Alternativo
Sessão Vitrine abre espaço para títulos independentes
Silvia Cruz já conseguiu estender seu projeto a 17 cidadesMarcos Cordiolli, produtor do longa-metragem paranaense O Sal da Terra (2008), dirigido por Elói Pires Ferreira, conhece na pele a frustração de dedicar anos à realização de um filme para vê-lo ficar restrito a festivais, exibições em espaços alternativos e a um circuito de salas de exibição comerciais muito pequeno.
Consciente das inúmeras limitações que o cinema brasileiro independente e mais autoral enfrenta, a paulista Sílvia Cruz, dona da distribuidora Vitrine, buscou um caminho original para levar filmes brasileiros do chamado "cinema autoral" a um número maior e mais constante de espectadores.
O projeto Sessão Vitrine tem como meta exibir programações compostas por um curta e um longa-metragem por uma semana em uma sessão diária. Na sua primeira edição, já encerrada, conseguiu levar cinco dobradinhas dessas a sete cidades: São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Recife, Vitória, Salvador e Curitiba onde as exibições foram realizadas na Cinemateca. As exibições da etapa de estreia somaram em torno de 4,2 mil espectadores. Parece pouco, mas não é, diz Sílvia.
Na segunda edição do Sessão Vitrine, já em curso e agora com sete novos longas-metragens, sempre acompanhados por curtas, acrescentou mais dez capitais ao circuito: Belém, Belo Horizonte, Brasília, Campo Grande, Florianópolis, Fortaleza, Goiânia, João Pessoa, Maceió, São Luiz. (PC)
Serviço:
Conheça os títulos e a programação completa do Sessão Vitrine no site.
Na última sexta-feira, chegou às salas de exibição de todo o país a comédia de ficção científica O Homem do Futuro, novo longa-metragem do diretor carioca Claudio Torres (de A Mulher Invisível), estrelado por Wagner Moura, Alinne Moraes e Gabriel Braga Nunes. O filme, uma mistura de comédia romântica e ficção científica sobre um cientista que volta ao passado na tentativa de mudar sua vida desastrosa, tem vários dos atributos necessários para que a produção se torne o que vem sendo chamado de "blockbuster brasileiro". Ou seja, um grande sucesso de bilheteria: entra em cartaz em amplo circuito em todo o território nacional, amparado por uma sólida campanha de divulgação; reúne um elenco de astros televisivos, com forte apelo popular; e oferece uma trama palatável, moldada ao gosto médio de espectadores que vão ao cinema em busca, sobretudo, de bom entretenimento. Um detalhe muito importante: todos têm coprodução da Globo Filmes, braço cinematográfico do maior grupo de comunicação do país.
Basta conferir a lista dos filmes nacionais mais vistos em 2011 (veja quadro no final da página), para perceber que os títulos que ultrapassaram a marca de um milhão de espectadores reúnem os ingredientes e as características listados acima, independentemente de terem recebido boas críticas ou de terem sido destruídos pela imprensa.
De Pernas para o Ar, filme de Roberto Santucci que estreou no dia 31 de dezembro de 2010, é, em certa medida, um caso exemplar. Comédia rasgada e sem maiores pretensões estéticas, o filme, que traz a atriz cômica Ingrid Guimarães no papel de uma mulher recém-separada cuja vida está indo para o ralo, mas consegue dar a volta por cima abrindo uma sex shop, levou 3,56 milhões de espectadores aos cinemas, superando, por exemplo, "fenômenos" de popularidade como Chico Xavier e Cidade de Deus.
O longa de Santucci é a maior bilheteria nacional deste ano e se tornou o oitavo título mais visto no país desde 1995, quando se inicia a chamada Retomada da produção do cinema brasileiro. É seguido no ranking de 2011 por Cilada.com, outra comédia de contornos sexuais, derivativa do programa que seu astro, Bruno Mazzeo, apresentava no canal pago Multishow. Em seguida, vêm o drama sensual Bruna Surfistinha (de Marcos Baldini), o policial Assalto ao Banco Central (Marcos Paulo) e a comédia romântica Qualquer Gato Vira-lata (Tomás Portella).
Globo Filmes
A resposta mais simplista para a pergunta "Por que determinado tipo de cinema faz tanto sucesso no Brasil?" é atribuir a popularidade à evidente conexão que os filmes têm com a linguagem televisiva, muitas vezes parecendo se tratar de produções realizadas para a exibição na telinha.
A explicação, se não é única nem absoluta, tem seu fundo de verdade. Assalto ao Banco Central, quarto longa mais visto neste ano, é do veterano ator e diretor de novelas Marcos Paulo, que só agora fez sua estreia em cinema. Entre os dez títulos mais vistos no pais desde 1995, três são assinados por Daniel Filho, cuja carreira está muito conectada à teledramaturgia: Se Eu Fosse Você 1 e 2 e Chico Xavier.
Mas não é apenas à linguagem televisiva acessível, direta e popular que os blockbusters nacionais devem todo o seu êxito. Esse vínculo tem caráter mais complexo. Tanto os filmes mais vistos desde 1995 quanto a maioria dos campeões de 2011 (a exceção é VIPs) têm a Globo Filmes entre seus coprodutores.
