Walter Kirn é um dos escritores americanos mais interessantes de sua geração. Nascido em 1962, foi crítico literário e jornalista de veículos importantes dos EUA antes de se tornar autor do best-seller Amor Sem Escalas, adaptado ao cinema com George Clooney.
Em seu livro mais recente, Quando a Máscara Cai, Kirn combina suas memórias com técnicas do jornalismo investigativo, e um toque de ensaio sobre cultura e sociedade, para confessar um período infame de sua própria história.
Em um texto cheio de um sarcasmo corrosivo, ele confessa sua relação com um homem que se dizia Clark Rockfeller, suposto membro de uma das famílias mais ricas dos Estados Unidos. Durante 15 anos, Kirn foi engrupido pelo falso amigo milionário, até que a Justiça americana o desmascarou, descobrindo que o homem, além de mentiroso contumaz, era também um assassino.
Kirn é um daqueles escritores dispostos a dissecar seus próprios defeitos em público e descreve de forma brilhante como se deixou levar por esse psicopata hipnotizante e perspicaz que o fez de peça de um jogo de mentiras cheio de referências à literatura e ao cinema noir que Kirn não conseguiu perceber durante uma década e meia.
Na primeira parte do livro, Kirn mostra como a relação entre os dois começou em 1998. Sua jovem esposa dirigia uma agência de proteção a animais e lhe contou em casa que um “Rockfeller tinha ligado e queria adotar um cãozinho gordon setter paralítico que ela anunciou na internet”.
O problema é que ele, o Rockfeller, não dirigia, ele não confiava nas empresas de transporte e seu “jato estava na China”, assim alguém teria que levar o cão do estado de Montana até Nova York, uma viagem de 3 mil quilômetros. Lá, pelo cão, estariam esperando quatro refeições diárias feitas por um chef exclusivo para o mascote, passearia com sua cadeira de rodinhas no Central Park e teria como vizinho de porta o cantor Tony Bennett que, de vez em quando, apreciava cantar umas músicas e tomar um vinhozinho.
Para a boa alma que levasse o cão ao seu novo dono, haveria uma recompensa. Pendurado numa hipoteca e recém-casado, Kirn achou que poderia unir o útil ao agradável, pois o tal ricaço – “amigo” de J.D Salinger e George Lucas – se apresentava como um potencial personagem para sua literatura ( o que se confirmou neste livro divertido e perturbador). Kirn foi e se encantou pelo sujeito com quem conviveu intimamente pelos anos seguintes.
Walter Kirn. Tradução de Sérgio
Telarolli. Companhia das Letras, 247 pp., R$ 42.
Na segunda parte do livro, Kirn atua como repórter durante o julgamento do ex-amigo por homicídio. Nesta investigação pessoal, o autor desenvolve uma espécie de guia sobre a natureza psíquica de um delinquente americano. Em um comentário na contracapa do livro, o escritor de suspense James Ellroy diz que o livro “disseca a psicopatia, a postura perversa da geração da internet, da arte, do dinheiro e da própria natureza da crença”.
Pois o mais admirável e surpreendente nesta história não é a postura delirante do falsário e sim o fato de que pessoas inteligentes – e um escritor talentoso como Kirn – tenham caído na conversa mole do falso Rockfeller.
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