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Efigênia e Leites compartilham não apenas um método de trabalho único, baseado na reutilização dos descartes, mas são complementares | Pedro Serápio/Gazeta do Povo
Efigênia e Leites compartilham não apenas um método de trabalho único, baseado na reutilização dos descartes, mas são complementares| Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo

Serviço

Confira horários da exposição Duo na Galeria Subsolo

  • Efigênia Rolim costuma se utilizar de invólucros de doces e balas
  • Hélio Leites: o mundo em miniatura, mas em fase de expansão

Efigênia Rolim e Hélio Leites têm uma união mais do que estável. Não que se trate de um casal no sentido conjugal da ex­­pressão. Mas sim de uma parceria criativa, espiritual até. Espe­­cialistas cos­­tu­­mam di­­zer que eles são herdeiros do mo­­vimento italiano da arte po­­vera, mas os dois preferem acre­­ditar se­­rem donos de seus próprios estilos, que se interconectam, dialogam entre si. Compartilham não apenas um método de trabalho único, baseado na reutilização dos descartes da sociedade, mas são complementares, partindo dos mesmos valores e filosofias. E, mais uma vez, eles se encontram para expor seus trabalhos em um mesmo espaço, reeditando essa parceria de muitos anos.

A exposição Duo (confira o serviço), que abre hoje na Galeria Subsolo, em Curitiba, apre­­senta obras dessas duas "entidades" da arte curitbana. São trabalhos gêmeos, porém bivitelinos, absolutamente diferentes, mas com material genético compartilhado.

Na exposição, os trabalhos de Efigênia e Hélio coexistem em um espaço físico único da maneira mais harmônica possível, tanto na estética quanto na incorporação de elementos prosaicos do cotidiano. Há, para quem quiser enxergar, conexões entre a boneca vinda do oriente de Efigênia, "rainha do planeta, que voa como uma borboleta", e no trabalho de Hélio, que canoniza a escritora Helena Kolody (1912-2004), que, segundo a concepção do artista, realizou nove milagres em seus poemas e, agora, seguindo uma tradição católica ainda muito forte em Curitiba, tem sua própria capelinha, para passar de livraria em livraria e de escola em escola.

Renascimento

"Quando a gente se propõe a fazer alguma coisa, a vida muda", diz a a Rainha do Papel de Bala, hoje aos 79 anos, que esteve gravemente doente no fim de 2009 devido a uma gripe que se agravou. A do­­en­­ça fez com que a produção de obras parasse por algum tempo, até que a artista, já desenganada pelos médicos, após um longo tratamento, conseguisse ficar de pé para continuar seu trabalho. "O médico disse que eu sou lúcida e muito forte, e eu não dei lugar para a doença."

A exposição, conta Efigênia em seu discurso transcendente, traz trabalhos concretizados "após um aviso do universo, que veio na forma de uma borboleta verde", que teria dito: "Você está se preparando para a morte por quê? Se prepare para a vida". Efi­­gênia agora apro­­veita a vida, garante ela, com mais força e dignidade, consciente de que re­­tornou como uma nova criatura, mas ainda é a mesma. "Pare­­ce que eu morri e agora estou ressurgindo."

O traje especial para a abertura da exposição já está preparado: um vestido de bailarina. A ênfase de seu trabalho continua sendo transformar o pequeno no grande, o rejeito em "luxo". Nos trabalhos, se confundem as histórias do primeiro papel de bala que encontrou na rua e as de tantos habitantes marginalizados pelas ruas da cidade. Segundo a artista, "não temos mais tanto ouro para reciclar, nem prata, diamantes nem se fala. Então vamos reciclar o lixo, que sempre se encontra".

Proporções

Estudante do quarto ano de pintura da Escola de Música e Belas Artes, Leites agora aproveita restos de tinta do curso para fazer seus trabalhos. As obras não são mais só miniatura, como o ratinho estudante na calha de chuva. Elas também vêm em pacotes de cinco quilos de amido de milho, a famosa Maizena, e de latas gigantes: "Quando eu encontrei na rua uma lata daquele tamanho de milho foi um choque na minha proporção. Aí eu resolvi conversar com a di­­mensão. Você concebe um pacote de cinco quilos de Maizena?."

Algumas de suas obras para a exposição são homenagens a diversos artistas, como, por exem­­plo, Joseph Beuys (1921–1986), multi-artista alemão que plantou sete mil árvores em um espaço urbano. Uma delas tem caráter contestador, foi feita sobre a "desomenagem" a Beuys realizada por Curitiba, que, supostamente, teria cortado 700 pinos e cedros. "Cortaram todas as árvores exóticas, estrangeiras e ofensivas. O som que estava nos parques era o da motosserra (...) Eles dizem que estão seguindo uma tendência internacional, a purificação de parques e bosques municipais, como se as árvores tivessem passaporte", diz.

Leites aproveita as oportunidades de fazer obras bem-humoradas, tirando sarro do aviso que vem em cima do tampo da geladeira, agora já derretida, advertendo sobre o perigo de se colocarem velas acesas sobre seu tampo. Ele aproveita a tevê que seria jogada fora e a coloca como painel para mini-pintores, e mostra, com uma batedeira, "a bailarina que quebra nozes e mostra a casca", obra em homenagem a grande dançarina inglesa Margot Fonteyn (1919-1991).

Efigênia e Leites, que também expõem e vendem seus trabalhos todos os domingos na Feira do Largo da Ordem, se dão força, cuidam um do outro, se inspiram e se admiram mutuamente. São mãe e filho nas artes, convivendo e vivendo das sobras, dos resto humanos, que é material de trabalho e meio de vida.

São poetas, narradores, circenses. Por isso, esses multi-artistas não produzem uma arte apenas estática e palpável: as obras têm víéses literários e cênicas, sem os quais não estão acabadas. Para ter a experiência completa da exposição que se inicia hoje na Subsolo é preciso estar atento aos artistas, que interferem com suas interlocuções, gestos e performances. Cada trabalho é um conjunto com seu criador e vai além da arte: é educação ambiental e herança cultural.

Serviço: Duo, exposição de Efigência Rolim e Hélio Leites. Galeria Subsolo (Avenida Iguaçu, 2.481 – Água Verde), (41) 3019-8701. De terça a sexta-feira, das 14 às 21 horas, e sábado, das 11 às 18 horas.

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