Criado no Morro do Caracol, uma das favelas do Complexo da Penha, na Zona Norte do Rio de Janeiro, o escritor e agente cultural Otávio Júnior, 33 anos, percebeu que muitos de seus amigos de infância e as gerações seguintes de crianças que viviam nas comunidades não faziam planos para o futuro. “Não pensavam em profissão e no que fariam quando adultos”, pondera Otávio.
O cenário em que essas crianças cresceram realmente não favorecia a imaginação e os sonhos infantis. O Morro do Alemão, também na Zona Norte, era considerado um dos locais mais violentos do País. Muitas não viam perspectiva além de se aliar ao tráfico de drogas. E a paixão pelas palavras do “Livreiro do Alemão”, como ficou conhecido na região, acabou inspirando outros meninos como ele. Seus projetos, entre eles o “Ler é 10, Leia Favela”, que apresenta e disponibiliza livros diversos, têm lugar fixo no morro e costumam atender cerca de 300 crianças por semana.
Seus livros também dão representatividade à população do Alemão. “O Garoto da Camisa Vermelha” e “O Chefão Lá do Morro” foram criados após o período de Pacificação do Alemão. “Percebi que o morro estava em evidência, na música, no teatro, no cinema. Resolvi escrever histórias ambientadas nas favelas. Porque as crianças de lá passaram a gostar de ler, mas não se viam nos livros. Além disso, crianças de outras partes do Rio ou do Brasil tinham curiosidade em saber dessas histórias”.
Do lixo às bibliotecas
Tudo começou no lixo. E não é um trocadilho. Otávio andava ao lado da quadra de futebol do Caracol quando encontrou uma caixa repleta de brinquedos. Ficou maravilhado com um livro perdido no meio daqueles objetos que fizeram a alegria dos outros meninos. “El Gatton”, tradução em português para uma história espanhola, foi decisivo para sua formação. Numa noite em que faltou energia elétrica para assistir à novela “Vamp”, lembrou do livrinho. Devorou a história. Ele tinha 8 anos.
O menino achou poucas opções para dar vazão à vontade de conhecer novos universos literários. Mas não se abalou. Leu o manual de um Passat e conheceu o Livro dos Mórmons, tudo por empréstimo dos vizinhos. “Até bula de remédio eu lia”, brinca Otávio, que fez sua terceira passagem por Curitiba em palestras organizadas por escolas da cidade.
Começou então a escrever as próprias histórias, incentivado por uma professora do ensino fundamental. No fim da adolescência, fez a única coisa que acabou igualando sua trajetória a muitos de seus vizinhos: abandonou a escola, desestimulado pela rotina.
Passou a viver de seus textos. Encenava as histórias que criava em teatrinhos pelas escolas do Rio, graças ao apoio das diretoras. Publicou os primeiros livretos com o patrocínio de gráficas. Isso depois de percorrer editoras e tentar insistentemente contato com escritores. Um deles, Rogério Andrade Barbosa, recebeu o garoto de 18 anos e foi honesto: o texto ainda precisava melhorar. Anos mais tarde, Barbosa assinaria a contracapa de um dos livros infantis de Otávio.
A contação de histórias e sessões de leitura no Morro do Alemão começaram no quintal de parentes e foram crescendo graças à adesão da vizinhança. “Havia famílias que abriam a casa para esses encontros. Nesses casos, não apenas os filhos tornaram-se leitores. Os pais também começaram a gostar dos livros”, lembra. O acervo foi crescendo e ocupando caixas e, mais tarde, carros. A biblioteca hoje tem lugar e equipe fixos para realizar o empréstimo para as crianças no morro carioca. Outro projeto a que o autor se dedica atualmente é a loja Faz de Conta Guloseimas, em que mistura contos de fadas aos doces.
Em tempo: Otávio voltou à escola em 2004 para terminar o ensino médio e “El Gatton”, o primeiro livro, se perdeu nas mudanças do “Ler é 10’. “Nunca mais encontrei. Mas, há um ano, me deram de presente a capa do livro, enquadrada”.
Onde comprar: “O Livreiro do Alemão (R$ 25,90), “O Garoto da Camisa Vermelha” (R$ 34) e “O Chefão Lá do Morro” (R$ 34), alguns dos livros de Otávio Júnior, são vendidos na região Sul pela distribuidora A Página. Além do site, é possível comprar na loja física do Shopping Cidade (Av. Mal. Floriano Peixoto, 4.984)
Fim do ano legislativo dispara corrida por votação de urgências na Câmara
Boicote do agro ameaça abastecimento do Carrefour; bares e restaurantes aderem ao protesto
Frases da Semana: “Alexandre de Moraes é um grande parceiro”
Cidade dos ricos visitada por Elon Musk no Brasil aposta em locações residenciais