Depois do sucesso obtido com Persépolis (2007), Marjani resolveu adaptar Frango com Ameixas para o cinema, desta vez sem o recurso da animação e com atores reais| Foto: Divulgação
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Obra acompanha os últimos dias de vida de um músico iraniano: figurino e direção de arte belíssimos no filme coassinado por Vincent Paronnaud
Quadrinhos que deram origem à produção têm viés autobiográfico
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A escritora, quadrinista e cineasta Marjane Satrapi se tornou, ao publicar a graphic novel Persópolis – obra em quatro volumes, lançada entre 2000 e 2004 – uma espécie de símbolo da resistência aos desmandos do poder teocrático e autoritário no Irã pós-Revolução Islâmica (1979). A fama da autora cresceu ainda mais quando ela adaptou a história, baseada em fatos autobiográficos, para o cinema. Coassinado pelo diretor francês Vincent Paronnaud, o filme lhe deu o Grande Prêmio no Festival de Cannes, em 2007, e uma indicação ao Oscar de melhor longa-metragem de animação.

Hoje radicada na França, Marjani (leia mais em quadro nesta página) vem transformando sua ancestralidade, assim como as experiências que vivenciou dentro e fora de sua terra natal, em matérias-primas para a construção de uma obra com fortes traços pessoais, sempre disposta a discutir a condição feminina e aspectos culturais e políticos da cultura iraniana, ainda que o foco não seja necessariamente sempre esse.

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A graphic novel Frango com Ameixas, lançada em 2004, é, em certa medida, um pouco menos política, mas não foge do viés autobiográfico presente tanto em Persépolis quanto em Bordados (2003), que fala das mulheres na família de Marjani. O livro narra os derradeiros oito dias de vida do músico Nasser Ali Khan, tio de Marjani, em novembro de 1958. A ação se desenrola em Teerã, capital do Irã. A obra serviu de base para o longa-metragem homônimo, selecionado para o último Festival de Veneza e para a 35.ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que se encerrou na última quinta-feira, e também codrigido por Vincent Paronnaud.

A grande diferença entre Persépolis e Frango com Ameixas, que acaba de estrear na França, é que o segundo já não é um filme de animação, mas protagonizado por atores de carne e osso. O ator francês Mathieu Amalric, consagrado por O Escafandro e a Borboleta, de Julian Schnabel, vive Nasser Ali Khan. Trata-se de um personagem algo patético, que começa a narrativa com o que, pelo menos para ele, é uma tragédia pessoal: durante uma briga, a esposa que ele nunca amou, no filme vivida pela atriz portuguesa Maria de Medeiros (de Pulp Fiction – Tempo de Violência), destrói seu precioso tar, instrumento de cordas da tradição persa assemelhado a um violino, com o qual ele se tornou um dos maiores músicos do país.

Busca

Nasser Ali tenta encontrar um novo instrumento, mas sua missão é inglória: é impossível encontrar um tar capaz de produzir uma sonoridade tão perfeita quanto o do que foi quebrado. Essa busca, no entanto, acaba ganhando uma dimensão simbólica e transcendente – a procura pelo tar, que o leva a entrar em conflito com família, amigos e sua identidade de artista – está relacionada à sua insatisfação com um destino ele que não escolheu, ou que foi levado a escolher por forças sociais.

Narrado em tom de fábula, e muito fiel aos quadrinhos, Frango com Ameixas é, sobretudo, um hipnótico espetáculo audiovisual, com belíssimos – e inventivos – direção de arte e figurinos, que absorvem e reinventam muito do que se vê nos quadrinhos sem com eles se confundir.

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Elenco

O elenco também é de primeira. Além de Amalric e de Maria de Mdeiros, Isabella Rossellini brilha como a carinhosa, porém possessiva mãe do protagonista, em uma espécie de encarnação feminina da pátria; e Chiara Mastroianni, que faz uma luxuosa ponta como a filha de Nasser Ali no futuro. Bêbada, fumante e jogadora inveterada.