A república sangrava e, mesmo assim, o assunto que mais despertou o interesse das pessoas na terça-feira (30) foi o fim do casamento entre os apresentadores de televisão William Bonner e Fátima Bernardes.
Entre ver a história do país mudar em tempo real ou saber com quem ficariam os trigêmeos do casal, o último tema deu mais ibope.
Anunciada pelo twitter, como fosse tema de utilidade pública, o fim do casamento de Bonner e Fátima é um exemplo bem acabado da fome que temos pela carne das celebridades.
“Em nossa sociedade, as celebridades são como drogas”, afirmou o psicólogo James Houran ao site Live Science. “Estão ao nosso redor e há uma dose sempre à mão”.
Esta adição nasce do encontro, às vezes patológico, entre uma hiperdistinção (a elevação de algumas pessoas a um status de pessoas melhores, especiais) e uma espécie de autoflagelação por meio do uso abusivo da liberdade.
Confusão entre público e privado
É o que afirma o antropólogo Roberto da Matta em artigo publicado no jornal O Globo. “A celebridade agencia diferenças num mundo que se deseja feito de iguais. O famoso é a tela na qual as pessoas comuns projetam os que lhes falta. Daí a tendência a confundir o seu papel público com a sua intimidade”.
Uma excepcionalidade que desperta um misto de decepção e desprezo sádico quando ocorre descompasso entre a figura que aparece na tela e a que surge na vida real, infeliz como todo mundo.
O interesse pela vida das celebridades não é novo. Em seu livro “Fame”, de 2009, o jornalista Tom Payne pesquisou os textos clássicos e observa que figuras proeminentes eram olhadas de outra forma nas primeiras civilizações e nossos antepassados devotaram grande interesse pela vida dos santos e dos mártires.
Válvula de Escape
E sempre serviu para fins semelhantes, como indica um estudo publicado no Journal of Nervous and Mental Disease pelo pesquisador John Maltby, da Universidade de Leicester, no qual conclui que a busca por informações sobre artistas e pessoas célebres é uma espécie de válvula de escape e uma forma de interagir com outras pessoas que compartilham do mesmo interesse.
Ou, como explica Daniel Kruger, um biólogo evolucionista da Universidade de Michigan, há duas vantagens evolutivas para a bisbilhotice da vida das celebridades: a primeira para nosso próprio benefício pessoal. “Aprendendo o que fazem os indivíduos de alto status, então você pode tornar-se mais eficazmente um”.
A segunda razão é política. “Ao saber o que está acontecendo com os indivíduos de alto status, você seria capaz de navegar melhor pela cena social.”
Talvez ainda haja uma terceira razão. Diante do cenário político no Brasil, olhar para o rompimento do “casal perfeito” seja a melhor maneira de não precisar olhar no espelho.
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