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Manson, “antigaroto-propaganda” do movimento hippie | Reprodução/Life Magazine
Manson, “antigaroto-propaganda” do movimento hippie| Foto: Reprodução/Life Magazine

Uma semana antes do Festival de Woodstock, em 9 de agosto de 1969, um crime bárbaro abalou os Estados Unidos: cinco pessoas foram mortas a facadas na casa da atriz Sharon Tate na área elegante de Benedict Canyon, em Los Angeles. Tate, mulher do cineasta Roman Polanski – que filmava em Londres – estava grávida de oito meses e seu sangue foi usado pelos assassinos para escrever a palavra pigs na porta da casa. !Porcos" era a expressão pejorativa usada pelos grupos radicais para policiais e membros do establishment, o que sugeria um atentado de cunho político. A hipótese foi reforçada no dia seguinte pelo assassinato, também em Los Angeles e também a facadas, do casal Leno e Rosemary La Bianca.

Na parede da sala de estar foram escritos a sangue os slogans Death to Pigs e Rise. ("Mortes aos Porcos" e "Levantem-se"). Na geladeira, também com sangue, estava escrito Helter Skelter, que significa "confusão", "corre-corre", "desordem". Escapou aos investigadores da polícia, pouco versados na cultura do rock, que "Piggies" e "Helter Skelter" eram títulos de duas canções do Álbum Branco dos Beatles. Para uma década acostumada com uma sucessão de assassinatos políticos (John Kennedy, 1963; Malcolm X, 1965; Martin Luther King e Bob Kennedy, 1968), não havia dúvida de que os autores das duas chacinas pertenciam a grupos radicais.

A surpresa foi brutal quando se descobriu, nos primeiros dias de dezembro de 1969, que os crimes tinham sido praticados por um bando de hippies fanatizados por Charles Manson, um delinquente que passara a maior parte da vida em reformatórios e prisões e encontrara entre as "crianças da flor" um solo fértil para suas pregações demoníacas. Misturando Beatles e Bíblia em sua mente distorcida, Manson oferecia uma versão altamente pessoal do Apocalipse. Escolheu como "ferramenta" pastoral o Álbum Branco dos Beatles, lançado em novembro de 1968. Apesar de racista, Manson achava que os negros tinham sido oprimidos por tanto tempo que era chegada sua hora de mandar no mundo. Invocava um trecho de "Blackbird", anunciando a revolução: "You were only waiting for this moment to arise/Vocês só esperavam esse momento para se levantar." Encontrava ainda outras mensagens ocultas nas letras dos Beatles que, segundo ele, conclamavam os negros para a grande rebelião, como na letra de "Helter Skelter".

Além dos ruídos de metralhadoras, de pessoas gritando, do ronco dos porcos estrebuchando e dos acordes soturnos da estranha colagem sonora que é "Revolution #9", há o fato de que, ao contrário da recusa em Revolution #1, a letra de "Revolution #9" diz claramente: "Podem contar comigo". O sombrio refrão "number 9, number 9, number 9" é interpretado por Manson como uma referência explícita à Nona Revelação da Bíblia (revelação = revolução), falando de uma verdadeira batalha de Armageddon entre brancos e negros. Manson acreditava que, com uma série de assassinatos brutais de brancos ricos, ele faria a opinião pública acreditar que as chacinas eram obras de negros e desencadearia uma guerra racial generalizada.

Stones

Na mesma ocasião, também na Califórnia, os Rolling Stones, enfrentavam o seu inferno astral, em 6 de dezembro, no Festival de Rock de Altamont, que muitos chamaram de Woodstock do Oeste. Programado à última hora para uma pista de corridas de automóveis desativada, a 60 quilômetros de São Francisco, reuniu, na ordem de apresentação, os grupos Santana, Jefferson Airplane, Flying Burrito Brothers, Crosby, Stills, Nash & Young e, no final apoteótico, os Rolling Stones.

Mesmo com as sucessivas trocas de local, Altamont atraiu 300 mil pessoas. Por falta de tempo, não foram organizados os serviços básicos para um acontecimento daquele porte, que se transformou num pesadelo de drogas, sujeira, doenças e violência, com quatro mortes – uma por afogamento, duas por atropelamento e, a mais dramática delas, um assassinato a poucos metros do palco durante o show dos Rolling Stones.

Um jovem negro de 18 anos, Meredith Hunter, aparentemente drogado, apontou uma arma de cano longo para o palco. Um membro do grupo Hell’s Angels, atacou o rapaz a facadas e outros o golpearam com tacos de bilhar. Extra-oficialmente, os Hell’s Angels teriam sido contratados pelos Rolling Stones como "seguranças" do evento, em troca de 500 dólares de cerveja. A autópsia provou que Hunter estava dopado com meta-anfetaminas; ele apontou a arma para o palco movido por ciúmes de Mick Jagger, por quem sua namorada se dissera apaixonada.

A cena do assassinato foi flagrada pelas câmaras de filmagem do documentário Gimme Shelter, dos irmãos Maysles, e ajudou o filme a se tornar um dos campeões de bilheteria em 1970. Os crimes da Família Manson e a violência de Altamont puseram um fim aos sonhos de inocência hippie. A Nação de Woodstock não conseguiu sobreviver àquele verão ensolarado de 1969. (RM)

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