“Vou meter bala”, avisou o vice-almirante Othon Pinheiro da Silva, apavorado, para os policiais que ameaçavam arrombar a porta do quarto em que se trancara. “Isso pode ser feito com um senador no exercício do mandato?”, perguntou um estupefato Delcídio Amaral aos policiais federais que foram prendê-lo na porta do quarto do hotel em que se hospedava. “(O celular) está lá em cima, eu posso ir lá pegar e o senhor espera aqui”, disse o empresário Marcelo Odebrecht para um dos agentes que foram prendê-lo em sua casa.
Momentos tensos abundam, bem contados, no livro-reportagem “Lava Jato – O juiz Sérgio Moro e os bastidores da operação que abalou o Brasil” (Ed. Sextante), há 11 semanas em primeiro lugar em listas dos mais vendidos do gênero não ficção.
“Eu não esperava tanto”, diz o jornalista Vladimir Netto, comemorando três edições, lançamentos concorridos aqui e acolá e estimados 90 mil exemplares vendidos até aqui. “Só confirma que as pessoas querem se informar melhor sobre a operação mais importante da história recente do país”, complementou, na manhã da sexta-feira passada, às voltas com os maus humores do gato Mussum, já velhinho, numa clínica veterinária de Brasília, onde mora, com a mulher e as filhas Manuela, de 5 anos, e Isabel, de 3 anos.
Netto, de 43 anos, é repórter do Jornal Nacional, da TV Globo, onde trabalha desde 2001, e vice-presidente da Associação Brasileiro de Jornalismo Investigativo (Abraji). Mineiro, de Caratinga, carrega uma história dos anos de chumbo – a prisão de seus pais, os jornalistas Marcello Netto e Míriam Leitão, em 1972, vítimas de tortura. Míriam já estava grávida dele. “Eu ter nascido foi um milagre”, disse. “Quantos não morreram?.”
Capítulos
Jornalista desde 1994, primeiro da imprensa escrita (O Dia, Jornal do Brasil e Veja), cobriu a maioria dos últimos escândalos com denúncias de corrupção – entre eles a Lava Jato, da qual é um declarado entusiasta, com destaque para o juiz Sérgio Moro. A operação começou a virar livro em 1.º de janeiro de 2015 – “depois de voltar da cobertura da posse da presidente eleita, Dilma Rousseff”, como escreveu no capítulo dos agradecimentos, Os bastidores dos bastidores. Dezessete meses depois – maio deste ano – quase 400 páginas chegaram às livrarias.
“Quis organizar as informações sobre uma operação complexa e cheia de variantes, que foi e está indo mais longe do que todas as outras, e fazer uma narrativa agradável, que convide à leitura”, disse Netto. Em 12 capítulos, com muitos intertítulos que facilitam o entendimento, o livro começa com a prisão do doleiro Alberto Youssef, em 17 de março de 2014, no capítulo A casa começa a cair.
Youssef disse a Netto, sobre aqueles dias: “Eu sou homem de ter coragem de mamar em uma onça, mas o único homem de quem eu tenho medo nesta Terra se chama Sérgio Moro”. O último capítulo alcança o afastamento da presidente Dilma Rousseff, pelo Senado, em 12 de maio deste ano.
Para dizer algo a mais sobre os citados momentos de tensão: o vice-almirante Othon Pinheiro da Silva não meteu bala em ninguém, mas pulou em cima de um dos agentes da Polícia Federal ao finalmente abrir a porta do quarto. “Houve uma breve luta e os policiais tiveram de imobilizá-lo e algemá-lo”; o senador Delcídio teve a resposta positiva – sim, pode –, com a exibição do mandado de prisão; Marcelo Odebrecht não conseguiu livrar-se do agente quando quis ir sozinho buscar o celular. “Eu vou junto”, disse o PF, e assim o apreendeu.
Continuação
Netto já está trabalhando no Lava Jato, parte 2, que espera lançar pelo final de 2017. “O Brasil nunca mais vai ser igual”, disse. “Quanto mais conhecermos essa operação, mais lições podemos tirar.”
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