Vivo e mestiço
No princípio eram violão e voz, que resultavam em canção. Canção essa que contava histórias, com capítulos que incluíam citações à cultura de um povo, à passagens marcantes na vida de seus intérpretes, e ao amor consumado ou não.
O canto dos brancos oprimidos
O All Music Guide, uma das boas enciclopédias sobre assunto na internet, lista impressionantes 58 subgêneros do folk inclusive o antifolk, que usa elementos do punk , mas deixa de fora rótulos criados há pouco, entre eles, folktronic (com elementos eletrônicos) e freak folk (cujo exemplo melhor é Devendra Banhart).
Um violão e um ponto de vista
Com uma carreira originada no folk, o cantor e compositor norte-americano Bob Dylan continua sendo o maior ícone do gênero para todas as gerações.
Dylan de fato e na ficção
O documentário Don´t Look Back(Não Olhe para Trás, em tradução livre), lançado no Brasil pela Sony BMG, é um marco inquestionável tanto para a história do cinema quanto para a folk music.
O sujeito na foto que ilustra esta página é uma síntese da música folk. Da camisa xadrez ao violão acústico, o gênero abarca canções que têm algo dizer sobre a situação do mundo e das pessoas que nele vivem (não à toa, o homem colou a frase "Esta máquina mata fascistas" no instrumento).
Agora, são vários os sinais de que o folk está de volta a música, como quase tudo na vida, obedece ciclos. Bon Iver, Fleet Foxes e Devendra Banhart são três exemplos de artistas que despontaram nos últimos anos, aparecendo em tudo que é lista de mais vendidos e com milhões de acessos em vídeos do YouTube.
Menos engajado nos dias atuais, o folk se prestou a uma ferramenta política depois da Depressão nos Estados Unidos, na década de 1930. Com canções quase faladas e a voz meio fanha, Woody Guthrie (1912-1967), o homem na foto ao lado, é o artista que melhor descreve a época. Tanto que ele influenciou de maneira decisiva um compositor fantástico conhecido pela voz bizarra, nem de longe um sujeito que poderia ganhar a vida como cantor. No entanto. (Leia sobre Bob Dylan na página 3.)
Uma situação paradoxal parece explicar parte do fascínio do folk hoje. O público pode compartilhar arquivos musicais pela internet e abarrotar um aparelhinho minúsculo e cada vez menor com milhares de canções. É interessante que algumas dessas canções sejam folk, pois, se fosse escolhida uma palavra para definir o estilo, esta seria: simplicidade.
"Talvez seja a oposição ao eletrônico que tomou conta do mundo da música com a era dos DJs", diz o produtor cultural Horácio de Bonis sobre o encanto do folk. "Penso que algumas pessoas tenham se tocado que voz e violão (não que o folk se resuma a isso) são suficientes para criar belas melodias."
O jornalista Guga Azevedo, do programa Vitrola, da Lumen FM, também destaca a simplicidade e mais as composições. "Música sobre o cotidiano, sobre relações amorosas, lamentos, política... tem a alma de uma pessoa comum ali. Igual eu e você. A identificação pode ser incrível", diz Azevedo.
Também chamado de neofolk, o movimento tem alguns anos e remete ao folk rock que despontou nos territórios inglês e norte-americano quatro décadas atrás. Um dos personagens marcantes (e dos mais ignorados) desse período é o nova-iorquino Jackson C. Frank (1943-1999). A história de sua vida é bíblica de tantas tragédias que experimentou as três piores foram um incêndio quase fatal na infância, a morte de um filho pequeno e a cegueira.
Frank aparece hoje numa onda em que artistas buscam referências no passado. Ele é admirado pelo músico, ator e cineasta Vincent Gallo, que incluiu "Milk and Honey" na trilha sonora do filme The Brown Bunny (2003). O pianista Brad Mehldau, jazzista de primeira, vive regravando composições de Nick Drake (1948-1974) e chegou a usar uma delas para batizar o disco Day Is Done (2005).
Drake também é querido por cineastas e aparece nas trilhas de Os Excêntricos Tenenbaums (2001), de Wes Anderson, e de A Bela Junie (2008), do francês Christophe Honoré. Existem outras.
Uma das hipóteses para a febre folk de agora, para Guga Azevedo, tem a ver com moda. "Fashion mesmo. Na época que descobriram a Mallu (Magalhães, a cantora brasileira que ouve Bob Dylan e Johnny Cash), não era difícil ouvir por aí as mulheres falando de saias folk, lenço no pescoço, xadrez... Veio tudo de uma vez. Querendo ou não, essas idas e vindas da música pop, quando batem com a moda, podem ficar gigantes."
De Bonis identifica o neofolk, sobretudo, no exterior, com figuras como José Gonzalez (sueco, apesar do nome espanhol) e os americanos Marissa Nadler e Espers. "Tanto o folk americano quanto o inglês têm influenciado essa nova geração", diz o produtor.
São os artistas desses dois países Inglaterra e EUA que influenciam mais a ideia que se tem hoje da música folk. O conceito original, de composições sem autoria definida e ligadas à história oral de qualquer país, aparece raras vezes. Um exemplo é quando se fala em fandango no Brasil. (Saiba mais sobre as definições do folk na página 2.)
O segredo da música folk é fazer canções arrebatadoras com pouquíssimos elementos. É a antítese de muito do que se ouve por aí, feito por artistas que têm à disposição uma estrutura extraordinária de produção, usada para resultados ridículos.
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