Eles não têm muito prestígio artístico. Olhando e ouvindo bem, nem se parecem tanto assim com as originais. Mas tem artista cover por aí fazendo mais de 15 shows por mês, tirando fotos com fãs e até distribuindo autógrafos. “É muito normal a gente ver pessoas se emocionando, me abraçando como se eu fosse o Renato Russo”, conta Miro Penna, vocalista da Legião Urbana Cover Curitiba. “Durante a conversa, algumas pessoas até parecem achar que estão falando com o Renato. Pedem indicações de bons livros, bons filmes. E às vezes tenho de lembrá-las que não sou ele, e que não tenho o embasamento cultural que ele tinha”, conta.
Pode parecer maluquice de fã, mas viver um mesmo personagem por anos a fio pode provocar efeitos estranhos, diz o vocalista Saulo Strada, da U2 Cover CWB. Assim como Miro e os covers mais fiéis da cidade, o cantor estudou movimentos, expressões e o jeito de cantar de Bono Vox – com quem tem certa semelhança física. Quando viu o ídolo ao vivo pela primeira vez num show do U2, teve uma sensação estranha. “Quando ele entrou no palco, minha mulher levou um susto”, conta. “Temos a mesma altura, o rosto parecido, os mesmos trejeitos. Ela falou que estava me vendo no palco. Também fiquei olhando e achando curioso”, brinca.
Experiência
A ideia é essa mesma: vestir as mesmas roupas, emular a voz, os tiques, usar os mesmos equipamentos. Enfim, reproduzir ao máximo o original para tentar proporcionar aos fãs a sensação de estar em um show que ainda não puderam ou jamais poderão ver.
As pessoas nunca têm a dimensão do que é ser uma banda cover. Em geral, perguntam em que barzinho a gente toca, mas o normal não é barzinho. É casa de show.
Os músicos cover dizem que, curiosamente, funciona. Os relatos de choro de fãs na beira no palco e a frequência com que pegam a estrada parecem atestar isso. “As pessoas nunca têm a dimensão do que é ser uma banda cover. Em geral, perguntam em que barzinho a gente toca, mas o normal não é barzinho. É casa de show”, conta Miro Penna.
“Somos uma banda que está na estrada. Ficamos em hotel, longe da família, comemos na estrada, às vezes vamos dormir às 5 horas da manhã tendo de levantar cedo. A única diferença é que tocamos a obra de outra banda.”
Rogério Franzini, da Creedence Brasil, conta que o tributo da sua banda ao Creedence Clearwater Revival chega a ser mais rigoroso do que o projeto Creedence Clearwater Revisited, de Stu Cook e Doug Clifford – baixista e baterista originais do grupo americano. “Eu e uns amigos fomos ao show deles. Na saída, vários disseram: ‘pô, o de vocês é melhor do que essa m.... aí!”, brinca.
Interpretação
O cantor carioca radicado em Curitiba André Juan leva o papel tão a sério que pede que nem se refiram ao seu tributo a Cazuza como “cover”. “Prefiro falar que é um trabalho de interpretação artística”, diz.
Para ele, o termo está estigmatizado e remete a um tipo barato de imitação. Seu trabalho, diz, vai além de colocar uma bandana e cantar “Exagerado”. “Parece que o artista não tem competência para trabalhar com a arte, então ‘imita’”, critica. “Quando um ator interpreta, você não diz que aquele ator está imitando um personagem. Diz que ele está atuando”, defende Juan. “O que estou fazendo é um trabalho artístico.”
Cover x autoral
Baixista da Creedence Brasil desde 1996, Rogério Franzini criou uma produtora especializada em vender artistas cover quando viu que era isso o que girava no mercado de bares e casas de show.
“Eu até tentei colocar artistas ‘autorais’ para tocar. Tentei no Brasil inteiro, mas ninguém queria. Comecei a perceber que as bandas cover vendiam mais”, diz o músico e produtor, para quem a falta de espaço para artistas com músicas próprias é um problema generalizado no país.
