Há tempos um simples filme não causava tanta confusão. Memórias de uma Gueixa, indicado a seis Oscars e em cartaz a partir de hoje no país, parece ser uma inesgotável fonte de polêmica. A começar por sua própria produção, que levou anos para sair do papel e passou pelas mãos de diversos diretores – ficando, por fim, a cargo de Rob Marshall, conhecido pelo musical Chicago. Mas o pior viria mais tarde, com direito até a crise diplomática internacional.

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Baseado no best seller do escritor Arthur Golden, o longa narra a trajetória de Sayuri (Ziyi Zhang), separada dos pais ainda na infância e levada para a cidade Kyoto, uma das maiores do Japão, nos idos de 1930. Dona de uma beleza rara, marcada por misteriosos olhos azuis, a jovem é vendida para uma casa de gueixas – as folclóricas cortesãs nipônicas, hábeis na arte de entreter os homens com música, dança e, eventualmente, sexo.

Ainda na infância, Sayuri conhece um executivo, conhecido como "Presidente" (Ken Watanabe), por quem se apaixona e jura amor eterno. Enquanto isso, é treinada para ser gueixa pela experiente Mameha (Michelle Yeoh) e sofre todo tipo de humilhação pelas mãos de uma colega mais velha, Hatsumomo (Gong Li). Sofrimento, aliás, é uma constante para a jovem protagonista, principalmente no tocante aos "assuntos do coração". A história se arrasta e atravessa décadas, sempre com encontros e desencontros entre a protagonista e sua grande paixão.

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Com produção grandiosa e tentativa de reconstituir o Japão da primeira metade do século 20, Memórias de uma Gueixa concorre ao Oscar apenas em categorias técnicas (leia quadro). O apelo estético, no entanto, não foi suficiente para salvar o filme de uma inesperada controvérsia: japoneses e chineses, cujos mercados seriam potencialmente favoráveis ao longa, rejeitaram sumariamente a adaptação de Rob Marshall.

Os nipônicos não engoliram o fato de o elenco feminino contar apenas com atrizes chinesas – e, o mais desagrádavel, interpretando personagens que fazem parte da tradição e do imaginário da Terra do Sol Nascente. Na China, o buraco foi ainda mais embaixo. A Administração Estatal de Rádio, Cinema e Televisão, órgão responsável pela aprovação dos conteúdos exibidos no país, estuda a proibição do filme nas salas de cinema. Tudo porque é uma "desonra" que chinesas legítimas representem "prostitutas japonesas" na tela. Marshall não imaginava, mas acendeu a faísca de uma espécie de versão cultural das sangrentas guerras sino-japonesas, aumentando um pouco mais a rivalidade entre as duas nações.

Por trás de tanta polêmica, sobra um dramalhão romântico de época, embalado por figurinos luxuosos e uma trilha sonora convincente (assinada pelo americano John Williams, porém livre de pasteurizações). É o filme "bonito" do Oscar deste ano, e só isso. Melhor deixar a discussão para chineses e japoneses, porque, para os ocidentais, Memórias de uma Gueixa é muito barulho por nada. GG1/2