"Roberto Carlos em detalhes" (Ed. Planeta), livro do pesquisador Paulo Cesar de Araújo, que chegou às prateleiras no último fim de semana, traz proximidades com o Rei que vão além do óbvio fato de ser um livro dedicado a ele. No estilo, em alguns momentos de suas 504 páginas a obra perde fôlego e lembra o Roberto conservador dos 80/90 ou o tristonho dos anos 2000. No geral, porém, ela é, da primeira a última frase, carregada de emoção genuinamente popular como o cantor nos 70 e tem a força incendiária e transgressora do jovem artista no início da carreira, de "É proibido fumar" e "Quero que vá tudo pro inferno" (ambas estão na lista de "10 mais do Rei" feita e comentada pelo autor).
Apesar de não ter conseguido entrevistas com o próprio Roberto Carlos, a pesquisa de 15 anos do autor se mostra em cada parágrafo. Dividido em capítulos que relacionam o Rei com a fé, os palcos, a TV, a MPB, o rock, o sexo, a política e as transgressões, o livro é rico em curiosidades para os fãs: a briga que separou Roberto e Erasmo por um longo período; o acidente no qual o artista perdeu uma parte da perna; a primeira vez em que João Gilberto ouviu o Rei, na época em que ele ainda era apontado como imitação do baiano; o início da carreira como cantor mirim numa rádio de Cachoeiro; os bastidores de gravação de seus álbuns; uma homenagem de Caetano e Bethânia a Roberto, abortada violentamente por um intransigente Geraldo Vandré; o "affair" com Sônia Braga e Wanderléa; o nascimento de músicas como "Quero que vá tudo pro inferno" e "Nas curvas da estrada de Santos".
- Não deixei um clássico em paz - comenta Araújo.
Porém, mais que uma coletânea de curiosidades, o livro é uma espécie de continuação de "Eu não sou cachorro não", trabalho anterior de Araújo. Naquela obra, ele reavalia a importânica da chamada "música cafona" dos anos 70, mostrando que artistas como Odair José e Agnaldo Timóteo foram atingidos pela censura da mesma forma, às vezes até mais, que nomes como Chico Buarque e Gilberto Gil.
Agora, contando a história de Roberto Carlos desde a infância até as recentes turnês em transatlânticos, o pesquisador aproveita para refletir sobre música popular, cultura pop e o preconceito social que se revela nas escolhas estéticas.
- Os livros têm uma relação entre si porque tratam do universo da canção popular, que sempre foi visto com desprezo pela elite intelectual - explica o autor. - E eles fazem parte de um mesmo projeto amplo que venho fazendo, sobre a música popular brasileira. Mas é óbvio que a força da obra de Roberto é bem maior que a dos artistas de "Eu não sou cachorro não".
A força da obra do Rei é apenas um dos trunfos de "Roberto Carlos em detalhes". Discussões teóricas à parte, o livro se impõe como o levantamento mais completo e detalhado feito da vida e carreira do artista - o excelente "Como dois e dois são cinco", de Pedro Alexandre Sanches, lançado há alguns anos, era um ensaio interpretativo a partir das canções de Roberto. O projeto surgiu em 1990, quando Araújo ainda era um estudante de jornalismo. Desde então, ele fez pesquisas em jornais e revistas antigos e vasculhou arquivos de rádios e TVs, acervos de colecionadores. Conversou também com "todas as pessoas importantes na vida de Roberto", como ele diz. Menos com o próprio - na introdução do livro, ele relata a dificuldade para se aproximar do artista e chega a contar episódios da difícil relação com a assessoria do cantor.
- Fiz 187 entrevistas, com nomes como Tom Jobim, Caetano, Chico, Carlos Imperial, Tim Maia, Evandro Ribeiro (o primeiro produtor de Roberto), amigos de infância de Cachoeiro de Itapemirim, Djavan, João Gilberto... Mas Roberto em nenhum momento me deu uma entrevista.
Margeando a história do cantor, talvez o melhor do livro esteja no debate, contextualizado em cada época, sobre como a elite intelectual do país vê a música profundamente popular de Roberto. O trabalho cobre desde as fracassadas tentativas do suburbano Roberto entrar para o clube dos bossanovistas da Zona Sul, passando pelo embate entre "iê-iê-iê" e MPB até chegar na unanimidade de hoje. Elis Regina, por exemplo, ferrenha adversária de Roberto nos 60, se curvou à obra do Rei e chegou a gravá-la.
- É curioso, porque Elis fez o caminho inverso de Roberto, pois o início de sua carreira foi com rock, algo meio Celly Campello - lembra o autor. - Mas ela não era a única a atacá-lo. Houve uma época em que todos estavam contra ele. Bethânia, Gil, Caetano...
Araújo também defende a tese de que o Rei conquistou a majestade graças a suas canções.
- A crítica diz que o forte dele é o intérprete, mas eu acredito que é o compositor. Ele atinge todas as classes. Chico e Caetano atingem preferencialmente um segmento, Amado Batista e Daniel chegam a outro. Eventualmente eles rompem essa barreira. Mas Roberto faz isso com uma constância enorme. Ele faz as coisas na medida. Se não tivesse as canções que tem, ele não seria o Rei.
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