Cross media
Pedro Butcher, crítico e editor do portal da empresa Filme B, referência nacional na cobertura extensiva do mercado cinematográfico brasileiro, explica que a Globo Filmes entra nos projetos não com dinheiro, mas com mídia, com estratégias de divulgação que se mostram muito certeiras no mercado brasileiro.
Muito mais do que a mera inserção de comerciais e trailers nos veículos das Organizações Globo, as ações de cross media se mostram muito eficazes, afirma Butcher. Esse merchandising assume múltiplas facetas.
"São os personagens de uma novela que aparecem dizendo que vão assistir ou que acabaram de ver [e adoraram] os filmes; o ator ou o diretor que aparece cozinhando no programa da Ana Maria Braga", exemplifica a paranaense Claudia da Natividade, produtora dos filmes Estômago (de Marcos Jorge) e Corpos Celestes (codirigido por Jorge e Fernando Severo), hoje radicada em São Paulo.
Para ela, o êxito comercial de um longa-metragem no Brasil depende, fundamentalmente, dos recursos destinados à copiagem e à divulgação dos títulos. A produtora calcula que, além do valor orçamentário da produção de um longa, sejam necessários entre R$ 1,5 milhão e R$ 2,5 milhões a serem empregados no lançamento, para fazer com que o público não apenas saiba que o filme está em cartaz, mas que tenha o desejo de assisti-lo. E, para isso, é necessário que os títulos tenham boa distribuição, seja por meio de uma empresa nacional independente ou de uma major internacional (Warner, Sony, Fox, Paramount, Universal, Disney). A Petrobras e a Agência Nacional de Cinema (Ancine) mantêm editais de fomento à difusão e à distribuição de longas-metragens, mas que não dão conta dessa nova realidade de mercado.
O cineasta Fernando Severo, também diretor do Museu da Imagem e do Som (MIS), diz que a área da distribuição está, em grande parte, nas mãos dessas majors, que não investem quase nada em filmes que não contem com as leis de incentivo (inclusive com recursos previstos para distribuição e lançamento), e que já tenham seus custos de produção em grande parte cobertos, mas ficam com a parte do leão da renda. "Os exibidores, por sua vez, são acomodados e só querem saber de blockbusters." Nacionais ou não.
Cinema autoral
Se há um número considerável de filmes de perfil mais assumidamente comercial que alcança bom desempenho no circuito exibidor, a maior parte dos títulos nacionais que consegue de alguma forma estrear entre 70 e 90 a cada ano é vista por um número pouco expressivo de espectadores fora de mostras e festivais.
O jornalista Marcelo Miranda, crítico do jornal O Tempo, de Belo Horizonte, diz que, no mercado brasileiro, os filmes nacionais ou fazem milhões de espectadores ou ficam numa margem ínfima, às vezes abaixo dos 50 mil pagantes. "Inexiste, hoje, o chamado filme médio, aquele que variaria entre 100 mil e 500 mil espectadores."
Para Miranda, as explicações para esse quadro são tão incertas quanto variadas: o excesso de grandes produções (muitas com a marca Globo Filmes) e o pouco espaço para muitos títulos menos afeitos ao mercado são algumas delas. "Num mercado saturado de filmes (e também de produções brasileiras), a briga pela fatia de público acaba descambando puramente para um caráter comercial", diz o crítico mineiro.
Pedro Butcher, do portal Filme B, não discorda dessa lógica, mas lembra que essa tendência de polarização do mercado exibidor não é "privilégio" brasileiro. Com o desaparecimento dos cinemas de rua mundo afora e o aumento do número de multiplexes, o espaço para as cinematografias nacionais e filmes de arte, frente às produções comerciais e hollywoodianas, tem sido reduzido de forma acelerada, até mesmo em países como a França, que mantém uma política de proteção das salas "alternativas".
Para se ter ideia, na última semana, na lista dos dez longas mais vistos no mercado francês, encabeçada por O Planeta dos Macacos: a Origem (também líder no Brasil), há apenas dois filmes não norte-americanos: a produção local Tu Seras Mon Fils (de Gilles Legrand), em quinto lugar, e o espanhol A Pele Que Habito (de Pedro Almodóvar), em oitavo.
Relação com o público
Em meio a esse quadro complexo, no qual alguns títulos triunfam enquanto a maioria fica à margem do mercado exibidor, há uma boa notícia: a inquestionável reaproximação do público com a produção brasileira. "O sucesso desses filmes nacionais, por mais que se faça restrição à sua qualidade artística, acaba com a falsa ideia de que o público não quer saber de cinema brasileiro, como apregoam distribuidores e exibidores", afirma Severo.
Marcelo Miranda completa, dizendo que esse fenômeno parece inegável. "Os números comprovam: filmes brasileiros estão sendo vistos por milhões." O crítico ressalta, no entanto: "Se olharmos para além dos números absolutos, será fácil perceber: muito público para poucos filmes, sendo que, desses poucos títulos, quase todos (se não todos) são vinculados à Globo Filmes, o que acaba tornando o cinema um adendo da televisão. E isso, a mim, é bastante assustador".
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