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Não é novidade que desde "Mechanical Animals", em que aparecia como uma criatura andrógina à la David Bowie, de cabelos vermelhos e implante de seios, Marilyn Manson vem perdendo o seu poder de chocar. Como bem disse o crítico Jon Pareles, do jornal "The New York Times", em tempos de violência gráfica extrema nos videogames e uma guerra sangrenta acontecendo no Iraque, o roqueiro americano virou só mais um na galeria de aberrações da vida real.

Quase quarentão, o auto-denominado "antichrist superstar" decidiu olhar um pouco mais para o próprio umbigo em "Eat me, drink me" e fazer um disco de... amor. Gótico, desiludido, é claro, mas ainda assim de amor. O dado concreto que contribui para a guinada foi o fato de ter levado um pé na bunda de sua ex-mulher, a stripper Dita Von Teese.

Fofocas na internet diziam que o cantor chegou a pensar em suicídio. Em vez disso, trancou-se em sua casa em Los Angeles com Tim Skold, guitarrista da banda de industrial alemã KMFDM, e fez um disco recheado de ressentimento: "amor é fogo, que queima tudo o que vê", canta em "Just a car crash away" - evocando Camões, mesmo sem saber. Ou, em "They say hell's not hot", "eu me mato aos pouquinhos a cada relacionamento / não é amor, só mais um funeral". Discurso que é até parecido com o dos emos, mas, no lugar das lágrimas, há sangue, mutilações, facas de açougueiro e toda a sorte de clichês do universo de Manson.

A desilusão e a preguiça de viver expressa nas letras - "If I was your vampire", faixa de abertura, começa com algo como "seis horas, uma manhã de Natal, não há sombras nem reflexos no espelho..." - acabam por contaminar também a estrutura e a pegada de boa parte das músicas.

Melodias e riffs de guitarra pouco criativos, uma bateria que soa como se fosse a mesma ao longo de todo o disco por vezes fazem esquecer a energia de um sujeito que já protagonizou rolos compressores sonoros como "The beautiful people", "Irresponsible hate anthem" e outras. Os solos virtuosos - e absolutamente desnecessários - de Skold aumentam ainda mais a sensação de deslocamento.

Mas, por incrível que pareça, é quando Manson ousa tentar sair do casulo e soar mais pop (um palavrão para boa parte de seus fãs) que "Eat me, drink me" tem seus melhores momentos. Em "Heart-shaped glasses", um rockinho à Strokes com o "polêmico" clipe em que Manson faz sexo supostamente real com sua nova namorada, a lindinha Evan Rachel Wood, a fossa do disco dá lugar ao tesão e ao tom mais confiante: "Não parta meu coração ou eu vou partir os seus óculos em forma de coração", canta no vídeo, vestido como um crooner dark, para depois emendar um versinho que poderia estar em qualquer canção dos Beatles - "pequena, pequena, você deveria fechar os olhos, esta tristeza está me deixando alto".

Quem sabe então, se o novo relacionamento for duradouro o suficiente, não teremos um próximo disco mais "iluminado". Mesmo que seja pelo fogo do inferno, como Marilyn Manson faria questão de apontar.

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