A Festa da Insignificância
Milan Kundera. Cia. das Letras. 134 págs. R$ 25. Romance.
Há livros que intimidam pelos autores que os escreveram. Milan Kundera acrescenta o pensamento filosófico à sua ficção, e apesar disso, ou talvez por isso, caiu nas graças do público brasileiro e internacional nos anos 1980 com A Insustentável Leveza do Ser.
A Festa da Insignificância, lançado no Brasil em meados do ano passado após um jejum de 14 anos em que o tcheco naturalizado francês nada publicou, pode ser encarado como um livro raso, quase "insignificante" perto daquele. É para se ler de uma sentada são 134 páginas na edição de luxo da Companhia das Letras.
Aí mora o problema, caso leia-se rapidamente com uma recepção realista. Seria como passear por Paris trancado num táxi e sair dele achando que a cidade não é tão encantadora assim. Corre-se o risco de desperdiçar a experiência.
Dessa vez a filosofia impregna a visão de mundo e a própria prosa em aparente leveza. Há momentos, por exemplo, de uma descrição perspicaz das aglomerações humanas (Kundera vive recluso e não dá entrevistas). Como na fila de uma exposição de Chagall próximo ao Jardim de Luxemburgo, onde um dos personagens imagina as salas lotadas em que os visitantes cobrirão as obras com "seus corpos e seus comentários". Ou na festa de D'Ardelo, onde uma longilínea celebridade chega com seu jeito blasé e logo enche a boca de canapés, os quais não consegue terminar de mastigar e engolir devido ao assédio ao seu redor.
Foi dito do livro que ele "apresenta cinco amigos levando uma vida de banalidades". Não concordo. Se a aparente desconexão entre os capítulos minúsculos (duas páginas) sugere encontros efêmeros entre os personagens, sem maiores consequências, Kundera nos conduz no olhar de narrador onisciente por momentos de angústia, crise de identidade e iluminações de suas criaturas, que se provarão contaminadas por sua própria imaginação: ficção dentro da ficção.
A manobra fica mais evidente quando surge Stálin e seus bajuladores, numa fantasia que acompanha o livro até o fim.
A obra poderá soar enigmático demais: é preciso atenção redobrada, inversamente proporcional à dimensão dos parágrafos. Surgem entrelinhas freudianas, quando dois dos amigos pensam em suas mães. Súbito, cria-se espaço para um thriller de assassinato em meio à narrativa.
A morte, a aposentadoria, a doença, pensamentos que se tornam frequentes na idade avançada o autor tem 85 anos rondam o texto falsamente leve. Resta recusar a sugestão de que somos marionetes sem muita importância.
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