É por isso que, às vezes, nem é preciso gostar tanto assim do artista original em questão. O que pesa mais é a chance de tocar e viver de música, conta Franzini.
“As pessoas querem ir para a estrada”, diz o músico. Ele tem uma banda autoral, a Eletro Silvino – mas ela só existe graças ao seu trabalho na Creedence Brasil. “Toco cover para pagar meu trabalho autoral”, explica.
“A gente já fez autoral. Já conhecemos o outro lado da moeda – inclusive a dificuldade disso”, conta a vocalista Marina Matiazi, que começou em março o projeto I Amy, cover de Amy Winehouse.
“A maioria aqui faz música por necessidade. O pessoal é mais velho, tem 30 e poucos anos. Não tem mais garotões. Estamos tentando unir o útil ao agradável, e sabemos que tem público para isso”, conta.
Tributos
Conheça alguns projetos cover de Curitiba:
Tributo a Pink Floyd formado por Ala (voz, guitarras, lap steel e efeitos), Samir Souza (bateria e percussão), Roger Araújo (teclados e efeitos) e Cliceu Spinassi (baixo, violões e voz). Existe há seis anos e tem a proposta de reproduzir fielmente a sonoridade do grupo britânico de rock progressivo, embora não use caracterização. Já tocou em diferentes regiões do Paraná, Santa Catarina e São Paulo – por onde viaja a bordo da “Matilda”, uma Kombi preta plotada com as cores do prisma óptico da capa do “The Dark Side of The Moon”, e um porco inflável preso ao teto (em referência à canção “Pigs On The Wing”).
Toca desde o ano 2000. É formada por Marcos Hinnes, Anderson Capa, Diego Simm, Edison Leite e o vocalista Miro Penna, que faz uma imitação convincente de Renato Russo. Tem a bênção da família do cantor e compositor para tocar o projeto e foi escolhida pelo diretor Antonio Carlos Fontoura para tocar no lançamento do filme “Somos Tão Jovens”, em 2013. Chega a fazer 150 shows por ano. Toca às terças-feiras no Sheridans Irish Pub (Av. Bispo Dom José, 2315).
Existe desde 1993. Procura ser fiel à sonoridade da banda norte-americana Creedence Clearwater Revival, utilizando instrumentos e equipamentos que o grupo usou nos anos 1960 e 1970, mas não usa figurino. Entre os eventos corporativos, encontros de motociclismo, festas agropecuárias e aniversários de cidades no interior, calcula que já fez 3,5 mil shows.
É formada por Saulo Strada (vocal), Paulo Macan (guitarra), Sandro Tissot (baixo) e Gil Jr. (bateria). Além da preocupação em reproduzir a sonoridade do U2 – incluindo os efeitos mirabolantes do guitarrista The Edge –, usa o mesmo figurino da banda irlandesa, respeitando o visual de diferentes turnês.
Foi criado pelo músico carioca André Juan há cerca de sete anos em Curitiba. Além do timbre parecido ao de Cazuza, o cantor procura interpretar a postura do artista no palco. Juan emagreceu sete quilos para a série de shows “Cazuza, o Poeta”, que passou por Curitiba na última sexta-feira (26) e percorre algumas cidades de Santa Catarina.
Estreou em março deste ano tocando músicas de Amy Winehouse, que a vocalista Marina Matiazi interpreta lançando mão de maquiagem e peruca. Mais recentemente começou a incluir outros clássicos de R&B nos shows. Além de Marina, tem Hermann Ruthes (guitarra e vocal), Loren Dabaghi (teclado e vocal), Wallace dos Santos (baixo) e Matheus Turner (bateria).
Formada por Paula Fernanda (vocal), Dudu Manero (vocal e guitarra), Franco Caetano (guitarra), Alex Zanão (baixo) e Gilson Mocellin (bateria), busca reproduzir fielmente os arranjos e a sonoridade da banda sueca.
Não se define como banda cover – mas como “um tributo a Janis Joplin e outros clássicos do rock’n’rol”. A semelhança fica por conta do estilo vocal da cantora Érica Geraldo.
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