James Bond não passa de um gângster que trabalharia para qualquer país que lhe oferecesse um suprimento regular de mulheres e Martinis secos, diz o escritor John Le Carré.
A popularidade do agente 007 pode estar maior que nunca, mas não com o criador de George Smiley.
Eis o que Carré tinha a dizer sobre James Bond nos anos 1960: "Não gosto de Bond. Não tenho certeza de que Bond seja um espião. Acho que, se estamos falando de literatura de espionagem, é um grande erro incluir Bond nessa categoria", falou o escritor em uma entrevista de 1966, aludindo ao personagem criado pelo escritor rival Ian Fleming.
"Me parece que ele é mais algum tipo de gângster internacional munido de licença para matar, como é dito. Ele é um homem inteiramente fora de qualquer contexto político. Por exemplo, não interessa em absoluto a Bond quem é o presidente dos Estados Unidos ou da União de Repúblicas Soviéticas."
A entrevista será exibida novamente na televisão esta semana como parte do programa "In Their Own Words" (Nas próprias palavras deles), da BBC4, que revê imagens de arquivo de alguns dos maiores nomes da literatura britânica.
Mas isso foi em 1966, e agora é 2010.
"Hoje em dia eu seria muito mais condescendente", disse Le Carré à revista Radio Times, depois de assistir à fita da entrevista.
"Acho que perdemos os livros de vista, em favor das versões para o cinema, não?"
Os livros de Fleming e suas versões cinematográficas têm forte teor de violência e engenhocas diversas, diferentemente dos livros de Le Carré, que incluem "O Espião que Saiu do Frio" e "O Jardineiro Fiel".
"Na origem de Bond havia algo neofascista e totalmente materialista", disse Le Carré.
"A impressão que se tinha era que ele teria feito todas as mesmas proezas para qualquer país, desde que as mulheres fossem igualmente belas e os Martinis igualmente secos."
Le Carré, que nos anos 1950 e 1960 trabalhou para os serviços de inteligência MI5 e o MI6, também pôs em dúvida a credibilidade do protagonista sedutor dos livros de Ian Fleming.
"Eu sabia que tinha escrito sobre a realidade em 'O Espião que Saiu do Frio' e que o trabalho de Fleming foi uma criação fantasiosa intencional das experiências do próprio Fleming, criado quando ele estava em segurança em Nova York."
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