Nova Iorque O cinema norte-americano está cheio de pessoas com currículos inversamente proporcionais aos seus egos. Na contramão, nomes com décadas de dedicação à causa cinematográfica filmam com um vigor típico de quem está começando. Woody Allen pertence a esse grupo. O cineasta, que está com 71 anos, vem lançando um filme por ano desde a década de 90. No momento, ele está desenvolvendo dois longas-metragens novos. Diferentemente da maioria das pessoas da sua idade, Allen detesta ficar falando do passado. Nem mesmo do passado recente. "Depois que faço um filme, adeus, não quero mais saber dele", diz o diretor, em entrevista, por telefone, do seu apartamento em Nova Iorque. Já em exibição no Brasil, mas sem estréia prevista em Curitiba, Scoop O Grande Furo, é o mais recente trabalho de Allen. O filme gira em torno de uma estudante de Jornalismo (Scarlett Johansson) que se apaixona por um homem que pode ser um assassino (Hugh Jackman). O cineasta, que vive um ilusionista na trama, revela que escreveu o longa-metragem para Scarlett Johansson.
O senhor interpreta um ilusionista em Scoop. É assim que o senhor vê os cineastas em geral? Woody Allen Eu acredito que existem similaridades entre essas duas profissões, sim. Eu fazia mágicas quando era criança. Adorava. São os mesmos truques. Nos dois casos, você cria artifícios sutis para prender a atenção da platéia. São artifícios para chamar a atenção e desviar também. Por isso, dirigir sempre foi uma coisa muito natural para mim.
Mas os mágicos só querem entreter. Os seus filmes querem mais do que isso, não?Sim, eu tento dizer algo com os meus filmes, sim. Tento mostrar um ponto de vista. Mas os mágicos também tentam dizer algo sobre a vida, ainda que não verbalmente. Eles tentam mostrar que existem mais coisas por aí do que somos capazes de perceber. Pensando bem, eu também tento mostrar coisas de maneira não-verbal.
No caso de Scoop, o que o senhor tentou mostrar? Primeiro, tentei mostrar a dedicação de um profissional, um jornalista. Uma pessoa que volta da morte por causa de uma reportagem que ela precisa ver publicada (trata-se de um personagem secundário vivido pelo ator Ian McShane). Também quis mostrar que relações entre pessoas aparentemente diferentes são possíveis. E que, às vezes, a pessoa mais importante da história pode ser uma menina mimada e inocente. Ou um cara que vive de criar ilusões, divertindo os outros.
De certa forma, o filme é uma homenagem ao homem comum? Sim. Muitas vezes, a vida depende das pessoas comuns. De músicos, mágicos... Essas pessoas que nos dão essas alegrias. Volto a dizer que o filme também é uma homenagem aos jornalistas e a todas as pessoas que se dedicam às suas ocupações. Mas os grandes homenageados são mesmo essas pessoas comuns que levam a vida de maneira decente.
O senhor se imagina querendo voltar da morte para fazer mais um filme?Eu me imagino querendo voltar para corrigir os erros dos filmes que deixei (risos). Sim, teria o que fazer, eu mexeria em algumas cenas, também na edição...
Como Ponto Final Match Point, Scoop trata dos valores das classes mais altas. Por que tanto interesse nesse assunto? É curioso você ter perguntado isso, pois o meu filme novo, Cassandras Dream, é sobre os valores de pessoas vindas de classes baixas. Mas, no geral, eu escrevo, sim, sobre pessoas de classe alta. São as pessoas que eu conheço. Pessoas educadas, cultas, que fazem filmes, escrevem óperas, tocam instrumentos... Por outro lado, eu sou uma pessoa vinda das classes mais baixas. Meu pai foi taxista e garçom. Mas, quando escrevo, sempre é sobre as classes mais altas. Talvez eu as inveje. Pode ser que eu crie fantasias sobre elas...
Mas o senhor também critica essas pessoas nos filmes... É verdade.
Por que Cassandras Dream é sobre pessoas de classe baixa?Foi uma história que me ocorreu. Vi que ela só funcionaria com pessoas que não são confiantes, com pessoas que têm muitas inseguranças. Os personagens tinham que ter muitas necessidades. É um melodrama sério e humanista. Acho que as pessoas que gostaram de Match Point vão adorar.
Por que o senhor decidiu atuar em Scoop? Eu decidi atuar no filme para trabalhar com a minha amiga Scarlett. Ela é muito engraçada. Adoro dividir o set com ela. Eu escrevi o filme para a Scarlett. Nós sempre nos divertimos muito. Viramos amigos próximos durante as filmagens de Match Point. Atuar é uma coisa que não me interessa mais, pois me limita. Não posso escrever com liberdade se vou estar no filme. Porque eu não sirvo para qualquer papel. Não posso escrever um filme sobre astronautas, biólogos, caubóis, se vou estar nele.
Scarlett Johansson está se tornando a sua atriz-assinatura?Durante a minha vida, isso aconteceu várias vezes. Vivi isso com a Diane Keaton, com a Mia Farrow, com a Judy Davis... São grandes atrizes com quem amei trabalhar. É o caso de Scarlett, que também é uma grande atriz. Ela faz tudo o que eu peço. Canta, dança, conta piadas...
Noivo Neurótico, Noiva Nervosa está completando 30 anos. Qual é a sua relação com o filme, que é apontado por muitas pessoas como a sua obra-prima? Não tenho qualquer relação com ele. Não olhei mais para ele desde o seu lançamento. Eu continuo muito amigo da Diane (Keaton, que faz par com ele no longa-metragem). Mesmo ela morando na Califórnia e eu em Nova Iorque. Vejo sempre os filmes dela. Mas eu não vivo no passado. Não tenho fotos antigas espalhadas pela casa, coisas da minha infância... Depois que eu faço um filme, adeus, não quero mais saber dele.
A nostalgia poderia prejudicar os seus filmes? É importante não ficar preso no passado, ficar pensando no que passou. O que passou, passou. O que me interessa é o filme que eu estou fazendo no momento. Eu me divirto filmando. Gosto de acordar cedo, do clima. Quando acaba, espero que o público e a imprensa gostem. Às vezes, isso acontece. Em outras, não. Mas nunca fico olhando para trás.
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