Foi publicado no mês passado no Brasil o primeiro volume da graphic novel O Árabe do Futuro, do artista franco-sírio Riad Sattouf. Premiado na França, onde o livro liderou as listas de mais vendidos, Sattouf é um dos convidados da Festa Literária Internacional de Paraty de 2015. O quadrinista – e eventual cineasta – vai participar de uma mesa sobre as batalhas culturais entre franceses e árabes. Tema em que, como ex-colaborador do jornal parisiense Charlie Hebdo, naturalmente se torna uma voz a ser ouvida. Mas sua biografia, justamente o tema de O Árabe do Futuro, é capaz de trazer cores ainda mais interessantes ao relato.
Sattouf nasceu na França em 1978, mas viveu uma trajetória de mudanças culturais intensa desde os três anos.
Ele é filho de mãe francesa, nascida na Bretanha, e de pai sírio, originário de uma aldeia próxima à cidade de Homs (oeste da Síria).
Aluno brilhante, o pai de Sattouf ganhou uma bolsa para estudar história na Sorbonne, em Paris, onde conheceu a esposa, em 1971. Ele se tornou doutor em 1978 e declinou um convite de Oxford para aceitar um cargo de professor adjunto na universidade de Trípoli, na Líbia, em 1980. Assustado com medidas tomadas pelo ditador Muamar Kadafi, voltou para a França para logo em seguida assumir uma vaga de professor na Síria.
Os relatos minuciosos das descobertas do pequeno Riad ao chegar a estes países tornam a história saborosa. É uma narrativa pessoal, cheia de impressões, sentidos aguçados, interpretações ilógicas, curiosidade. Sob o ponto de vista transparente e generoso de uma criança, as diferenças culturais – mesmo em seus choques mais brutais – são retratadas sem preconceito ou julgamento. E a riqueza de detalhes com que as paisagens da ponte Paris-Trípoli-Damasco são mostradas têm força para transportar o leitor para cenários instigantes, com personagens de traços divertidíssimos.
Ao mesmo tempo, a narrativa costura uma contextualização histórica bastante interessante, que explica a complexa teia de conflitos entre árabes e judeus e o lugar da Europa neste tabuleiro. Sattouf faz retratos inteligentes do imaginário ideológico do mundo árabe e, despretensiosamente, ajuda a entender aquele universo.
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