"Não vamos ganhar um milhão por mês, por enquanto. O tamanho da ambição é nossa medida. Com expectativa de lucro menor, podemos manter nossa linha de experimentações e ainda assim chegar ao público."
Otávio Linhares, escritor e editor da Encrenca Literatura de Invenção.
Tendência
Fusões acentuam concentração do mercado editorial
Na última semana o mercado editorial brasileiro foi surpreendido pelo anúncio da fusão das editoras Companhia das Letras e Objetiva.
O negócio é consequência direta da aquisição, no ano passado, de todos os selos literários da espanhola Santillana pela Penguin Random House (PRH), hoje o maior grupo editorial do planeta e principal acionista da Companhia das Letras.
Com a fusão, a nova empresa Penguin Random House Brasil passa a controlar também a editora Objetiva, incluindo os selos Alfaguara, Suma, Fontanar, Ponto de Leitura e Foglio.
Em fevereiro, a Leya Brasil já havia arrematado 95% da editora carioca Casa da Palavra.
Para analistas do setor editorial, esta tendência de concentração do mercado editorial é irreversível e está ocorrendo no mundo inteiro.
O consultor editorial Carlo Carrenho acredita que "quanto maior a concentração, menor o espaço das editoras médias e pequenas, que garantem a diversidade do mercado editorial", conforme escreveu em um artigo no Publish News, o boletim de notícias do mercado editorial mantido por ele.
Ele afasta, entretanto, o principal temor de autores brasileiros sobre estas incorporações comandadas por selos estrangeiros: de que, controladas por grupos multinacionais, as grandes editoras passarão a publicar mais autores de fora em detrimento dos nacionais.
"Estas empresas buscam aumentar vendas e lucro e, nesse sentido, terão tanto interesse em publicar seus best sellers no Brasil quanto em publicar e desenvolver autores brasileiros de sucesso e até traduzi-los no resto do mundo", avalia.
Enquanto as fusões e aquisições entre grandes selos chacoalharam o mercado editorial brasileiro neste início de 2014, os pequenos selos editoriais saem em busca de alternativas.
Exemplo local de editora de pequeno porte que nada no contrafluxo do mercado, a curitibana Encrenca Literatura de Invenção anunciou um novo pacote de títulos e algumas mudanças de estratégia em seu segundo ano de vida para se manter atuando com independência no ramo.
Criada no ano passado com o objetivo de lançar autores locais com produção avessa às formulas consagradas nas listas dos mais vendidos, a editora está apostando na expansão de seus pontos de venda e ampliação de portfólio com nomes de maior envergadura nacional e regional.
Para o primeiro semestre de 2014, a Encrenca prepara o lançamento de três livros do músico e escritor carioca Fausto Fawcett. Um deles é um texto inédito chamado Cachorrada Doentia (Fundamentalismo à Brasileira) escrito especialmente para o selo.
Segundo o escritor e editor Luiz Felipe Leprevost, um dos sócios da Encrenca, o volume terá seis contos e um breve ensaio com a temática da "proliferação de fundamentalismos". Com sua retórica peculiar, Fawcett explica que há fundamentalismo de todos os tipos "no país da mestiçagem explícita festivos, religiosos, consumistas, financeiros, sexuais, intelectuais, assassinos, urbanos, rurais, amazônicos" e escreve sobre seus perigos.
Os outros dois livros de Fawcett são obras escritas entre os anos 1980 e 1990 que alcançaram grande repercussão quando lançados e que ainda hoje mantêm a aura de "clásscos cult": a fantasia cyberpunk Santa Clara Poltergeist e o sensual Básico Instinto, ambos fora de catálogo há anos. O primeiro livro está sendo reescrito pelo autor "à unha", palavra por palavra, já que não há arquivo digital dos originais.
Ainda para o primeiro semestre, o selo também finaliza a reedição de Nova Holanda, do escritor Sérgio Rubens Sossela (1942-2003), uma novela "maldita" de um autor curitibano mais comentado do que lido, além dos romances Plano de Fuga, de Assionara Souza, e Hedra, de Alexandre França.
A Encrenca também tem se ocupado de expandir seus pontos de venda para outras capitais, como Rio de Janeiro e São Paulo.
Leprevost conta que este processo incluiu visitas a várias livrarias e a realização de palestras aos vendedores explicando a proposta da editora e de cada um dos livros lançados, em "um corpo a corpo mais sofisticado".
"Se vamos fazer isso, não dá pra ficar naquele mão em mão do pequeno e restrito círculo literário underground. Acho que já passamos por isso. Há um esforço que tem sido feito de modo conjunto, com mais parcerias acontecendo para fortalecer o mercado", avalia.
Experimentações
Para Otávio Linhares, também sócio da Encrenca, há um movimento de outras pequenas editoras com propostas equivalentes (como a Kafka e a Tulipas Negras, por exemplo) que compartilham o desejo de se consolidar neste momento instável.
Para ele, a concentração do mercado em poucas grandes editoras não afeta a proposta editorial da Encrenca e de outros selos menores. "Se a Companhia das Letras comprar toda a sua grande concorrência, para nós não muda nada. Funcionamos em outro plano. Nossa proposta é publicar livros radicalmente autorais e sem fazer concessões", explica.
"Não vamos ganhar um milhão por mês, por enquanto. O tamanho da ambição é nossa medida. Com expectativa de lucro menor, podemos manter nossa linha de experimentações e ainda assim chegar ao público", acredita.
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