Três anos depois de sua estréia solo com "Quatro letras", O Kid Abelha George Israel lança seu segundo disco solo, "Distorções do meu jardim". Se Paula Toller solo faz um pop com acento adulto, George parte na direção do pop rock. São 12 canções com apelo radiofônico e bom gosto, uma combinação rara nas rádios populares. O disco mostra uma clara influência dos Britos, a banda paralela de George com os amigos Guto Goffi (bateria), Nani Dias (guitarra e voz) e Rodrigo Santos (baixo e voz), dedicada ao som dos Beatles. A melhora sensível é na interpretação vocal, bem mais segura do que antes.- Anos aí ralando com Os Britos tem que aprender né? A Suely Mesquita, parceira em "Como você já é" e também preparadora vocal ajudou - conta George.
Ele explica que preferiu um clima mais desencanado neste disco.
- Decidi simplificar e não complicar musicalmente. O primeiro era mais rebuscado, mais progressivo, neste eu desnudei mais a música. A gente precisa ir mudando - explica.
Ele promove o encontro de mestre Cartola com Beatles ao gravar "As rosas não falam" numa roupagem rock com inserção de "I want you", da grife Lennon.
- Quando a gente toca, esse tipo de coisa acontece. No show o pessoal se empolgava com esse lance de colocar a canção em outra onda e acabou dando certo. Uma amiga falou que me matava se eu não gravasse.
O CD é apresentado ao mundo por "A noite perfeita", dele com o ex-Kid Abelha Leoni, que também tocou baixo e cantou, com direito às baquetas de João Barone. Assobiável até a última nota. A parceria que criou o hino "Brasil", George, o produtor do disco Nilo Romero e Cazuza, é reeditada em "Mina", antes gravada por Leo Jaime, agora em versão de dois terços dos autores, bem pra cima, sobre uma garota com olhos de morfina que se vira na rua com coragem e comprimidos. Rolling Stones até o solo de sax a la Bobby Keys.
"Chão de Jardim" introduz Marcelo Camelo na praia da Geração 80 do Rock Brasil numa balada cheia de sonzinhos feitos pela rapaziada na ausência do George, que aprovou a levada lisérgica em busca de Lúcia no céu com diamantes.
"Alguém como você", balada a la Tom Petty, sai dias antes de marcar presença no Acústico de Sandy e Junior. Aqui em versão plugada. Outro chicletinho de ouvido no capricho. Os sopros mandam alma em "Trailler", ecos de Motown nos vocais, balanço soul. Outra vertente negra, o reggae, ataca em "O amor que vem", com o balanço jamaicano fornecido por Marcelinho da Lua e sua turma de cuca bossa nova. É preciso acreditar no amor que vem depois de uma noite que durou uma eternidade, é o recado da letra.
Os Britos marcam presença na lenta "Posso falar mais alto" com guitarras emanadas do álbum branco dos Beatles e solo de sax espacial. Para que não aconteça o que diz a letra, "olhar nos olhos para nunca mais se ver", George encara o passado em "Curados ao sol de Copacabana", sobre o holocausto nazista que apagou parte de sua ascendência na Polônia da Segunda Guerra, dos bisavós para trás (se os avós não tivessem fugido, ele não existiria). Uma leitura ao jeito dele, com citações atuais, da celebração de uma terra nova longe da ameaça da solução final. Inspirado no livro "O filho do holocausto", de Jorge Mautner, que comparece numa fala sobre os mortos nos campos de concentração.
"Nós não cabemos nesse mundo" advertem os versos iniciais da canção seguinte "O céu que nos protege", antiga parceria de George com Guto e Dadi que exigiu uma reunião deles para ser restaurada e modificada, com citação de "batidas na porta do céu (ninguém ouviu, mas se abrir vão cair flores para nós)".
Violões e percussão (jarra de barro, parece) criam o clima. Percussiva-eletronicamente com sopros e balanço, "Muda" prega que mudar é preciso: "Muda a maré/ Muda o pente, muda o topete/ Às vezes parece que tudo fica como é/ Às vezes quero largar tudo e dar no pé". Eu também. Fui ao som pop refrescante de George Israel.
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