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Manoel é feito de Barros e nos molda a cada verso

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Morreu por volta das 8h30 (horário local) desta quinta-feira (13) o poeta mato-grossense Manoel de Barros. Ele tinha 97 anos e estava internado em um hospital de Campo Grande.

Barros estava há mais de uma semana na UTI do hospital Procon e havia passado por uma cirurgia de desobstrução do intestino.Segundo boletim divulgado nesta segunda-feira (11), no entanto, o poeta estava "consciente, orientado, mantendo sinais vitais estáveis".O velório será realizado no cemitério Parque das Primaveras, em Campo Grande, mas ainda não há data definida e tampouco informações sobre o enterro.Nascido em 1916 em Cuiabá, Manoel de Barros escreveu 18 livros de poesia, além de livros infantis e relatos autobiográficos. Recebeu diversos prêmios literários, entre os quais dois Jabutis -em 1989, com "O Guardador de Águas", e em 2002, com "O Fazedor do Amanhecer".

Manoel de Barros morava em Campo Grande com a mulher, Stella, e a filha, Martha. Seus dois filhos homens, João Wenceslau e Pedro, morreram em 2007 e 2013, respectivamente.

O poeta das profundidades mínimas

Um poeta que viveu para fazer de sua vida um atestado da riqueza das pequenas fatias do cotidiano. Escreveu sobre pássaros, formigas, "acontecências" da infância, sustos semânticos, desinventos, casas do interior, como se cada momento fulgurasse na existência para ser resgatado por seu lirismo explorador, um documentarista poeta.

Ao longo de seus quase cem anos – como se sua vida fosse uma árvore de dinastias ancestrais –, o poeta da luz e das diversas matizes do pôr-do-sol escreveu 18 livros, sendo um deles a reunião de todos os seus trabalhos, uma espécie de tratado para melhor ler e viver o mundo. Por onde andou, literariamente, desconstruiu sentidos e formou novas combinações. "A expressão reta não sonha", dizia.

Grande apanhado de uma certa forma de significar a realidade a partir de sua investigação, "Poesias Completas", de 2010, reúne de "Poemas Concebidos Sem Pecado", de 1937, ao "Menino do Mato", de 2010. Ao longo de quase 500 páginas entrega um panorama afetivo suficiente (e expandido) capaz de colocá-lo, sem o risco da cegueira da emoção, ao lado de grandes nomes da poesia brasileira do século 20, como Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Mello Neto e Ferreira Gullar.

Mas é injusto situar Manoel de Barros de uma forma tão fechada, apesar de canônica. Capaz de dizer coisas como "Eu conversava bobagens profundas com os sapos, com as águas e com as árvores. Meu avô abastecia a solidão. A natureza avançava nas minhas palavras tipo assim: O dia está frondoso em borboletas. No amanhecer o sol põe glórias no meu olho", ele fazia das miudezas como quem faz da palavra uma pequena evocação da existência. Voz que se alimentou do sonho e da raiz dos sentidos – como se Magritte encontrasse Rubem Braga para elaborar um concerto – seu alicerce de imagens fugia de clichês e de lugares comuns. Foi um enquadramento de assombros dotado de singularidade

Nascido Manoel Wenceslau Leite de Barros, em Cuiabá (MT) no Beco da Marinha, beira do Rio Cuiabá, em 19 de dezembro de 1916, Manoel vivia em Campo Grande, com sua fazenda e seus imensos silêncios.

Em "Didática da Invenção", composição do Livro das Ignorãças, de 1994, uma definição serve de relicário e epicentro de um certo modo de observar: "Para entrar em estado de árvore é preciso/ partir de um torpor animal de lagarto às/ 3 horas da tarde, no mês de agosto". A morte de Manoel de Barros entristece as imensidões e nos priva de um escritor vigoroso, produtor constante de alumbramentos, aquele que disse ser o sapo um pedaço de chão que pula.

ObraVeja abaixo sua obra completa, publicada pela editora Leya:

- "Poemas Concebidos Sem Pecado" (1937)- "Face Imóvel" (1942)- "Poesias" (1956)- "Compêndio para Uso dos Pássaros" (1960)- "Gramática Expositiva do Chão" (1966)- "Matéria de Poesia" (1974)- "Arranjos para Assobio" (1980)- "Livro de Pré-Coisas" (1985)- "O Guardador de Águas" (1989)- "Concerto a Céu Aberto para Solos de Ave" (1991)- "O Livro das Ignorãças" (1993)- "Livro Sobre Nada" (1996)- "Retrato do Artista Quando Coisa" (1998)- "Ensaios Fotográficos" (2000)- "Exercícios de Ser Criança" (2000)- "Tratado Geral das Grandezas do Ínfimo" (2001)- "O Fazedor do Amanhecer" (2001)- "Cantigas para um Passarinho à Toa" (2003)- "Poemas Rupestres" (2004)- "Poeminha em Língua de Brincar" (2007)- "Menino do Mato" (2010)

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