Para celebrar seus 50 anos de cinema, o diretor francês Claude Lelouch resolveu fazer um filme que fosse ao mesmo tempo autobiográfico e uma síntese de sua extensa obra. Nesse sentido, Esses Amores, em exibição no Unibanco Arteplex desde a última sexta-feira, é um projeto bem sucedido.
Aos moldes de um de seus longas-metragens mais populares, Retratos da Vida (1981), que ficou vários meses em cartaz em Curitiba na década de 1980, Esses Amores é um melodrama no mais preciso sentido da definição do gênero: a trama caudalosa, que atravessa décadas e se mostra capaz de arrancar lágrimas do público em vários momentos, é pautada pela exuberante trilha sonora, assinada pelo veterano Francis Lai (premiado com o Oscar por Love Story Uma História de Amor), colaborador de Lelouch há décadas.
A heroína do enredo chama-se Ilva (Audrey Dana), uma jovem de origem italiana criada em Paris a quem tudo de bom e de ruim acontece ao longo das duas horas de projeção do filme. Ela é filha de uma atriz pornô que encontra na França o homem de sua vida, o projecionista Maurice, vivido por Dominique Pinon, ator-fetiche de Jean-Pierre Jeunet (de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain).
Para salvar Maurice, preso pelos nazistas durante a ocupação, Ilva não vai medir esforços e, assim, mudará para sempre seu destino. Na tentativa de libertar o padrasto, acusado de participar da Resistência, a jovem acaba se envolvendo com Horst (Samuel Labarthe), um oficial alemão com quem viverá uma breve, porém intensa paixão. A relação revela muito sobre a natureza vulcânica da personagem.
Impulsiva, Ilva é lanterninha do cinema onde Maurice trabalha e é lá que conhece Coco, um garoto judeu que ela esconde no escuro da sala de projeção durante o dia para evitar que o pior aconteça e ele seja enviado a um campo de concentração. A jornada desse menino, que sobreviverá à Segunda Guerra e se tornará cineasta, é o elemento autobiográfico do filme Lelouch viveu a mesma situação na infância.
Paralelamente à história de Ilva, Esses Amores também narra o triste percurso de Simon (Laurent Couson), jovem pianista de origem judaica enviado com a mãe a um campo de extermínio nazista, de onde apenas sai vivo graças a sua música: ele compra sua vida com horas ao piano, a dedilhar obras de Rachmaninoff, um dos compositores favoritos dos comandantes alemães, apesar de russo.
No melhor estilo Lelouch, os caminhos de Ilva e Simon, que parecem nada ter a ver um com o outro, vão se cruzar depois de ambos terem passado por poucas e boas. Antes, ela vai se apaixonar, simultaneamente, por dois soldados americanos, em um trágico triângulo amoroso. Ele, movido pela culpa de ter sobrevivido, acabará desistindo da música e se tornando advogado criminalista.
Citando a si próprio, ao ponto de inserir na narrativa de Esses Amores uma sequência de Retratos da Vida, do qual o filme é uma obra quase gêmea, Lelouch faz uma celebração ao cinema e ao destino.
Do diretor mais comedido de Um Homem e Uma Mulher (1966), pelo qual ganhou dois Oscars (de melhor filme estrangeiro e roteiro original), resta pouco. Em vez do estilo cool, influenciado pelas ondas da Nouvelle Vague, Lelouch opta pelo arrebatamento do melodrama, que se por vezes flerta com o exagero e o inverossímil, acaba não decepcionando seus fãs.