Este é um livro que se passa majoritariamente no Afeganistão, mas a localidade poderia ser qualquer outra. Afinal, a matéria com que Paolo Giordano lida em “O Corpo Humano”, que sai pela Cia. das Letras, não são as estratégias de guerra, mas as transformações por que passam os soldados e oficiais submetidos a elas. São personagens imaginados pelo autor e inseridos no corpo militar italiano que colaborou com a ofensiva liderada pelos EUA contra os rebeldes talebans, de 2001 a 2014.
Numa hábil construção de suas criaturas, Giordano nos transporta para dentro da vida no quartel, a partir dos dias anteriores à viagem ao Afeganistão. Os cabos Ietri e Cederna, o primeiro-sargento René e tenente Egitto, o médico, se apresentam para nós como seres humanos antes de virarem um número na matemática da guerra.
Na trama, os personagens partem numa missão que revela a arbitrariedade de decisões supostamente estratégicas. A ilusão de infalibilidade militar é retratada com sutileza.
Contando os dias para suas licenças e o retorno à Itália, um grupo é enviado como escolta de caminhoneiros afegãos a uma área de milícias, e o ataque é certo. Os desdobramentos da ação são descritos da mesma forma que o autor faz o preparo dos personagens, com subjetividade extrema. Ora pelo viés de um dos “heróis”, ora pelo de outro, conhecemos mais as fraquezas do que as virtudes desses homens. O autor mantém seus personagens presos a casa, ligados a saudades e a problemas de relacionamento que não se resolvem com a distância nem com os perigos da guerra.
Livro
Paolo Giordano. Cia. das Letras. Tradução de Eduardo Brandão, 352 pp., R$ 44,90.
Assim como o livro já abre prometendo, nada será igual no retorno da missão. As transformações por que passam Cederna, Egitto e René são radicais, cada um a seu modo. As formas como eles se relacionam com o próprio corpo ajuda a explicar o título do livro. E assim como o nome indica, trata-se de uma prosa orgânica e vital, pulsante.
Rigor científico
Doutor em Física, Giordano ficou conhecido pelo sucesso de “O Silêncio dos Números Primos”. Se o método científico se revela em suas páginas? Claro que sim. Há rigor na descrição que faz do pensamento de seus homens, que têm um comportamento próprio e verossimilhança até o fim. A apresentação não linear da narrativa nos lembra uma equação, que terá de “fechar” no final.
Em poucas páginas apenas, ele dota um dos personagens de uma linguagem solta, de frases do tamanho da página, e o efeito é de estranhamento. Esse experimento com a forma, porém, está relacionado com o pior legado da guerra, que é a loucura trazida pelas lembranças.
A tradução de Eduardo Brandão mantém registros do italiano, ou seja, não “apaga” totalmente o idioma – o que pode ser interessante.
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