Um mergulho no escuro mudou a vida de Marcelo Rubens Paiva. Mas ele soube fazer da adversidade, que o prendeu irreversivelmente a uma cadeira de rodas, um dos marcos da literatura brasileira. O romance autobiográfico Feliz Ano Velho (Prêmio Jabuti em 1982) é um best-seller instantâneo que atravessa o tempo e permanece com frescor. Coisas de clássico.
A produção deste paulistano de 49 anos se revelou mais do que fecunda. Na literatura, são muitos os títulos: Blecaute (1986), Ua:brari (1990), Bala na Agulha (1992), Não És Tu, Brasil (1996), além dos livros de crônicas O Homem Que Conhecia as Mulheres (2006) todos editados pela Objetiva. A prosa de Paiva já foi traduzida para inglês, espanhol, francês, italiano, alemão e tcheco.
Ele também é dramaturgo, e premiado. Depois da debutância em 1989, com 525 Linhas, abocanhou o Prêmio Shell em 1999 com Da Boca pra Fora E Aí, Comeu?. Já produziu roteiros para a Rede Globo. Desde 1983, atua na imprensa. Foi crítico literário da revista Veja, apresentador do programa Fanzine da TV Cultura e colunista e articulista do jornal Folha de S. Paulo. Atualmente, é colunista, aos sábados, do jornal O Estado de S. Paulo.
Gazeta do Povo Há varias camadas em A Segunda Vez que Te Conheci. Como foi costurar tantas nuances?
Marcelo Rubens Paiva São coisas que mexem com aqueles que vivem nos espaços urbanos, nesses tempos sem utopia. Convivemos nesses núcleos em busca de dinheiro e felicidade. São fantasias que dão prazer ao homem contemporâneo: informações, casos, paixões, sexo fácil. E, no mais, são coisas que conheço bem. O interesse começou quando fiz quatro peças de teatro, Feliz Ano Velho, em 1984, E Ai, Comeu?, em 1999, Mais-que-Imperfeito, em 2001 e No Retrovisor, em 2003, todas no Teatro Augusta, da Rua Augusta, ponto tradicional de prostituição e balada. Convivi com as garotas que faziam ponto em frente. E trabalho desde 1982 em revistas, jornais e tevês.
O personagem-centro é praticamente descartado de um jornal num momento em que ele se torna idoso e, para a empresa, obsoleto. Isso foi baseado em alguém ou em observações?
É baseado em toda a minha geração, que entrou nos anos 1980 para modernizar as empresas de comunicação, e agora está sendo trocada por uma juventude mais barata, obediente e bem informada digitalmente, sem os vícios do jornalismo impresso e ideológico. Raul, o protagonista, ao ser demitido, passa a olhar o jornalismo como uma atividade que se passa apenas em território inóspito, e que apenas arrivistas medíocres se dão bem. A sua opinião, sobre o jornalismo, coincide com a do personagem?
Não. Eu sempre fui mais cético. Até porque fui jornalista e fonte, sou crítico e criticado, vivi os dois lados. Meu narrador é 100% jornalista, só pensa nisso, acredita na sua profissão, ama o que faz, busca comprometimentos éticos, muitas vezes ferindo a própria ética. Eu sempre fui mais cínico e menos pretensioso. Sei que um livro muda mais uma pessoa do que uma notinha no jornal.
Em relação às garotas de programa de luxo? Você fez pesquisa ou conviveu diretamente?
A prostituição parecia estar com os dias contados depois da emancipação feminina, mas ganhou fôlego. Existe um tipo de homem que quer uma mulher descartável. Mas fiz um pouco de pesquisa de esquina, rua, boate, para conhecer alguns segredos. Adoro o centro de São Paulo, frequentei pontos de programa sem preconceitos, não é uma tese, apenas narro, invento. Me chamou atenção que todas têm um discurso parecido, que não são prostitutas, mas estão, que precisam pagar contas, mas vão sair dessa.
São Paulo surge urbana, caótica, fragmentada enfim em suas linhas e entrelinhas, neste e em outros romances. Um personagem seu já propôs, até, pintar de vermelho o asfalto da Avenida Paulista. Fale da sua cidade idiossincrática São Paulo.
Amo. Nasci aqui. Sou parte da cidade. Já morei em outras cidades. Passei a infância no Rio. Tenho um apartamento no Leblon. Mas não consigo sair daqui. São Paulo mistura o que há de inocente num caipira, com o que há de ambicioso num ser cosmopolita. (MRS)
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