Nova Iorque O Labirinto do Fauno, de Guillermo Del Toro, foi exibido na semana passada no Festival de Nova Iorque, numa lotada sessão prévia para a imprensa. Embora tenha dividido opiniões em Cannes, onde concorreu à Palma de Ouro, o filme do diretor mexicano foi muito bem recebido por público e crítica.
A história segue Ofélia (Ivana Baquero), uma adolescente de 13 anos, na viagem que ela faz com sua mãe Carmem (Ariadna Gil) para encontrar seu pai adotivo, numa região rural do norte da Espanha, no ano de 1944, após a tomada do poder por Franco.
Carmem está grávida de Vidal (Sergi Lopez), seu novo marido, um egocêntrico e sádico capitão do exército franquista que está tentando liquidar a guerrilha republicana na região.
Uma noite, Ofélia descobre as ruínas de um labirinto, onde se encontra com um fauno (Doug Jones), uma estranha criatura que lhe faz uma incrível revelação.
Ela é, na realidade, a princesaque seus súditos estão esperando há muito tempo. Para poder regressar ao seu mágico reino, a menina deverá enfrentar três provas antes da Lua Cheia. No transcurso dessa missão, fantasia e realidade se misturam numa história incrível, onde a magia que rodeia Ofélia a transporta e também aos espectadores para um universo único, cheio de aventuras e carregado de emoção.
A repressão fascista do pós-Guerra Civil está no seu auge na Espanha rural e a menina tem que conciliar os acontecimentos políticos com as fábulas que vai vivendo.
Os desempenhos dos atores são altamente satisfatórios, principalmente a atriz adolescente Ivana, que, com seu jeito quieto e olhos enormemente expressivos, interpreta uma heroína ideal, mesmo que ligeiramente tímida. Da mesma forma, o ator Sergi Lopez cria um retrato fantasmagórico e complexo para compor a figura de um militar fascista, freudiano e extremamente chauvinista.
Numa coletiva após a projeção, da qual participou o Caderno G, Del Toro falou sobre o filme, seus elementos visuais e o franquismo como pano de fundo. Confira os principais trechos da entrevista.
Qual foi sua inspiração para realizar o filme?
Guillermo Del Toro Eu sempre quis integrar elementos das histórias de fadas aos meus filmes. Quando terminei Hellboy, em 2004, eu estava ansioso para filmar um conto que tivesse suas raízes num mundo visual que eu pudesse codificar e depois deixá-lo um pouco fora da normalidade. Eu havia trabalhado com Alfonso Cuarón numa série de tevê e ficamos amigos, quase como irmãos. Eu queria muito ter o Alfonso no projeto e quando ele concordou, decidi fazer o filme, pois sabia que ele me daria a força necessária quando eu esmorecesse. E foi o que aconteceu.
Por que você incluiu a guerra e o regime fascista de Franco no filme?
Meu interesse pelo tema data da minha infância no México quando muitos espanhóis foram exilados para lá. O México era um país muito valente na época da Guerra Civil e nós nos abríamos para todo e qualquer migrante republicano que viesse até nós. Esses expatriados marcaram profundamente a cultura mexicana e o seu cinema. Alguns deles se transformaram em meus mentores quando eu era adolescente. Eles falavam de coisas que deixaram para trás quando partiram da Espanha e essas lembranças me afetaram muito. Essa é a razão da inclusão no filme.
Da onde vem seu interesse por histórias de fadas?
As histórias de fadas são influências antigas que derivam de histórias orais populares que vêm desde a antiguidade, como os contos de fadas dos séculos 17 a 19, que eram cheios de sangue e violência bem como de beleza e encantamento. Eu sou fascinado por essas histórias desde a minha mais tenra infância. Eu gostava de ler as versões originais dos contos dos Irmãos Grimm e sempre achei que eles ajudam a construir imagens profundamente perturbadoras.
Você teve a intenção de usar a fantasia e o sobrenatural para confrontar a violência do mundo real, no caso a Espanha sob Franco?
O filme se passa durante o meio do período pró-Franco, portanto trata do fascismo e sua própria essência. Para mim, o fascismo é a representação do pior horror que pode existir e é nesse sentido um conceito ideal através do qual se pode filmar um conto de fadas dirigido a adultos. O fascismo é a primeira e mais importante forma de perversão da inocência, e portanto da infância. São coisas que têm tudo a ver uma com a outra.
Por que no filme esses contos aparecem de forma às vezes tão violenta?
Os contos de fadas, embora muita gente não se dê conta, são muito violentos também, como por exemplo Branca de Neve, Sapatinhos Vermelhos e Alice no País das Maravilhas. Na verdade, o mundo da fantasia é tão duro quanto o da realidade.