Alta-costura
Europa quer reabilitar mercado
Ana Clara Garmendia, especial para a Gazeta do Povo
Paris - No mercado de luxo europeu, a palavra artesão tem uma conotação essencialmente nobre. Depois de passada a época de as grifes se voltarem para campanhas as quais o ecologicamente correto era o foco, a vez é de aquilo feito por mãos dotadas de talento ganhar grau máximo de valor. E quando falo em máximo, é máximo mesmo. Qualidade, exclusividade e preço em um patamar estratosférico, coisa que o mercado ecologicamente correto não conseguiu alcançar.
Um dos setores que trabalham apenas com o feito à mão é o da alta-costura. Vestidos que levam 50 horas de trabalho manual para serem confeccionados com bordados que levaram outras tantas, e por aí vai.
A intenção de reaquecer este mercado na Europa é urgente e, obviamente, não tem apenas o intuito de preservar o valoroso trabalho de profissionais que dedicam suas vidas a um ofício. Representantes da Alemanha, Itália, Inglaterra, Espanha e França se reuniram recentemente para definir estratégias que devem repatriar para a Europa o domínio da produção mundial do luxo artesanal, hoje nas mãos dos chineses.
Numa época em que os produtos made in China têm uma presença surpreendente no mercado quem nunca se assustou quando viu na etiqueta daquela jaqueta bacanérrima a referência ao dragão asiático? , Curitiba abriga um bastião do artesanato nacional. A feira dominical do Largo da Ordem só perde em tamanho para a de Belo Horizonte (MG), que a despeito de suas dimensões, não apresenta o mesmo nível de organização de sua irmã curitibana.
Criada em 1971 pela Fundação Cultural de Curitiba, ela começou com apenas alguns artesãos, que eram pegos em casa, de madrugada, por kombis da prefeitura para montar suas barracas em cima dos paralelepípedos do centro histórico.
A feirinha não passou incólume pelo processo de massificação dos produtos industrializados. Há alguns anos, a batalha de quem organiza a grande estrutura hoje de 1,3 mil barracas é manter a essência do trabalho feito à mão. "Diante da invasão dos importados, alguns artesãos antigos se sentiram prejudicados e introduziram esses produtos na feira", diz Marily Lessnau, coordenadora das feiras de artesanato da capital.
Ela calcula que 20% dos feirantes têm a oferecer produtos 100% industrializados. Apesar disso ser totalmente contra o regulamento da feira, há uma certa resignação por parte da prefeitura, que entende que esses "artesãos" precisam da renda para sobreviver. "Eles têm equipamentos, material, mas preferem assim. Temos tentado conscientizá-los sem passar o facão neles", afirma Marily.
Como os "chinezinhos" são mais baratos do que uma peça de artesanato, os visitantes da feira também não se incomodam em adquirir peças industrializadas para aquele conhecido gesto "fui a Curitiba e me lembrei de você". É difícil dizer quantos dos visitantes moram aqui e quantos são de fora. A última pesquisa, realizada em 1999, apontou que passam pela feira do Largo da Ordem entre 23 a 25 mil pessoas por domingo.
Marily, que já foi uma das feirantes do local vendia produtos naturais , só lamenta pela concorrência desleal infringida aos verdadeiros artesãos, aqueles que viram noites manufaturando seus produtos, machucam as mãos e se intoxicam com cola e tinta.
Outra influência nefasta da indústria sobre os artigos vendidos nas feiras de artesanato é notar que alguns produtos feitos à mão tentam copiar formatos e desenhos daqueles feitos em série. Há desde reprodução de peças de design até bonecos dos Bakyardigans e do Barney. No fim das contas, até o artesanato se "chinalizou". (DB)
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