O tempo ainda é o grande inimigo das mulheres em Hollywood. Passar dos 40 anos, para uma atriz, significa escassez de trabalho. Ou de papéis interessantes, já que sobram para elas apenas as mães, tias, avós, professoras, etc. Com exceção de uma Susan Sarandon aqui, de uma Meryl Streep ali, a história é sempre a mesma: a fila anda e os rostinhos jovens têm prioridade nos investimentos da indústria.

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Isso explica, em parte, a vitória de Reese Whiterspoon no Oscar 2006. A simpática atriz de 30 anos, estrela de Johnny e June, não fez muito esforço para desbancar a outra favorita ao prêmio, Felicity Huffman, de Transamérica. Treze anos mais velha do que Reese, Felicity ganhou o Globo de Ouro e arrancou elogios de Deus e o mundo. Acabou perdendo a estatueta douradapara alguém "com tudo pela frente" – e bilheterias gordas no currículo.

Que se dane o Oscar! Felicity foi melhor e seu talento pode se conferidos novamente com o lançamento brasileiro do DVD de Transamérica. Escrito e dirigido pelo estreante Ducan Tucker, o filme capta a atriz antes da consagração do seriado de tevê Desperate Housewives, do qual é uma das protagonistas. Ou seja, era mais uma artista madura batalhando para sobreviver em Hollywood. E que batalha! Aqui, ela vive nada menos do que um transexual de Los Angeles prestes a mudar, definitivamente, de sexo.

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Em Jogo Perigoso (1986), Vanessa Redgrave já havia interpretado um homem que tentava virar mulher. Ou adequar o corpo à mente, como preferem dizer os especialistas nas questões de gênero (ainda nebulosas para a maioria das pessoas). Mas se tratava de um filme baseado em fatos reais, o que exige um registro mais fiel ao personagem original. Em Transamérica, ao contrário, Felicity teve de começar a composição do zero, e a evolução é sentida a cada nova cena. Isso porque o longa de Ducan Tucker é um típico road movie, daqueles em que a jornada é tão pessoal quanto geográfica.

Antes conhecida como Stanley, Bree Osbourne se prepara para a tão esperada cirurgia quando recebe a notícia de que é pai do adolescente Toby (Kevin Zegers), fruto de uma experiência relâmpago com uma mulher. O garoto, prostituto e viciado em drogas, está preso em Nova Iorque e não tem a quem recorrer (a mãe se matou). Atordoada, Bree é aconselhada por sua terapeuta a resolver o problema antes de se submeter à operação. Ela tira o filho do reformatório e, no caminho de volta para casa, encara poucas e boas em sua companhia. Detalhe: Bree não revela a Toby sua condição.

É a história de um transexual, mas poderia ser a de qualquer indivíduo marginalizado. Ou, ainda, mais uma metáfora da América decadente. Seja como for, Transamérica não seria o mesmo sem Felicity Huffman. Pairando acima do grotesco e do caricatural, a atriz convence e transcende. O dia em que uma Reese Whiterspoon encarar um desafio desses, a gente volta a conversar. GGG1/2