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Quase toda a informação que temos sobre Jesus Cristo vem dos livros – especificamente do conjunto de livros que forma o Novo Testamento da Bíblia Cristã, se forem descontados os textos apócrifos que jamais entraram no cânone tradicional. Portanto, seria justo pensar que, de uma maneira ou de outra, a capacidade literária dos autores que escreveram essas obras influencia o jeito como vemos Cristo, independentemente de nossa crença pessoal. Em tempos modernos, tem se tornado comum o estudo da Bíblia a partir desse ponto de vista: um agrupamento de livros que nos conta uma história e que pode ser analisado também como peça literária.

Interpretar Jesus como personagem literário é uma das tarefas a que se propõe Harold Bloom, o mais poderoso crítico literário do planeta, em seu novo livro, Jesus e Javé – Os Nomes Divinos (Objetiva, 276 págs., R$ 35,90). Na verdade, Bloom se detém sobre o que, em sua visão, seriam três personalidades diferentes. A primeira é Javé, o Deus do Antigo Testamento. A segunda é o Jesus histórico, que segundo ele não poderá nunca ser conhecido completamente. A terceira é o que ele chama de Jesus teológico – ou seja, a imagem de Jesus criada pelos séculos de escrita e tradição da Igreja.

A principal fonte para a análise de Bloom é a própria Bíblia – e também o conjunto de livros adotado pelos judeus, a Tanak, que não contém o Novo Testamento e traz algumas diferenças em relação ao Velho Testamento. No caso de Jesus, ele chega também a estudar alguns dos Evangelhos apócrifos, principalente sobre o Evangelho de Tomé, que ele considera próximo do gnosticismo.

As teses de Bloom, que incluem alguns pontos polêmicos, podem ser ou não do agrado do leitor. Mas o que é difícil de ser contestado é o poder de argumentação do autor, baseado em uma erudição que beira o inacreditável. Principalmente quando se pensa que o tema está longe de ser único em sua vasta e multifacetada obra, que inclui diversos clássicos, como A Angústia da Influência e O Cânone Ocidental.

Entre os pontos levantados por Bloom que podem causar discussões acaloradas está a tese de que hoje, para os cristãos, o Pai estaria perdendo terreno para a Virgem Maria. Ou a distinção que ele faz entre a Tanak judaica e o Velho Testamento cristão, que segundo ele não apenas são conjuntos distintos de livros, como também têm objetivos diversos entre si. Sem contar o próprio ponto de partida do livro, que distingue dois personagens em Jesus, que ele próprio admite ser um tópico para lá de polêmico.

Mas o objetivo de Bloom, intelectual sério que não precisa de escândalos para se promover, é arriscar uma interpretação ousada, muito mais do que chocar. Mesmo porque uma certa delicadeza permeia todo o livro, tentando evitar quaisquer juízos ou afirmações que pudessem entrar em conflito com a religião dos leitores.

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