O equipamento desfalcou o duo no Teatro do Sesi Cietep| Foto: Gelson Bampi/Divulgação

O improviso é uma das marcas do jogo de cena do duo paulistano Os Mulheres Negras, de André Abujamra e Mauricio Pereira, que fez uma divertida apresentação na noite do último domingo. O público, que encheu cerca de metade do Teatro do Sesi, no Cietep, não poderia esperar algo diferente de um show da dupla formada em 1985 – afinal, o componente teatral é parte essencial d’Os Mulheres Negras, que voltou à ativa em 2010, depois da separação em 1991.

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Mas o show em Curitiba acabou levando o desafio de sair do script às últimas conse­quências quando o equipamento apresentou problemas técnicos.

É que o som da "terceira menor big band do mundo", como o duo se define, é formado pelo saxofone e o vocal de Mauricio e, principalmente, pela arquitetura que Abujamra empreende com suas bases eletrônicas e as complexas construções de guitarra e sampler digital. O músico grava, sucessivamente, cada elemento do arranjo ao vivo, e toca por cima desta teia sonora – e aí está um dos atributos d’Os Mulheres Negras: a invenção e o experimentalismo musical. Sem o recurso, que pifou mais ou menos na metade do show, a apresentação ficou comprometida em algumas de suas músicas mais conhecidas, como "Eu Vi", "Milho" e "Sub", de Música e Ciência (o álbum de estreia, de 1988), e "Monstros Japoneses" e "John", de Música Serve pra Isso (segundo e último disco, de 1990). A dupla, mesmo sem perder o estado de espírito brincalhão e autoirônico, se viu um tanto perdida diante do desfalque eletrônico. Abujamra teve de se desdobrar para segurar as canções praticamente sozinho, "na unha", o que reforçou o seu engraçado mau humor performático.

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Mas, antes da pane, foi possível conferir, ainda que em volume exagerado, os interessantes arranjos de "Mãoscolorida" (um belo instrumental do primeiro disco), da cativante "Purquá Mecê", da radiofônica "Só Tetele" e da aconchegante "Imbarueri". "Martim" revelou a faceta mais suja do duo, e ainda houve espaço para um interessante arranjo para o famoso "Peter Gunn Theme", de Henry Mancini. Se tivesse sido tecnicamente impecável, o show poderia ter sido uma amostra perfeita da admirável habilidade de Abujamra e Pereira para aliar criatividade performática e sofisticação musical.

Surpresas como a performance a capella de "Chico Mineiro", uma despretensiosa homenagem a Tonico & Tinoco, e o "rotoscópio", um instrumento inventado no fictício laboratório de pesquisas musicais da dupla que consiste em Mauricio Pereira tocando o saxofone girando em meio à plateia, garantiram as risadas. Mas um novo show d’Os Mulheres Negras em Curitiba, com tudo em ordem, será bem-vindo.