
O 19.º Festival de Curitiba se fez de momentos. Uma panorâmica pela programação revela mais produções medianas do que a Mostra Contemporânea deveria comportar. No entanto, em determinados trabalhos encontrou-se um nível de qualidade recompensador, por ser capaz de instigar realizadores e público a refletir sobre o teatro que desejam ver e fazer, para além dos dias de março.
O mais emblemático dos exemplos é In on It, da Cia. dos Atores. Em apenas duas apresentações, a montagem dirigida por Enrique Diaz valorizando ao máximo os movimentos entre ficção e real propostos no texto do dramaturgo canadense Daniel McIvor planta um interesse renovador sobre as potencialidades de um teatro contemporâneo. Feito em concordância com a expectativa de compensação emocional do público.
Vida, da Companhia Brasileira de Teatro, é outra a desprender-se do drama em favor do jogo teatral por maior importância que dê ao texto, à palavra trabalhada na tensão do instante do diálogo. Os atores levam mais de si à cena do que apenas a construção fechada de personagens, e as demais texturas da composição criativa, em especial a luz e a cenografia, não se submetem ao texto.
O cenário ganha autonomia também em Memória da Cana, oferecendo uma imersão sensorial na mais controversa das tragédias rodrigueanas. Armou-se no terceiro andar da Arena da Baixada uma casa de múltiplos cômodos separados por véus, dentro dos quais os espectadores se dividiam para assistir à encenação. Ao caírem os tecidos, a cana-de-açúcar cerca o ambiente com o odor doce e o assovio do vento. A ambiência altera o contato com a família desvairada que se perde em incestos, representada intensamente pelo grupo Os Fofos Encenam.
Ainda em Cinema, o ensaio aberto realizado pela Sutil Companhia, a cenografia e a sonoplastia são os elementos essenciais de um espetáculo que propõe uma outra maneira de portar-se como espectador, atenta ao ato de ver. E em Travesties, cenografia e luz dão grandiosidade a um texto denso de Tom Stoppard, que coube aos atores da Ópera Seca desmitificar pelo humor.
Houve espaço para produções que seguiam moldes mais tradicionais, nesse caso, sobressaltando o talento de intérpretes como Beth Goulart, aplaudida com entusiamos ao fim do monólogo Simplesmente Eu, Clarice Lispector; e Renata Sorrah, indicada como o ponto alto de Macbeth.
Quanto aos grupos mais jovens, mostraram trabalhos que ainda os enquadram na categoria de promissores, como Rebu, O Ruído Branco da Palavra Noite e Escuro.
Dias de desordem
O Festival de Curitiba se tornou um evento de tais proporções que não se tem conseguido dar conta de organizá-lo. Este ano, choveram reclamações por parte do público e dos artistas.
Algumas delas ultrapassam a alçada do evento. Ao fim da primeira apresentação de In on It no Guairinha, o ator Emílio de Mello falou, em um discurso inflamado, do esforço feito para se apresentarem num local "que cheira a mofo, é cheio de ácaros e não tem ar-condicionado". As condições no Mini-Guaíra não eram melhores: nem papel havia à disposição das companhias. A Ópera de Arame e o Teatro Positivo mais uma vez foram alvo de críticas quanto à acústica, em apresentações de A Loba de Ray-ban e Till.
O festival, contudo, responde por uma série de contratempos. Por ser editado com muita antecedência, o guia muitas vezes presta um desserviço ao espectador, informando horários e endereços errados. Assim, perdeu a última apresentação de Cachorro!, às 20 horas, quem confiou no programa impresso, que a anunciava para as 21 horas.
O endereço trocado do Teuni rendeu dores de cabeça às companhias e ao público. E longos atrasos irritaram espectadores de Música para Ninar Dinossauros (um recorde: começou 2h42 minutos depois do horário), O Papa e a Bruxa, Exotique e As Meninas.







