria de shows ficou mais forte e internacional, justamente, por conta desse encolhimento do mundo. Cidades como São Paulo e Rio de Janeiro nunca receberam tantos shows internacionais, pois, para os artistas. gera mais dinheiro uma turnê mundial, que vira um DVD e será outro produto cultural comercializado.
E na literatura, você acredita que haverá uma crise editoral tão grave quanto a da indústria fonográfica?
Diferentemente da musica, a literatura não tem a mesma facilidade. As editoras ainda são mais fundamentais do que a gravadora para o mundo da musica. Muitas editoras estão fazendo um trabalho na internet e no papel, no qual você pode encomendar uma única impressão de um livro, por exemplo. É claro, a nova configuração de mundo terá muita leitura que não é em papel. Mas a leitura num e-book ainda é muito semelhante a que se faz no papel, a dinâmica é a mesma de um livro comum. Uns dizem que não é tão confortável ou charmoso um leitor eletrônico, mas isso depende de cada um.
Qual o papel da crítica cultural tradicional hoje? Tem o poder de legitimar um artista?
Continua muito importante, mas, quando você publica um livro, faz um filme ou CD, não terá só a recepção de grandes críticos, mas de uma infinidade de blogs que estão na internet. Isso é muito forte principalmente no mundo da moda, onde as blogueiras ganharam uma relevância tão grande quanto quem trabalha na revista Vogue. É um mundo mais pulverizado, com mais fontes.
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