A fusão dos ministérios da Cultura e da Educação, oficializada ontem com a posse do ministro Mendonça Filho por conta do afastamento da presidente Dilma Rousseff, foi apontada como retrocesso pelos antigos chefes das Pastas, Juca Ferreira e Aloizio Mercadante, e motivo de protesto de produtores culturais pelo País. No entanto, com a medida, o Brasil não segue na contramão do que já é praxe em países como Austrália, Espanha e Reino Unido e pode sim manter um modelo de administração de políticas públicas culturais que funcione, independentemente de ser mantido por uma autarquia pública exclusiva.
A necessidade de enxugar a máquina estatal durante o governo de Michel Temer é o grande argumento para a diminuição do número de ministérios. “A junção de equipes é sempre uma boa prática. Em um momento de crise como o que estamos vivendo, é uma atitude válida e correta”, avalia Denise Basgal, professora de Gestão Pública da Isae-FGV.
A economia gerada pela junção das Pastas viria em médio e longo prazos, segundo Denise, e representaria cerca de 35%, referentes a cargos comissionados, gastos administrativos e outras despesas eliminadas, calcula a professora.
Histórico
Essa é a segunda vez, desde a sua criação no governo José Sarney, em 1985, que o ministério da Cultura é extinto. Durante a gestão Fernando Collor (1990-1992), Cultura era uma secretaria ligada à Presidência.
O corte, no entanto, não afetaria necessariamente as atividades do MinC, quantitativamente e qualitativamente. “Uma equipe grande não é gerenciável. É preciso apenas ter uma boa interlocução entre as áreas e boas “cabeças” à frente. Eu não me preocupo com eventuais prejuízos à Cultura pela fusão, simplesmente. Só é necessário ter uma boa administração”, pondera Denise.
A autarquia por si só não é garantia de ações efetivas. “O fato de haver uma secretaria autônoma para cultura nos organogramas estadual e municipal não significa necessariamente que nos locais onde isso ocorre o trato da área seja mais eficiente, ágil e substantivamente melhor”, analisa o professor da USP José Carlos Durand no artigo “Cultura como Objeto de Política Pública” (2001).
O orçamento deste ano foi definido ainda em setembro de 2015. A única mudança na prática é que o ministro assume as duas pastas
Participação do poder privado
A dependência da produção cultural do governo também é um aspecto que pode ser melhorado a partir desse momento. Editais da Petrobras, Lei Rouanet e outras leis de incentivo fiscal tornaram-se quase que exclusivamente a única maneira de viabilizar projetos. E mesmo assim a poucos. A praxe atual pouco estimulou a formação de um modelo autossustentável de produção artística.
“Nesse momento, eu vejo a oportunidade de que o poder privado, que pouco participa desses projetos trabalhe diretamente com os próprios agentes culturais”, afirma Denise.
A falta de visão sistêmica é um problema arraigado das gestões culturais. “Para se atingir um patamar mais consistente, será necessária uma visão mais orgânica e retrospectiva, capaz de avaliar e refletir sobre experiências prévias. Tal estágio será tanto mais distante e inatingível quanto mais as secretarias de cultura forem entregues a artistas e intelectuais consagrados que, na falta de um passado de administradores e de vontade política, tenderem a se comportar como “medalhões”, julgando-se autorizados a orientar a ação do governo por linhas que sigam apenas suas preferências pessoais”, diz José Carlos Durand em outro trecho do artigo “Cultura como Objeto de Política Pública”. O MinC já teve dois artistas à sua frente: o compositor Gilberto Gil (2003-2008) e Ana de Hollanda (2011-2012)
Países em que a Cultura está junto a outros departamentos
Austrália: Departamento de Comunicação e Artes (Department of Communications and the Arts).
Espanha: Ministério da Educação, Cultura e Esportes (Ministerio de Educación, Cultura y Deporte).
Reino Unido: Departamento de Cultura, Mídia e Esporte (Department for Culture, Media & Sport).