No texto que abre seu terceiro livro de crônicas, “Detetive À Deriva”, que será lançado em Curitiba nesta terça-feira (16), o escritor Luís Henrique Pellanda compara o seu ofício ao dos investigadores profissionais.
Luís Henrique Pellanda
Arquipélago Editorial, 224 pps. R$ 39. Crônicas.
Terça-feira (16), às 19h, na Livraria da Vila, Pátio Batel (Av. do Batel, 1868, Batel)
A analogia entre as profissões não é nova, lembra o autor. “A comparação é mais literária e não é a primeira vez que é feita. O [escritor] João do Rio (1881- 1921) já falava do cronista ‘flaneur’, que domina ‘a arte de perambular com inteligência como uma secreta, à maneira de Sherlock Holmes”.
No caso de Pellanda, a detecção a que se propõe é andar e pensar as ruas de Curitiba e tentar achar algum sentido na confusão urbana.
“A cidade é um caso insolúvel. Era para ser a colônia de segurança da nossa espécie, mas a transformamos num labirinto e numa arapuca. É um caso insolúvel, mas a gente não o arquiva”.
Titular da crônica literária publicada às terças-feiras na Gazeta do Povo, Pellanda define seu trabalho como um “pastor de acasos”, que estão por aí à solta, à espera de serem interpretados.
“Acredito que tudo é acaso. Não tenho fé, não acredito que haja um plano maior. As coisas vão acontecendo por acaso, obedecendo a leis físicas que a ciência um dia vai investigar dentro de suas limitações”.
Assim, contar boas história faz parte de um processo de busca de significados para as coisas pequenas .
“Todo mundo adora contar as coisas para alguém e receber em troca algum tipo de aprovação. Quando eu vejo alguma coisa na rua e penso que isso pode ser contado de alguma forma, eu recrio para dar sentido à narrativa. Vou buscando um sentido que não estava no fato, mas que está em mim e pode interessar alguém”.
Fora do caixote
Pedestre vocacional, Pellanda sempre sabe onde achar as histórias: nas ruas. “Como é minha profissão, às vezes é preciso escrever agora, eu desço de casa para rua e vou atrás de uma história que sempre aparece”.
Como detetive literário, o cronista “sai por aí sem caso e sem cliente na esperança de que uma história dessas me cubra os honorários e me dê uma esmola da atenção dos leitores”.
As crônicas de Pellanda fogem da tendência atual de transformar o espaço semanal no jornal em tribuna de opinião. O cronista olha e escreve sobre o cotidiano, sempre com um recorte político presente, mas sutil.
Biografia
Luís Henrique Pellanda nasceu em Curitiba em 1973. Escritor e jornalista, é autor dos livros “O macaco ornamental” (contos), “Nós passaremos em branco” (crônicas, finalista do Prêmio Jabuti 2012) e “Asa de sereia” (crônicas, finalista do Portugal Telecom 2014). É cronista do jornal Gazeta do Povo desde 2010 e escreve todas as terças-feiras desde 2014 .
“Eu escolho a crônica que não ‘sobe no caixote’, que não faz o discurso politico direto para trair o aplauso fácil de quem concorda comigo ou o ódio de quem discorda na primeira instância. Para isso existem colunistas políticos competentes”.
Escritas entre 2013 e 2016, porém as crônicas deixam de mostrar o conturbado cenário da política nacional no período.
“Ainda que apareça em plano secundário não é menos importante. As manifestações passam pelas minhas crônicas e os urubus do centro as observam, do mesmo jeito que precisamos nos posicionar, ainda que sem querer”.
Piranhas, urubus e pelicanos: os bichos nas crônicas de Pellanda
Animais famosos e anônimos da cidade dividem o espaço com personagens humanos nos textos do escritor curitibano
- Sandro Moser
Como acontece em seus livros anteriores, a maior parte da ação de “Detetive À Deriva”, novo livro de Luís Henrique Pellanda, se passa em ambiente íntimos dos curitibanos que caminham pela cidade: a Boca Maldita, a Ébano Pereira, a Rua XV, as praças Tiradentes, Osório e Santos Dumont (para ele, a Pracinha do Amor), o Passeio Público e o Capão Raso da infância.
Nos textos, muitos personagens reais e conhecidos da cidade surgem reinterpretados pelo olhar, às vezes poético, às vezes cruel de Pellanda.
Entre estes personagens recorrentes há animais como os urubus que ocupam os topos dos prédios da cidade, ou dois espécimes solitários que vivem no Passeio Público, mas nunca vão se encontrar.
“Estou obcecado com a piranha solitária do Passeio Público, tenho pensado nela. Um um peixe de cardume dentro de uma aquário”.
Sua solidão só é comparável à de Billy, o ”pelicano de Curitiba” que aparece nas crônicas de Pellanda como um símbolo da exclusão.
“Ele está sempre lá, se coçando com o bico, num mesmo toco de árvore há muitos anos. Todos os conhecem, ele é tratado com amor, mas ao mesmo tempo é a criatura mais deslocada que existe. Um pelicano que não voa”.
Os animais fazem parte dos textos de Pellanda, não por serem exóticos, mas por serem “nossos convivas na cidade”.
“É impossível você andar num lugar como este e não ver que eles estão aqui. É incrível que a gente não preste atenção neles. Elas dividem o mesmo tempo e o espaço, e nos influenciam assim como as influenciamos, mas as olhamos sempre do nosso ponto de vista. Somos uma espécie egocêntrica”.
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