Fitz: “Na noite escura da alma é sempre três horas da madrugada.”| Foto: Divulgação
Compilação - Pileques. F. Scott Fitzgerald. Tradução de Donaldson M. Garschagen. Companhia das Letras, 112 págs., R$ 29

Quando os assuntos são garrafas e literatura, não é falso afirmar que F. Scott Fitzgerald é um dos casos extremos. O autor de O Grande Gatsby foi um homem de seu tempo, os chamados "anos loucos", como ficou conhecida a década de 20: festas, viagens e muita bebedeira entre Paris, Londres e Nova York.

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Os dias de "vinho e rosas", porém, sempre acabam cobrando seu preço e, na década seguinte, os hábitos livres de Fitzgerald desandaram, como de costume, num brutal alcoolismo que corroeu sua saúde, sistema nervoso e produção. Isto, claro, é uma simplificação da vida do grande autor e, neste caso, é melhor ficar com o resumo que ele próprio escreveu: "Depois bebi durante muitos anos, e aí morri."

Famoso tanto por seus grandiosos porres públicos, quanto por sua prosa irretocavelmente elegante, o autor acaba de ter lançada no Brasil, pela coleção Má Companhia, a antologia Pileques, que reúne ensaios, cartas e aforismos do autor.

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Ao contrário do que a apresentação do livro – na capa e contracapa – faz parecer, não se trata de uma apologia divertida aos gloriosos dias de bebedeira. Mesmo que alguns textos evoquem, com humor, os dias ébrios da vida do autor.

No conjunto, o livro é a crônica angustiada de um escritor que vê seu talento escorrendo pelas mãos, enquanto olha a autodestruição simultânea de seu corpo e mente.

Como o humor de um alcoólatra, os textos oscilam entre a graça característica da prosa de Fitzgerald, em especial, no primeiro capítulo de frases e anotações: "Duas garrafas marrons de vinho do Porto apareceram adiante, ganharam rótulos brancos, transformaram-se em freiras engomadas e nos cauterizaram com olhos santos quando passamos."

Em geral, contudo, os registros são mais sombrios e desesperados: "Primeiro você toma um drinque, então um drinque toma um drinque, e aí o drinque toma você", anotou o escritor com conhecimento de causa. Ou, ainda, de profunda melancolia: "(...) numa noite escura da alma é sempre três horas da madrugada, dia após dia."

O grande destaque da antologia é um capítulo de textos curtos chamado "Acompanhe o Sr. e a Sra. F. até o Quarto Número...", sobre a passagem de Scott e sua esposa, a também escritora Zelda, pelos hotéis aristocratas em que se hospedaram.

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A seleção de textos inclui também o célebre ensaio "O Colapso Nervoso", em que Fitzgerald relata com crueza os seus piores momentos de bloqueio criativo e confusão mental, após décadas de excessos.

Por fim, este pequeno livreto é hábil em mostrar o aspecto humano e perigoso de vida de um artista extraordinário, e também serve como testemunho de uma era que, à distância de quase um século, continua dotada de um charme irresistível.