O Festival de Cinema de Cannes expulsou nesta quinta-feira (19) o cineasta dinamarquês Lars von Trier devido às declarações dele, dadas em tom de brincadeira, dizendo-se nazista e simpatizante de Hitler, que deixaram a maior vitrine do cinema mundial em estado de choque.
As declarações de Von Trier ultrajaram grupos judaicos e levaram a atriz norte-americana Kirsten Dunst a demonstrar constrangimento por estar ao lado dele em uma coletiva de imprensa, na quarta-feira, em que o cineasta se lançou em um monólogo bizarro sobre sua ascendência judia e alemã.
O diretor de 55 anos, antes um dos queridinhos de Cannes, tendo recebido a Palma de Ouro em 2000, apressou-se a pedir desculpas, mas foi pouco e tarde demais.
"O conselho de diretores condena inequivocamente essas declarações e declara Lars von Trier 'persona non grata' no Festival de Cannes. Isto entra em vigor imediatamente", disseram os organizadores em comunicado à imprensa na quinta-feira.
O Grupo Americano de Sobreviventes do Holocausto e Seus Descendentes, que se queixou logo depois que as observações de Von Trier foram divulgadas, saudou a decisão de Cannes de expulsar o cineasta.
"Os organizadores do Festival de Cinema de Cannes assumiram uma posição moral resoluta contra expressões arrogantes de ódio e insensibilidade perante os brutalizados pelos nazistas, judeus e não judeus", disse o vice-presidente do grupo, Elan Steinberg.
"Não podemos olhar dentro do coração de Von Trier para avaliar a sinceridade do 'pedido de desculpas' que ele fez. Apenas suas palavras e seus atos futuros nos poderão dizer se ele compreende a dor que provocou."
A principal organização judaica da França, CRIF, disse que as declarações fazem parte do que ela descreveu como "a tendência preocupantes de normalizar o nazismo".
Von Trier falou a sério?
Entre centenas de cinéfilos que circulavam diante do cinema Grand Theatre Lumière sob o sol mediterrâneo, alguns questionaram se Von Trier, célebre por ser provocador, tinha falado a sério.
"Ele fez isso por pura provocação, o que é muito próprio de Von Trier, que sempre leva as coisas ao limite", opinou Christophe Calmels, cuja empresa Films Sans Frontières distribui o trabalho de Von Trier "As Cinco Obstruções", de 2003.
"Esta expulsão não surpreende, era inevitável -- como aconteceu com Galliano", ele acrescentou, aludindo ao estilista John Galliano, demitido recentemente pela Dior depois que foram à tona imagens dele fazendo comentários antissemitas em Paris.
"A questão é: ele realmente acreditava no que disse?"
O filme mais recente de Von Trier, "Melancolia", faz parte da competição oficial de Cannes este ano e vinha sendo visto como possível ganhador de prêmios, até que o diretor aparentemente eliminou suas chances.
Uma porta-voz do Festival de Cannes disse não saber se esta foi a primeira expulsão desse tipo e se Von Trier será autorizado a participar do festival no futuro. Ela acrescentou que "Melancolia" vai continuar na competição.
Na coletiva de imprensa da quarta-feira, Von Trier disse, brincando, que é nazista e que simpatiza com Adolf Hitler.
"Acho que eu compreendo o homem (Hitler)", disse o cineasta. "Ele não é o que se poderia chamar de um bom sujeito, mas compreendo muita coisa nele e simpatizo um pouco com ele. Mas não sou a favor da Segunda Guerra Mundial e não sou contra os judeus."
"É claro que sou muito a favor dos judeus. Não, não muito, porque Israel é um pé no saco. Mas, mesmo assim -- como posso sair desta sentença?"
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