Numa entrevista por ocasião do lançamento de “Que Horas Ela Volta?”, Lourenço Mutarelli confessou para o repórter que chorou duas vezes vendo o filme de Anna Muylaert. São cenas com Regina Casé, que faz a doméstica, Val – a da piscina e a da bandeja. “Aquilo é bom demais”, disse o dublê de ator e escritor. As cenas são realmente muito boas. Marcam uma mudança no comportamento de Val, a doméstica que sempre soube seu lugar na casa, mas aí a filha dela, Jessica, veio bagunçar essa moderna versão de “casa grande e senzala”.
Mutarelli tem todo direito de escolher suas cenas favoritas em “Que Horas Ela Volta?”, mas o que o repórter lhe disse é que há uma cena dele com Camila Márdila, que faz Jessica, que consegue ser tão boa quanto – e até melhor. É a do pedido de casamento, quando o dono da casa, do nada, ajoelha-se aos pés de Jessica com o insólito pedido. Afinal, ele é casado e a garota, por mais abusada que seja, não sinalizou nenhuma liberdade nesse sentido.
Lourenço Mutarelli é um ator maravilhoso. Pronto – está escrito, e sacramentado. Alguém (quem?) dirá que ele não é ator de verdade e que faz o mesmo papel, mas então vamos insistir que ninguém faz esse papel – o papel de Mutarelli – melhor que o próprio. Basta lembrar, antes de “Que Horas...?”, de “O Cheiro do Ralo”, de Heitor Dhalia, e “Natimorto”, de Paulo Machline, ambos adaptados de romances de... Mutarelli. O papel no “Cheiro” é pequeno, quase uma participação. Ele interpreta o segurança. Em “Natimorto”, é o protagonista masculino, um escritor caça-talentos que, encantado com uma cantora que não vemos cantar mas sonha ser a melhor do mundo, sugere que ambos vivam isolados num hotel para o resto de suas vidas.
Há nos dois filmes, e livros, um transtorno romântico/obsessivo dos protagonistas, mesmo que um seja Selton Mello (no filme de Dhalia) e o outro, Mutarelli (no de Machline). Uma característica parecida, senão exatamente igual, define a identidade do marido da patroa em “Que Horas...?”. Se ele é o marido da patroa, é o patrão? É o dono da casa, e o dono do dinheiro, mas é um personagem tímido, apagado, que vive recluso em sua casa. Ao repórter, Mutarelli disse que Anna (a diretora Muylaert) incentiva seus atores a criarem histórias para os personagens, inclusive escrevendo cenas imaginárias para expressar a fraqueza dessas figuras.
No caso dele, Mutarelli imaginou que o marido tivesse sofrido algum trauma. Queria ser artista, mas não conseguiu e se acomodou na própria mediocridade, até que a Jessica viesse sacudi-lo com sua independência. A cena do pedido de casamento cria um constrangimento. É muito bem escrita, filmada e interpretada. Anna a filmou no fim de uma jornada e disse a Mutarelli que ia tentar outra versão no dia seguinte. Pediu que ele escrevesse a nova cena. Ele confessou-se incapaz. Improvisou. O coração batia tão alto e forte que a captadora do som reclamou. Mutarelli disse que recebeu muitos convites, principalmente depois de “Natimorto”. Só aceitou o de Anna porque a diretora disse que escreveu para ele. Ainda bem que aceitou. A tristeza (o patetismo?) daquele personagem é das coisas que fazem a diferença no filme.
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