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Uma mistura atraente de três décadas de carreira. É assim que David Bowie descreve o show que apresenta hoje no palco do Close Up Festival, na Pedreira Paulo Leminski, em Curitiba. Numa bem-humorada entrevista coletiva, realizada ontem no Hotel Sheraton, no Rio de Janeiro, o cantor falou da importância da música eletrônica no trabalho que vem realizando hoje e também citou alguns de seus projetos futuros. Entre eles está um espetáculo teatral sob a direção do encenador americano Bob Wilson, a ser apresentado em Salzburg, na Áustria em pleno ano 2000.

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Aos 50 anos de idade, comemorados no início deste ano com um grande concerto no Madison Square Garden em Nova Iorque, Bowie parece não se incomodar com os efeitos do tempo. Ele garante ter a mesma sede de vida que o acompanhou em toda a sua trajetória de camaleão maior do universo pop. Leia a seguir trechos da entrevista.

O que você vai tocar nesta pequena turnê brasileira? É verdade que o repertório dos shows é restrito aos últimos álbuns, pouco conhecidos aqui?

Eu voltei atrás com minha palavra e vou tocar quatro ou cinco canções mais antigas, grandes sucessos com os quais o público esteja mais familiarizado como Under Pressure, Fashion e Fame. Eu acho que muitas das músicas são mais obscuras como Quick Sand, por exemplo. Também estou incluindo muitas músicas dos discos Outside e Earthling da minha fase mais recente. Eu espero que seja uma mistura bastante atraente de canções que escrevi desde 1967, mas não apenas das famosas.

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O que o atraiu no jungle (subgênero da música eletrônica e variação mais acelerada do drum’n bass)?

Acho que o jungle acrescentou muito a música de muita gente na Inglaterra. Foi o primeiro subgênero na música eletrônica que nasceu na Grã-Bretanha, originalmente em Londres. Dá a um músico como eu, que não sou um artista dance, a oportunidade de trabalhar com uma estrutura rítmica muito complexa, quase tão sofisticada quanto o jazz. É uma estrutura que permite bastante espaço para a criação, para a busca de novas direções.

Fale um pouco de seu último álbum Earthling e do seu envolvimento com a eletrônica?

Coletivamente, o trabalho que fizemos no álbum Earthling tinha a premissa de unir a energia do new industry e o do vocabulário jungle ao lado mais agressivo do rock. Foi uma questão de hibridização, colocando instrumentos ao vivo e a linguagem da dance music lado a lado. Nós, como uma banda, vemos nosso futuro trilhando nesta direção, juntando a sonoridade de nossos instrumentos a samplers e loops. Acho que somos uma das únicas bandas a fazer isso hoje. A maioria das bandas de dance usam apenas sintetizadores. Muito raramente se toca ao vivo.

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O que você tem ouvido ultimamente?

As músicas que ouço são bem diversas. Variam de Scott Walker a Stravinski e tudo o que estiver entre os dois. Sou meio antiquado e ainda ouço bandas como os Pixies do final dos anos oitenta por pura nostalgia. Não há nada que eu não ouça, o que não significa que eu gosto de tudo o que escuto. Depende como esteja meu humor. Não ouço o Prodigy as oito da manhã, por exemplo.

Quais são seus próximos planos profissionais?

A partir de novembro devo interromper a turnê parar pelo menos dois anos. Nesse período eu quero compor bastante. Mas gostei muito de ter excursionado pelo mundo nos últimos três anos, apesar de ter sido bastante cansativo.

Há algum projeto em cinema?

Eu não estou interessado em filmes atualmente. Nesses próximos dois anos estarei basicamente compondo. Em abril do ano que vem estarei apresentado uma art expression em Milão. Também estou trabalhando numa produção teatral com o diretor americano Bob Wilson que será apresentado em 2000 em Salzburg. É uma grande produção e prepara-la levará bastante tempo. Estou produzindo o álbum da minha baixista, Gail Ann Dorsey, que além de ser uma musicista fantástica tem uma voz maravilhosa. E eu tenho duas ideias para álbuns meus, para o próximo ano. E também quero ver mais a minha mulher. Os próximos anos serão bastante criativos, um período no qual vou realizar coisas que eu tenho tido vontade de fazer há bastante tempo.

Mas e sua carreira de ator?

Eu acho que ser ator dá muito trabalho. Goste de ver meu nome nos cartazes e créditos dos filmes, mas a quantidade de trabalho é excessiva. Gosta da ideia de ser uma estrela do cinema, mas ser um verdadeiro ator exige muita dedicação. Meu coração está mais voltado à música e as artes visuais.

Você confirma que é hoje o artista mais rico da música na Inglaterra?

Eu tendo a pensar que esta lista estava incorreta. Acho que a lista era alfabética. Por isso apareci em primeiro lugar. Esta lista é uma besteira.

Suas finanças foram afetadas pela crise das bolsas de valores?

Eu não jogo com dinheiro. Se eu invisto meu dinheiro em alguma coisa é em cultura e não no mercado de ações. Tenho muito mais interesse em cultura e música do que no mundo financeiro.

E as ações de suas músicas não foram afetadas?

Foram todas vendidas em sete horas, há meses.

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O que você achou de Elton John ter alterado “Candle The Wind”? Você considera a atitude de um gesto sincero ou um ato oportunista.

Você está me confundindo com Keith Richards, talvez. Não tenho absolutamente nada a dizer sobre este assunto.

Qual a sua opinião sobre o público brasileiro?

A última vez que estive aqui o público foi maravilhoso, receptivo, quente e generoso. A não ser que um cataclisma aconteça, acredito que a reação seja igual. Estaremos dando um show fantástico, não importando se na plateia estejam 17 ou 15 mil pessoas.

Por que o chamam de camaleão?

Acho que vou morrer com este apelido. É uma descrição muito genérica. Mas eu entendo, uma vez que não tenho lealdade a qualquer estilo, qualquer que seja ele. Para mim não haverá parâmetros se eu quiser mudar de um gênero musical para outro. Eu gosto de me explicar como artista por meio das mais diversificadas formas musicais. E esta postura tem me dado enorme liberdade em todos estes trinta anos de careira. É isso que mantém meu entusiasmo em níveis tão elevados o tempo todo. É como comer e fazer amor, algo que pertence a minha vida. Eu estou ocupado demais para não fazer música. É tão natural quanto fumar (risos).

Como é a sensação de estar com 50 anos?

Muito parecida com a de ter 49 (risos). O show pode ter mudado, mas os conteúdos não são diferentes de 25 anos atrás. Não percebo qualquer redução de entusiasmo. Talvez tenha hoje uma visão mais ampla das coisas. Mas, basicamente, continuo tão insaciável em relação à vida como quando eu era quando mais jovem.

O que você gostaria de fazer no Brasil?

Infelizmente as coisas que eu gostaria de fazer não acontecem nas cidades onde eu vou tocar. Não sou muito do tipo “praieiro”, nem minha mulher. Desde que chegamos, há alguns dias, tivemos a oportunidade de conhecer restaurantes, visitar amigos de Iman que vivem no Rio. As poucas coisas que eu gostaria de ver não estão aqui ou nas cidades em que vou me apresentar. Adoraria ver a arquitetura de Brasília - sou–um grande fã de Oscar Niemeyer. Eu o acho um extraordinário arquiteto. Todas as fotos que vi de Brasília sempre capturaram minha imaginação. E eu adoraria ver os trabalhos de Portinari. Não sei se teria a chance. Talvez em São Paulo.

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