Ondas de talk shows e programas de debates vêm e vão na televisão brasileira. E, no momento, uma verdadeira tsunami de atrações do gênero integra a grade de programação das emissoras abertas e canais por assinatura. A conversa parece não ter fim, principalmente nos últimos meses, quando não se comenta outra coisa no país a não ser a crise política.
Mas o formato blablablá abrange todo e qualquer assunto, sempre na ponta da língua de entrevistados e debatedores muitas vezes despreparados para emitir opiniões razoáveis. Talvez o barato seja mesmo esse: transpor para a telinha o que se discute nas rodinhas de bate-papo do dia-a-dia. Mais barato ainda é o custo do formato, baixíssimo se comparado ao de outros programas.
"Muitas pessoas assistem porque têm opiniões, e a maioria porque não tem, mas quer formar uma", diz o jornalista Lucas Mendes, âncora da mesa-redonda Manhattan Connection, no ar desde 1993, pelo canal pago GNT. Transmitida de Nova Iorque, a atração é uma espécie de "pai de todos" para os programas de debate brasileiros mais recentes. Já trocou de elenco várias vezes, com destaque para o período em que contou com a participação de figuras como Paulo Francis (1930 1997) e Nelson Motta.
Atualmente, fazem parte do show, além de Lucas Mendes, os jornalistas Caio Binder, Lúcia Guimarães e o economista Ricardo Amorim. O amado/odiado escritor Diogo Mainardi também dá as caras, em intervenções gravadas no Rio de Janeiro. "A combinação de informação com opinião inteligente ou polêmica sem deu certo", afirma Mendes, que confessa ter "roubado" elementos do programa McLaughin Group, da rede americana NBC, para criar o Manhattan Connection.
O problema é que algumas mesas não são informativas e, tampouco, inteligentes. É o caso do Fora do Ar, atração do SBT estrelada pelo diretor teatral Cacá Rosset, o jornalista Jorge Kajuru e as apresentadoras Hebe Camargo e Adriane Galisteu. Ou melhor: era, porque o programa foi extinto na semana passada, sob a justificativa do fim do contrato da ala masculina. Nos bastidores, porém, fala-se em um certo mal-estar da direção da emissora com relação ao estilo agressivo de Kajuru, principalmente depois de suas críticas contundentes contra o ex-prefeito de São Paulo, e atual detento, Paulo Maluf.
Seja como for, o Fora do Ar, mesmo com a verve polêmica de Kajuru, é um exemplo clássico de debate pouco construtivo, em que a opinião pura e simples acaba sendo o único conteúdo. Por outro lado, deve-se reconhecer a validade desse tipo de programa em um país onde se reflete muito pouco sobre os grandes (e pequenos) temas. "Na forma de bate-papo, fica mais fácil tornar acessíveis certos assuntos mais áridos. É uma oportunidade de discutir as coisas com leveza, e isso aproxima as pessoas", arrisca Lilian Amarante, diretora do VJs em Ação, há um ano na grade da MTV.
A "mesa jovem" traz os VJs (video-jóqueis, ou apresentadores de clipes) da emissora musical conversando sobre os mais diversos assuntos do momento. Com uma pauta pré-definida, mas sem roteiro, o debate conta com pelo menos uma característica inusitada. Como os participantes não usam ponto eletrônico, é comum ouvir a voz da diretora no ar, ao vivo, interferindo na condução da conversa. "No começo, eu entrava falando de aspectos mais técnicos, mas agora já dou algumas opiniões também", diverte-se Lilian.
Em alta
Se a onda dos debates está em alta, puxada pelo Manhattan Connection e o Saia Justa (leia entrevista abaixo), a dos talk shows permanece firme desde o sucesso do Jô Onze e Meia, no fim dos anos 80. Com a chegada da tevê por assinatura no Brasil, os programas de entrevista se multiplicaram de forma ainda mais rápida. No Canal Brasil, por exemplo, há um para cada dia da semana, apresentado por personalidades como Paulo César Pereio, Angela Rô Rô e Selton Mello, entre outros.
A razão de tanta oferta é o baixo custo de realização. E o mesmo vale para as mesas redondas. "São programas que exigem pouquíssima produção. A multiplicidade de canais redunda em uma enormidade de tempo de programação a ser ocupado", analisa a antropóloga Esther Hamburger, estudiosa dos fênomenos televisivos e autora do livro O Brasil Antenado A Sociedade da Novela.
A viabilidade do formato representa uma saída para a produção regional, como atestam os semanais Aqui entre Nós (Paraná Educativa) e Em Casa (CNT). O primeiro, comandando pela jornalista Rosi Guilhen, tem como trunfo entrevistados de repercussão nacional e a sabatina adicional da platéia. Já o segundo, mais informal, aposta na interação entre os convidados. São dois por programa, que podem fazer perguntas um para o outro e raramente têm algo em comum.
"Uma vez, chamamos o Wanderlei Silva, lutador de vale-tudo, e o Wagner Vital, que é professor de inglês e trabalha com decoração. Foi um dos melhores programas, porque eles conversaram muito entre si", conta a jornalista Fernanda Rocha, ex-TV Paranaense, que apresenta a atração ao lado de Rafael Régnier. De acordo com Fernanda, o Em Casa, produzido de forma independente, custa cerca de R$ 30 mil por mês. "Com maiores recursos, poderíamos ter uma equipe menos enxuta, fazer matérias externas e tornar o programa mais completo", lamenta.
Essa restrição orçamentária é justamente o maior motivo de críticas por parte de Esther Hamburger. A partir do exemplo do Saca-Rolha (mesa-redonda do Canal 21, de São Paulo, estrelada pelo músico Lobão, o multimídia Marcelo Tas e a modelo Mariana Weickert), a antropóloga chama a atenção para o "desperdício de talentos" de alguns talk shows e programas de debate. "Não deixa de ser uma pena que pessoas interessantes como essas não disponham de produções com maiores orçamentos para poder sair do mero falar e falar que transforma a tevê na imagem do rádio", diz.
Para Esther, o ideal seria o investimento na criação de novos e mais elaborados formatos televisivos. "Isso potencializaria o talento de quem faz e estimularia quem assiste", completa. Como a realidade não é exatamente essa, dá-lhe falação!
Serviço: Manhattan Connection (GNT), domingo, às 23 horas. VJs em Ação (MTV), segunda, às 22 horas. Aqui entre Nós (Paraná Educativa), quarta, às 20 horas. Em Casa (CNT), sábado, 13 horas. Todos os programas têm reprises em horários alternativos.
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