Desde que assumiu o poder em novembro de 2015, o primeiro-ministro canadense Justin Trudeau tem causado sensação. Jovem, feminista autoproclamado e com um discurso que prega abrir as fronteiras para refugiados de países muçulmanos, ele é saudado como modelo de político moderno e progressista. Cool, já apareceu até mesmo em revistas de moda e variedades, como Vogue e Vanity Fair.
No Canadá, porém, nem todos são seduzidos por seu charme: um aumento descontrolado nos gastos públicos, más relações com as comunidades indígenas do país e a falta de um projeto claro para assentar os refugiados sírios vêm provocando cada vez mais críticas ao seu governo.
Tal pai, tal filho
O clã Trudeau não é novo na política canadense. O pai de Justin, Pierre, serviu como primeiro-ministro de forma quase ininterrupta entre 1968 e 1984. Seu governo conquistou grande popularidade graças a uma série de medidas consideradas avançadas para a época: legalização do aborto e de métodos anticoncepcionais, descriminalização da homossexualidade, reformas no sistema de saúde pública e medidas proibindo a discriminação e incentivando o intercâmbio cultural. O sucesso foi tanto que “Trudeaumania” foi o termo que a imprensa usou para definir o êxito de Pierre junto à opinião pública.
Justin aproveitou e embarcou no nome do pai para construir sua carreira política dentro do Partido Liberal, chegando ao poder com uma plataforma que também prometia medidas progressistas. Além do olhar simpático aos refugiados e às demandas feministas, sua campanha prometia rever a política de combate às drogas, começando pela legalização da maconha.
Mas, assim como o pai, Justin vem acumulando críticas por um discurso idealista demais para ser colocado em prática, principalmente no plano econômico: o governo de Pierre Trudeau deixou o país no vermelho por muitos anos após o premiê deixar o poder e agora o filho é acusado de estar indo no mesmo caminho.
“O governo federal parece estar indo em direção as mesmas políticas fiscais tão danosas da década de 70”, alerta o professor de economia Livio Di Matteo, da Lakehead University, autor de um relatório sobre as políticas econômicas canadenses nos últimos 150 anos, divulgado em fevereiro.
“O departamento de finanças já projetou que teremos déficits contínuos até 2051”, acrescentou Di Matteo ao jornal Toronto Sun, lembrando que combater o déficit orçamentário havia sido uma promessa de campanha de Justin Trudeau – segundo seu plano original, as contas do país estariam sanadas até 2020. Mas hoje o Canadá gasta ainda mais do que antes: Trudeau havia projetado um déficit equivalente a R$ 23,6 bilhões no ano passado, mas o valor final foi quase o triplo disso.
Nem tão receptivos assim
O ponto mais polêmico da administração de Justin está nas políticas da imigração. Quando Donald Trump anunciou o endurecimento das regras para a entrada de imigrantes vindos de países muçulmanos, Trudeau respondeu prontamente no Twitter: “àqueles fugindo da perseguição, terror e guerra, os canadenses vão recebê-los, independentemente da sua fé. Diversidade é nossa força”.
Para Candice Malcolm, autora de “Losing True North” (“Perdendo o verdadeiro norte”, em tradução literal), livro que critica as políticas imigratórias de Trudeau, tudo não passa de uma cortina de fumaça: “os sírios recém-chegados ouviram que teriam que esperar mais de um ano para ter aulas de inglês, e outros reclamaram da falta de opções nos seus bancos de comida locais, mas a imprensa favorável ao Partido Liberal insistiu que o programa era uma história de sucesso”.
Desde 2016, mais de 35 mil sírios entraram no Canadá, recebendo auxílios do governo apenas para seu primeiro ano no país. Sem saber a língua e temendo ficar sem dinheiro ou acesso à alimentação subsidiada, muitos convivem com a incerteza sobre o futuro. “Ignorar os problemas não vai fazê-los ir embora. Normalmente, só os faz aumentar”, completa Candice.
Promessas estagnadas
Outras promessas de campanha também estagnaram: boa parte dos projetos de reparação aos povos indígenas, prometidos após o Estado canadense reconhecer sua culpa em políticas de “branqueamento” do país no século 20, sequer saíram do papel. Já a promessa de uma reforma política, grande bandeira de Trudeau quando estava na oposição, foi abortada após sua vitória nas eleições.
O ex-ministro Tony Clement, do Partido Conservador, declarou em entrevista à rede de televisão CBC que a estratégia da oposição é esperar o momento de fama de Trudeau passar. “Quando as pessoas se derem conta de que Trudeau está posando com meias novas para a Vogue e eles não conseguem nem pagar suas contas de água, esse será o momento em que a luz vai se apagar para a política de celebridade. Esse dia vai chegar. Não hoje. Provavelmente não amanhã. Mas chegará um momento em que os canadenses vão querer julgar resultados”.