O Karatê Kid (confira trailer, fotos e horários das sessões) versão 2010, de Harald Zwart, que estreia hoje nos cinemas, será visto de duas maneiras distintas: com uma certa dose de rabugice pelos "tiozões" (eu inclusive) que foram a nocaute com a primeira versão, estrelada por Ralph Macchio e Pat Morita e dirigida por John Avildsen em 1984; e, creio, com entusiasmo pela molecada que não faz ideia de quem foi Daniel Larusso ou o impacto que ele teve na cultura pop do século 20.
Para começo de conversa, não existe Daniel-san no remake. O herói, defendido com carisma e competência por Jaden Smith, filho do Will, se chama Dre isso mesmo, como o rapper Dr. Dre. E é bem mais menino Ralph Macchio tinha 23 anos incompletos quando estrelou o primeiro filme, mas o seu personagem era um adolescente por volta dos 15; Jaden Smith completou 12 anos em junho, a mesma idade do protagonista da versão atual.
Não parece tanta diferença, mas é. E resulta numa série de implicações. Por exemplo, no romance: uma coisa é o encontro amoroso de Ralph Macchio e Elizabeth Shue, outro é o inverossímil namorico entre o pirralho Jaden e Wenwen Han que tem 16 anos e faz a chinesinha Meiying.
Outro efeito colateral da pouca idade do filho de Will Smith é a "suavização" do filme. Explico: o pequeno Dre apanha bastante ao longo da história principalmente do antagonista, o garoto casca-grossa Cheng (Zhenwei Wang) , mas o máximo que acontece com ele é um olho roxo. Seja na surra que leva ao flertar com Meiying, seja nas duras lutas do torneio, ele não derrama uma única gota de sangue. E a explicação parece óbvia: se houvesse sangue, seria preciso aumentar a classificação indicativa e o filme não poderia ser liberado para todos os públicos.
Uma terceira consequência é mais prosaica, e diz respeito ao aprendizado do menino nas artes marciais: como não seria politicamente correto obrigar um garoto de 12 anos a "pintar a cerca" ou "lixar o assoalho" (a forma como o senhor Miyagi de Pat Morita ensinava golpes de caratê a Daniel Larusso), o mestre da nova versão, interpretado por Jackie Chan, transmite seus ensinamentos forçando o menino a tirar, pendurar e vestir a jaqueta milhares de vezes. A maneira como ele associa essa ação a golpes de kung fu é um tremendo mistério.
Os mais puristas também vão implicar com isso o fato de o novo Karatê Kid ter trocado o caratê pelo kung fu, e a ação se passar na China. Como se sabe, o caratê é uma arte marcial japonesa. Por outro lado, ao contrário do que se temia, as cenas de luta não são excessivamente coreografadas nem abusam dos cabos de aço e cromaquis. Com exceção do golpe final, aquele em que Dre, mesmo com a perna machucada, derrota Cheng: no lugar do imortal "golpe da garça" de Daniel Larusso, Harald Zwart optou por um "looping" de costas tão irreal que quase dá para ver os cabos de aço que sustentam Jaden Smith.
Mas o maior pecado do Karatê Kid 2010 é não ter encontrado um substituto à altura de Pat Morita, homenageado com uma pequena citação da famosa cena em que captura uma mosca usando hashis. Jackie Chan anda curvado demais para a idade que tem tanto a dele quanto a do personagem, senhor Han. Também não convence na nuance trágica de Han, que perdeu a mulher e o filho em um acidente de carro. Pior: sequer consegue emprestar seu talento cômico para o personagem nos momentos mais leves. Para quem viu o primeiro filme, dá uma saudade enorme dos "tá-tá-tá-tá" do senhor Miyagi para Daniel-san. GG1/2
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