A derrota de Hillary Clinton nas eleições foi algo mais trágico do que uma grande porção de alunos do ensino superior dos Estados Unidos poderia suportar: depressão e choro por todo lado. Foi preciso então que as universidades tomassem uma providência. A solução encontrada foi criar uma coisa chamada “safe space”, um lugar onde eles pudessem se proteger do mundo lá fora.
Os “safe spaces” são parecidos com jardins de infância. Um deles, criado pela Universidade da Pensilvânia, tinha filhotinhos, biscoitinhos e canetinhas para colorir. E, olha que gracinha, nas páginas para colorir, várias mensagens positivas para apoiar os estudantes apavorados.
Na Universidade Brown, um desses “safe spaces” estava além de um jardim de infância. Era praticamente uma creche. Mas para adultos com barba, carteira de motorista e idade legal para votar e beber. Era equipado com massinha, bolhas de sabão, mantinhas, e travesseiros.
Outras universidades de prestígio como a Columbia e a Yale “protegeram” seus alunos adiando os exames até que eles se acalmassem. Alunos em “choque” da Universidade de Cornell organizaram um “choraço”, no qual escreveram frases em cartolina com suas “emoções”.
“Você não é um floco de neve, bonito e único. É a matéria orgânica em decomposição como todo mundo e todos fazemos parte da mesma composteira.”
Essa geração de adultos incapazes de lidar a realidade, com o resultado de uma eleição que não lhes foi favorável, com opiniões que não lhes agradam, foi batizada lá fora de “generation snowflake”, ou “geração floquinho de neve”, numa alusão à fragilidade. Também é uma referência a um trecho do livro “Clube da Luta”, de Chuck Palaniuk: “Você não é um floco de neve, bonito e único. É a matéria orgânica em decomposição como todo mundo e todos fazemos parte da mesma composteira.”
As redes sociais estão infestadas de pessoas assim. Estão o tempo todo ofendidas por qualquer coisa, por menores e mais desimportantes que sejam. Um dos grandes críticos dessa geração é Milo Yiannopoulos, editor do controverso site Breibart, cujo ex-executivo Steve Bannon hoje é conselheiro de Donald Trump.
Yannopopulos recentemente tinha uma palestra marcada para a Universidade da Califórnia em Berkeley, mas os alunos fizeram uma petição e um protesto que reuniu mais de mil pessoas pedindo o cancelamento. Em um ambiente universitário, onde as ideias devem falar mais alto, alunos fizeram um protesto pedindo censura por não conseguirem lidar com o diferente.
Mas onde entra Donald Trump nessa história toda, além de aparentemente ser o gatilho de boa parte do comportamento infanto-juvenil da esquerda americana e também mundial?
Donald Trump é igual, talvez pior, que todos os estudantes brincando de massinha em suas creches para adultos nas universidades para ricaços da Costa Leste americana. Afinal de contas ele tem 70 anos e é o presidente dos Estados Unidos. Do presidente da maior potência do planeta se espera uma postura no mínimo... presidencial. E não o comportamento de um adolescente raivoso que sempre que é contrariado vai correndo xingar muito no Twitter.
“Alguma blogueira realmente estúpida da decadente Vanity Fair, uma revista cujos anúncios despencaram 18% este ano, disse que eu uso uma peruca — EU NÃO USO!”
Depois de vencer a eleição, os exemplos são patéticos. Quando o vice-presidente Mile Pence foi vaiado durante uma apresentação de uma peça de teatro em Nova York (reduto democrata), e o elenco de atores discursou sobre diversidade, Trump exigiu que houvesse um pedido de desculpa. A escolha de palavras não poderia ser pior. “O teatro deveria ser sempre um lugar seguro e especial. O elenco de Hamilton foi muito indelicado a noite passada com um bom homem, Mike Pence. Peçam desculpas!”, escreveu em seu Twitter. Destaque para o original, em inglês: “safe and special place”, ao se referir ao teatro. Mas que floquinho de neve esse Trump!
Quando tiraram uma foto dele de um ângulo desfavorável, mostrando seu duplo queixo, coisa que qualquer um na sua idade — e com certeza mesmo antes dela — não se importaria, reclamou adoidado com a NBC News pela divulgação da imagem. O resultado, obviamente, é que ela se tornou viral mundialmente.
Qualquer coisa, mesmo as menores, constituem motivo para o topetudo-em-comando perder o psicológico. Quando uma repórter da Vanity Fair criticou seu restaurante situado na Trump Tower, ele desancou a revista no Twitter. “Alguma blogueira realmente estúpida da decadente Vanity Fair, uma revista cujos anúncios despencaram 18% este ano, disse que eu uso uma peruca — EU NÃO USO!”, digitou em fúria.
Seu maior inimigo, porém, pré e pós eleição, parece mesmo ser o programa humorístico Saturday Night Live. Nada mais comum que, em uma democracia, os poderosos sejam objeto de troça. Da leve à pesada. É natural e saudável também — algo que os humoristas brasileiros parecem ter esquecido durante o período em que o PT esteve no poder — que nem o presidente esteja a salvo das piadas. Somente em tiranias a imprensa e os artistas não questionam e não tiram sarro dos que estão em posições de comando. Trump, ao que parece, não entendeu isto ainda.
“O SNL costumava ser realmente engraçado. Mas agora eles cruzaram a linha para simplesmente serem maldosos.”
A cada apresentação do programa, todo fim de semana, ele se enfurece com algum esquete protagonizado por Alec Baldwin, o ator que faz seu papel no humorístico. “A NBC News é ruim mas o Saturday Night Live é o pior da NBC. Não é engraçado, o elenco é terrível, sempre uma completa porcaria. TV da pior qualidade”, já tuítou.
No último fim de semana, ele foi novamente vítima do humor do SNL. Mas quem brilhou foi a atriz Melissa McCarthy interpretando o porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer. Bem que Spicer tentou, de forma surpreendente, reagir de maneira elegante. Chegou a dizer que achou a “imitação engraçada”. Mas, a exemplo do seu chefe floquinho de neve, não controlou a incontinência verbal e logo abriu o berreiro. “Mas [a imitação de Trump feita por] Alec Baldwin passou do engraçado para o maldoso, e isso é infeliz. O SNL costumava ser realmente engraçado. Mas agora eles cruzaram a linha para simplesmente serem maldosos.”
Há boatos de que uma salinha na Casa Branca está sendo equipada com massinha colorida, filhotinhos fofos, biscoitinhos e, claro, um computador com acesso ao Twitter.
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